[Opinião]Por que defender as Universidades Públicas?

Imagem: Ilustração de Käthe Kollwitz – Demonstration; Berlim, 1931

Flora Gomes* – 12/05/2019 – Redação UàE

Desde Abril a ofensiva do Governo ataca direta e abertamente a educação. Weintraub ocupa o ministério e rapidamente coloca em marcha a tirania neoliberal contra a produção científica e tecnológica. Passamos o último mês recebendo notícias devastadoras que já anunciavam que o pior ainda estava por vir.

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Durante esse mês mal se falava no dia-a-dia universitário sobre os cortes e o futuro atroz que se desenhava. Mas, quando a água afoga a comunidade universitária, as entidades começam a mover-se pelo desespero. A Administração Central da UFSC anunciou essa semana que, com os cortes realizados pelo Governo Federal, não há possibilidade de manter a instituição ativa após Agosto deste ano. Com as formaturas e sonhos de carreira comprometidos, os estudantes terão de ser capazes de defender a importância da Universidade – para suas próprias vidas?

Tivemos nos últimos anos experiências que provaram o quão insuficientes são as respostas imediatas desesperadas e egoístas. Diversos foram contrários às ocupações de 2016 – que moveu Universidades e Institutos federais contra a PEC de congelamento de gastos – e contra as movimentações no segundo turno #Elenão – motivadas pela oposição ao projeto bolsonarista para o país. Esses movimentos foram acusados de serem exagerados ou imprudentes, afinal, havia estudantes querendo estudar enquanto outros faziam essa balbúrdia. A conjuntura atual demonstra o quanto essas pautas anteriores já teciam o sufocamento da Universidade pública.Vale lembrar também que, mesmo entre aqueles que compuseram essas lutas anteriores, muitos se ausentaram da construção diária da defesa e disputa da Universidade, servindo-se dessa instituição como palco verborrágico.

Os Universitários hoje convocam a sociedade para defender o que é produzido no seio dessa instituição. É fundamental que, com o acirramento da conjuntura, aqueles mesmos estudantes, que não percebiam a devastação que já estava  sendo anunciada há tempos, e que agora nos está sendo brutalmente imposta, estejam dispostos a travar as lutas em nome de um bem comum: a defesa da Universidade. Entretanto, se o egoísmo  somado ao desespero predominar como fonte de mobilização política, não seremos capazes de barrar o projeto de sociabilidade que destrói a todos nós: estudantes, trabalhadores e aposentados. 

A necessidade de defesa da universidade pública é um fato. Não há dúvidas que sua destruição representa um desastre. O que aponto é: por que defendê-la? Não é o caso mobilizar estudantes e sociedade pautando o desejo de formar os atuais ou futuros estudantes  – afinal, a classe dominante bem sabe que é no seio dessa instituição que ela produz e inova suas técnicas de produção enquanto reproduz suas condições ideológicas. Além disso, pouco é possível comover quando se pautam projetos individuais, pois não há dúvidas que a forma como iremos reproduzir nossas vidas futuramente ocupa muitas vezes o lugar dos nossos sonhos. Entretanto, não é possível sair às ruas defendendo nosso planejamento de carreira.

Essa estratégia está fadada ao fracasso por dois motivos. Primeiro, por não ser capaz de barrar os cortes. A classe dominante pouco se importa com sonhos pessoais –  são as milícias atreladas ao atual Governo que matam todos os dias jovens negros cheios de sonhos e disposição nas periferias do país. Em segundo, porque foi a construção ideológica de que a Universidade Pública é instrumento para realização de projetos individuais que a distanciou cada vez mais das necessidades da sociedade. Foi essa lógica – e destaco aqui o papel fundamental do empreendedorismo – que nos conduziu a esse catastrófico cenário. Foi justamente o deslocamento do exercício autônomo da Universidade Pública para o seio e gozo de instituições privadas que afastou a população de usufruir o patrimônio público de produção de conhecimento..

É fundamental fazermos defesa das Universidades superando formas egoístas de resistir. A ideologia burguesa –  fortemente presente na educação fundamental e média – leciona que a vaga na Universidade, conquistada após uma vida inteira dedicada à esforços intelectuais e finalmente possível após a aprovação no vestibular, é um mérito. Mas a Universidade Pública não existe para realizar sonhos por meio dessa conquista individual. Técnicos, professores e alunos existem fundamentalmente no seio dessa instituição para produzir conhecimentos que satisfaçam às necessidades da população – do estômago à fantasia.

Por isso, não se trata de travar essa luta somente em defesa da Universidade, e sim contra tudo o que representa o Governo Bolsonaro: o fim da solidariedade de classes por meio da Reforma da Previdência; a venda do pouco que nos resta enquanto nação e a atomização das formas de socialização por meio do armamento, na qual o modelo imposto para nos defendermos contra a tirania é cada um por si e todos contra todos.

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Não seremos capazes de responder aos ataques enquanto as lutas expressarem o desejo imediato de categorias isoladas que se vêm atacadas frente a cada passo do governo. Se até mesmo nos limites do Estado burguês nos é permitido a insubordinação perante um governo ilegítimo, é necessário ir às ruas conjuntamente contra tudo o que o Governo Bolsonaro representa. Teremos que exercer a tão necessária solidariedade de classe e lutar juntos contra os cortes na Universidade, contra a Reforma da Previdência e todas as formas de privatização da vida.

*O texto é de inteira responsabilidade da autora e pode não refletir a opinião do Jornal.

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