Clara Fernandez – Redação UàE – 01/11/2017
A crise que se instalou na universidade há cerca de um mês – com a deflagração da operação ouvidos moucos, que investiga desvio de recursos da UFSC – vem colocando à mostra formas espúrias de fazer política, tendo como um de seus palcos principais o Conselho Universitário – Cun. Os casos investigados e a forma de investigá-los – policia federal passando por cima da autonomia da Universidade para instaurar processos investigativos – não são os únicos problemas do processo. As diversas formas de reagir à suas implicações têm demonstrado que o compromisso com a Universidade Pública está secundarizado e esta serve apenas para inflamar discursos que servem a interesses mais particulares, do que de fato restituir algum ensaio de democracia no interior da Universidade. Exemplo disso, se vê no mais recente capítulo de nossa história, onde o Cun vem tentando tomar das mãos da comunidade universitária a possibilidade de se informar, debater e decidir sobre o futuro da sua instituição. Acompanhar a sequência dos fatos tem se tornado uma tarefa inviável, a comunidade hoje mal sabe dizer quem ocupa a cadeira de reitor e corre o risco de em poucos dias acabar com um novo dirigente, do qual nunca ouviu falar na vida.
Muitos dos mesmos sujeitos que bradavam pela autonomia da universidade há poucas semanas atrás, tem atuado para que esta autonomia seja propriedade de uma seleta congregação de “gestores” da instituição, negando o acesso de membros da comunidade acadêmica e da imprensa ao Conselho Universitário, como se este já não fosse restrito por si e, isso, ao que parece para os que acompanharam a última sessão, para tentar empurrar este conselho a uma reunião relâmpago de encaminhamento de lista tríplice a ser enviada ao MEC. Com uma composição que passa longe de qualquer forma de expressão do que representa a comunidade universitária em seu conjunto e ainda com cerca de um mês disponível para o envio dos nomes (o MEC aguarda a lista até o dia 2 de Dezembro), é possível acreditar que este conselho de fato está habilitado para tomar uma decisão dessa magnitude?
Ao que parece, para alguns isto pouco importa, pois afastar a comunidade universitária das decisões é um movimento que já vem se realizando desde as investidas atropeladas de colocar Alacoque para assumir a Reitoria da Universidade após o falecimento do Reitor, ainda que se houvessem 60 dias para que tal decisão fosse realizada. Assumindo uma elasticidade argumentativa que a colocava como a forma de dar continuidade ao que foi decidido em 2016, tentou-se colocar um tapume na realidade, como se o papel de reitora e vice-reitora não tivessem suas especificidades, ainda que aglutinados em uma chapa. Alguém ainda se lembra quais eram os vices dos demais candidatos à reitoria na última eleição? Por que isso ocorre? Veja, segurar as pontas em momentos particulares que uma reitoria está impossibilitada de atuar, é completamente diferente de assumir definitivamente tal cargo. Quem tenta assimilar os dois papéis, ou está buscando mudar a interpretação que lhes cabe, ou está se beneficiando de alguma forma da instabilidade e incerteza que estes rumos dão à universidade. Afinal, há sempre aqueles que podem se oferecer como a alternativa menos pior diante dos cenários desastrosos de desesperança e apatia, como se não tivessem contribuído ativamente para efetivá-los.
E não é isso que o andamento dos fatos tem nos demonstrado? Não é justamente a instabilidade que representa empurrar uma vice reitora para assumir definitivamente a gestão, uma ótima brecha para que os mais espúrios jogos de poder interno vigorem? Ou por acaso há boas intenções envolvidas na prevalência das escancaradas tentativas de afundar o que resta de democracia nesta instituição?
Hoje há uma nova sessão do Conselho Universitário, onde os discursos dos que estarão lá variam entre encaminhar a lista tríplice pelo Cun e organizar um processo eleitoral para fazê-lo, mas nem a definição de uma consulta garante que a decisão de fato seja colocada nas mãos da comunidade universitária. Isto porque a organização de tal processo, também passa por disputas como o peso que cada categoria tem na soma dos votos. O tipo de cinismo que tem aparecido em falas que utilizam o medo de intervenções externas na universidade para no fim das contas defender interesses particulares e outros níveis de intervenção, mais internas mesmo, parece longe de seu fim. Dessa forma, não podemos cair nas armadilhas daqueles que querem fazer parecer que nossas opções são escassas e nos colocam nos descaminhos que só resultam na política do fracasso.
Nestas horas, somente o debate e a decisão pública podem nos oferecer condições de enfrentarmos e superarmos as tentativas mesquinhas de nos conduzir para caminhos sem esperança e obscuros. A autonomia da universidade só é possível em pleno exercício, quando se envolve o conjunto dos seus membros nas suas questões mais caras. Aqui também, cabe cobrar os representantes dos técnicos administrativos e estudantes, pois sendo a composição minoritária por categoria neste conselho e alguns destes se auto-afirmando no campo da esquerda, deveriam ser os primeiros a defender irrestritamente a ampla publicização dos debates e processos decisórios. Lembrando também da autonomia da imprensa universitária para noticiar os fatos da instituição, tratá-la como um orgão subserviente à reitoria é deixar com que o acesso à informação se sirva ao gosto de cada gestão que assumir. O mais pequeno retrocesso nesses termos, é abrir caminho para a instauração dos piores cenários, e quem contribui para consolidá-los, não merece um pingo de confiança da comunidade que julga representar.