A greve da Polícia Militar, e todo o caos gerado a partir disso, levantou discussões a cerca de como a esquerda deve se portar frente o ocorrido. Ao abrirmos qualquer site de notícias podemos encontrar diversos pontos de vista sobre o assunto, no Espírito Santo como em outros lugares no Brasil.
Não há dúvida que a movimentação dos policiais e de suas famílias não pode ser tomada como um “trovão em céu azul”; tem motivações e causas que são reflexo, inclusive, dos mesmos ataques que hoje açoitam boa parte da classe trabalhadora do país: o nível altíssimo do desemprego, o arrocho salarial, a reforma da previdência, o congelamento do orçamento público na esfera municipal, na estadual e na federal (a PEC 55), a ferocidade das frações financeiras do Capital que avançam para abocanhar uma maior quantidade de riquezas através do Estado, etc.
Porém, se agora os policiais se levantam contra o arrocho salarial e contra a precarização das suas condições de trabalho, deve a esquerda apoiar tais mobilizações? Antes de respondermos tal questão, é preciso colocar na mesa outros elementos que possam nos aproximar de uma análise mais totalizante da situação. É preciso observar com cuidado o caráter da instituição polícia militar.
A PM é o principal instrumento da classe dominante para a repressão dos movimentos sociais e das parcelas marginalizadas da classe trabalhadora. A PM é a instituição que alimenta o racismo de classe, que dispersa manifestantes com balas de borracha perfurantes[1], que persegue militantes, que é responsável pelo genocídio da juventude e da população negra; é aquela que agracia e defende os que em suas fileiras são milicianos, os que assassinam, que praticam abuso de poder e autoridade.
Esconder esses aspectos por detrás do argumento de que “apenas cumpriam ordens”, que a PM é “completamente submissa ao governador” já não faz mais sentido. É a própria PM que tem demandas de equipamentos, por centrais de inteligência, por armas e munição mais eficientes para a repressão. A instituição faz uso contínuo do medo e do terror, seja quando atua normalmente, ou quando está em greve. Do nosso ponto de vista o apoio da esquerda a esses atos devem estar condicionados à uma ampla crítica, por parte próprios PMs, suas direções políticas e suas associações, à esses aspectos.
O caso dos assassinatos no Espírito Santo é emblemático de como a polícia militarizada joga com terror na mesa de negociações: de dentro das espessas muralhas dos batalhões, os homens fardados, que em casa sentem as pressões do salário insuficiente, incitam e se juntam a grupos de extermínio, saindo à caça de criminosos, apelando à barbárie para impor sua reivindicação ao governo do estado[2].
Quando a Polícia Militar “reitera que respeita o direito democrático de manifestação pacífica”[3] para seus familiares, demonstra sua seletividade que ora garante a defesa dos próprios direitos, ora despacha aos hospitais estudantes que lutam contra o desmonte do ensino público. Enquanto não houver da PM uma autocrítica de sua instituição e de seu caráter militar, a esquerda não deve dar apoio à greve dos policiais militares, pois estaria se usando de mesma seletividade, tão perversa à classe trabalhadora.
Pelo fim da Polícia Militar!
[1] http://www.esquerdadiario.com.br/Policia-usa-bala-de-plastico-duro-perfurante-em-ato-da-ALERJ
[2] Assassinatos durante a greve da PM no ES estão ligados a grupos de extermínio formados por policiais: http://cbn.globoradio.globo.com/editorias/policia/2017/02/12/INVESTIGACAO-APONTA-QUE-PARTE-DAS-MORTES-REGISTRADAS-NO-ES-TEVE-ATUACAO-DE-PMS.htm
[3] Em comunicado oficial da corporação: http://oglobo.globo.com/rio/mulheres-de-policiais-mantem-manifestacao-apos-reuniao-sem-acordo-20912648