[Notícia] Confira a nota dos docentes do curso de Pedagogia lida na sessão do CUn

Clara Fernandez – Redação UàE – 17/07/2020

Na sessão do Conselho Universitário que ocorre agora, uma carta dos docentes do curso de Pedagogia da UFSC foi lida pela professora Jocemara Triches, expressando a posição contrária a retomada do ensino remoto na UFSC.

Confira a nota na íntegra:

NOTA DO CURSO DE PEDAGOGIA

Diante da grave situação humanitária em que nos encontramos, na qual se combinam a pandemia causada pela COVID-19 (expressão dos limites ambientais a que chegamos), o desemprego, a fome e o empobrecimento brutal da população, uma crise ética e política que nos colocam face a face com o fascismo e com os interesses privados de poderosos conglomerados internacionais, o Curso de Licenciatura em Pedagogia da UFSC vem se manifestar:

O ano escolar está irremediavelmente afetado pelo que estamos vivendo. A vida não está “normal” de modo que as atividades pedagógicas também não podem estar. Essas questões aparentemente externas à Universidade, queiramos, saibamos ou não, impõem condições sobre as quais os processos de ensino e aprendizagem tentam se realizar. Este é um pressuposto básico que qualquer profissional da educação não pode ignorar.

Em contexto de pandemia, no qual o ensino presencial está impossibilitado, o “ensino remoto” foi forjado como novo consenso e “novo normal”. Há enorme pressão para liberar o “ensino remoto”, que só aumenta com o prolongamento do tempo em que as aulas presenciais ficam suspensas e pela previsão da situação nas próximas semanas e meses. Na história da educação sobram exemplos de tentativas de resolver os problemas sociais e escolares, minimizar ou mesmo isolar a vida do ensino, mas estes insistem em se recolocar… e os fazem agora, basta não fecharmos os olhos.

Nesta conjuntura complexa, consideramos oportuno seguir tratando a questão das atividades em relação ao semestre 2020.1 com base dos conhecimentos pedagógicos, o que implica considerarmos: a) as especificidades dos processos formativos em contexto de pandemia b) as especificidades de realização dos processos de ensino e de aprendizagem em situações remotas; c) os interesses mercantilista que têm dado o tom em muitas decisões
educacionais.

É importante reconhecermos como Instituição que, neste momento, o problema central para a realização da atividade pedagógica não está no impedimento físico de nos vermos, mas na condição de vida em uma pandemia, que suspende – como regra – a normalidade. Seria normal cobrarmos ou exigirmos de todos os estudantes um envolvimento obrigatório e sistemático com a aprendizagem. Mas, em uma pandemia, não podemos ter essa exigência, porque o pressuposto é que a condição de vida de muitos estudantes e professores encontra-se em uma situação cuja regra é o imprevisível, o incerto, o dispersivo, o improviso e, por vezes, o fragilizado.

O Curso de Licenciatura em Pedagogia da UFSC está organizado na modalidade presencial, o que expressa sua concepção, suas escolhas e convicções construídas pelo trabalho coletivo de docentes, estudantes e técnicos. Seu Projeto Pedagógico de Curso está organizado em três pilares formativos: educação e infância, pesquisa e organização escolar. É com estes pilares que o corpo docente do curso e os estudantes vêm constituindo sua
matriz curricular, com disciplinas e planos que pressupõem o ensino presencial.

O curso não está organizado para se efetivar de forma remota ou a distância. Esse formato de “ensino” não corresponde com nosso projeto político pedagógico, de docentes e de estudantes. Especialmente em relação aos nossos estudantes, temos extrema preocupação com suas condições objetivas de permanência na universidade pois, com dados já disponíveis, temos indicações de alterações significativas em seus contextos de vida nesse momento de pandemia. Tais condições deveriam ser decisivas para reconhecermos – como regra – a impossibilidade de um envolvimento sistemático, contínuo e obrigatório nos processos de ensino e aprendizagem, o que inviabiliza as condições mínimas e daquilo que chamamos de aula e de ensino: a possibilidade de um engajamento entre professor e estudantes para a aprendizagem de um determinado objeto de conhecimento.

Não temos dúvidas que podemos fazer “ajustes” nos Planos de Ensino e que todos nós, professores e estudantes, vamos nos esforçar para realizar o semestre de modo satisfatório. Mas o que precisamos discutir na Instituição é que esses “ajustes” nos planos para validar o semestre acadêmico seriam processos que apenas formalmente poderíamos chamar de aula, de ensino e de disciplinas. Enquanto profissionais da educação não podemos ignorar a
enorme diferença entre o trabalho pedagógico que pode se realizar de forma contínua e conjunta entre professor e estudante e aquele que é forçado a se dar de modo descontínuo, fragmentado com múltiplos focos de atenção.

Temos que reconhecer que, de fato, não é só uma gripezinha que precisamos enfrentar no campo pedagógico; não é apenas resolver o “problema” do calendário ou o problema de transmitir os conteúdos previstos no semestre. A questão central, diante desse cenário, é retomar e desenvolver o vínculo dos estudantes com seus cursos e com o processo de estudo. Isso deveria nos colocar a necessidade e responsabilidade de pensar a médio prazo como daremos conta de efetivar processos formativos que necessariamente ficarão de fora por manter o semestre acadêmico em meio a pandemia e de forma remota. É fundamental que as questões anteriormente pontuadas sejam consideradas ao pensarmos quaisquer de atividades formativas a serem realizadas no semestre 2020.1.

Por essa razão afirmamos que o ensino remoto não é solução para os processos de ensino e de aprendizagem em geral, e em específico, para enfrentarmos os desafios que esta pandemia e este governo genocida nos colocam.

Docentes do Curso de Pedagogia
Florianópolis, 15 de julho de 2020

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