Petrobrás
Foto: Roberto Castello Branco, presidente da Petrobrás. Imagem com licença Creative Commons

[Opinião] Por que o preço dos combustíveis sobe tanto?

Foto: Roberto Castello Branco, presidente da Petrobrás. Imagem com licença Creative Commons

Julia Vendrami* – Redação do UàE – 02/02/2021 – Publicado originalmente em Universidade à Esquerda 

 

O trabalhador que abastece seu veículo consegue observar que o preço dos combustíveis tem aumentado vertiginosamente. Isso é ainda mais problemático para aqueles que trabalham como entregadores, Uber, caminhoneiros e outros trabalhadores que dependem diretamente de quanto se paga na bomba. Mas também para todos os outros trabalhadores, o preço do frete impacta substancialmente o preço das mercadorias, como gêneros alimentícios, eletrônicos, bens duráveis, móveis, etc. Assim como em 2018, o preço dos combustíveis é o principal motivo que está unindo os caminhoneiros em torno de uma paralização.

Um estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revela que entre julho de 2017 e janeiro de 2021, o diesel sofreu reajustes de 42,64% e o GLP (gás de cozinha) subiu 130,79%. Já o preço do barril do petróleo acumulou reajustes de 15,40% neste mesmo período e a inflação medida pelo INPC (IBGE) ficou em 15,02%.

O atual presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, afirmou em janeiro deste ano que o combustível “não é caro nem barato, é o preço de mercado”. E esse é justamente o problema.

A Petrobras foi criada em 1953, na esteira da campanha “O petróleo é nosso”, com o desafio de encontrar petróleo e abastecer o mercado interno. Com os choques do petróleo nos anos 70, a meta passou a ser atingir a autossuficiência. Ou seja, não depender de importação de combustíveis, tornando o país autônomo nesse quesito. Não encontrando petróleo em terra, a Petrobras, para assegurar sua missão de redução da dependência energética, migra para o mar. Em 1968, iniciam-se as atividades de prospecção no mar no recém descoberto campo de Guaricema, Sergipe. Em 1974, encontrou-se petróleo na a bacia de Campos. Nesta fase foi desenvolvida a tecnologia de exploração em águas profundas e ultraprofundas.

Progressivamente, da exploração em lâminas de água de poucas dezenas de metros, passa-se para centenas e, mais adiante, para mil, 2 mil e hoje, profundidades próximas a 3 mil metros. E assim o Brasil alcança a autossuficiência em 2006. A autossuficiência permitiu a estabilidade macroeconômica do país, mesmo quando o preço do barril de petróleo superou os 100 dólares. Quando a Petrobrás decidiu não reajustar os preços de acordo com os preços internacionais dos combustíveis, segurando o que seria um choque inflacionário importado.

A capacitação na área de exploração, desenvolvimento, produção, gestão, permitiram à Petrobras testar um novo modelo geológico, desenvolvido ao longo de décadas, que previa a possibilidade da existência de um segundo andar de petróleo, sob a camada de sal abaixo do primeiro, que permitira a autossuficiência. Foi a primeira descoberta de petróleo no pré-sal, no bloco de Parati, em 2005.

A tecnologia de exploração em águas superprofundas e extração de Petróleo do pré-sal é fruto de muitos anos de investimento e pesquisa, com esforço de mais de 75 mil trabalhadores capacitados que compuseram os quadros da estatal nessa época. Hoje são cerca de 46 mil. Todo esse esforço fazia parte da estratégia “Do poço ao posto” no qual a Petrobrás extraia o petróleo bruto, refinava, transportava e comercializava por meio da subsidiária BR Distribuidora. Isso permitia que o preço dos combustíveis no Brasil fosse mantido abaixo dos preços internacionais, que oscilam muito.
Porém, desde 2017, a Petrobrás adotou uma nova política de preços dos combustíveis, que leva em consideração o preço do barril no mercado internacional e a cotação do dólar. Foram elevados os preços dos combustíveis, calculados conforme os preços internacionais, o que abriu espaço para as importadoras concorrerem diretamente com a Petrobrás e o petróleo brasileiro.

“Por conta dessa política [de preços], estamos sofrendo com aumentos descontrolados dos derivados de petróleo, o que inviabiliza setores estratégicos da economia, além de afetar massivamente a população”, alerta o coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar.

A direção da estatal aumentou em 59,67% o preço da gasolina nas refinarias entre julho de 2017 e janeiro de 2021. Isso a fez perder mercado e aumentar a ociosidade de suas refinarias, que chegou a um quarto da capacidade instalada. Ou seja, de 4 refinarias que a Petrobrás possui, apenas uma estaria em pleno funcionamento. A exportação de petróleo cru disparou, enquanto a importação de derivados, como gasolina, diesel e outros combustíveis, bateu recordes. Fazendo com que aumentasse a quantidade de combustível importado abastecendo os carros e caminhões dos brasileiros.

A estratégia do governo Bolsonaro para a Petrobrás seria focar no seu “Core bussiness”, seu “negócio principal”, que seria a extração de Petróleo, privatizando subsidiárias e refinarias. Assim, a BR Distribuidora foi privatizada em 2019 e outras subsidiárias da Petrobrás também. Ficou com a Petrobrás o trabalho de mais alto risco, aquele que os investidores internacionais não querem fazer. Perdeu-se qualquer tipo de controle dos preços dos combustíveis enquanto os setores privados ficaram com as atividades mais rentáveis e lucrativas.

Montado esse cenário, logo começaram a aparecer os problemas. Com o preço dos combustíveis aumentando nos postos, em fevereiro de 2020 Bolsonaro pede que a Petrobrás diminua o preço de venda da gasolina nas suas refinarias. No mesmo mês a estatal diminui o preço quatro vezes. Porém, a redução não chega ao consumidor.

Irritado, Bolsonaro chega a afirmar que que faz “papel de otário” ao baixar a gasolina vendida pela Petrobrás e preço não cair no posto. “Eu estou aqui fazendo papel de otário. Quanto é que vai baixar na bomba para o consumidor?”

O que acontece é que intermediários abocanharam todo o lucro e mantiveram o preço para o consumidor no mesmo patamar. Esses intermediários são os mesmos que compraram o setor de distribuição da Petrobras, antes BR Distribuidora. Como já afirmávamos em outros textos no Universidade á Esquerda.

A política de preços da Petrobrás é um problema que não precisaríamos estar enfrentando, por sermos um país rico em petróleo e em tecnologia de extração e refino. Mesmo assim, deixar de adotar essa política de preços não resolve o problemas, pois hoje a estatal já não possui o controle de todo o processo para interferir diretamente no preço cobrado do consumidor.

Segundo a Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET), “a Petrobrás é uma empresa estatal e existe para contribuir com o desenvolvimento do país e para abastecer nosso mercado aos menores custos possíveis. A maioria da população quer que a Petrobrás atue em favor dos seus legítimos interesses, enquanto especuladores do mercado querem maximizar seus lucros de curto prazo”.

É por isso que o preço dos combustíveis sobe tanto.

*O texto é de inteira responsabilidade do autora e pode não refletir a opinião do Jornal

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