Foto: UFSC à esquerda
“Um jardim novo se levantará
o jasmim urge de um solo sem medo” – O Teatro Mágico
Hoje vamos falar de flores, morte, vida e família…
Quem acompanhou o aquartelamento do Conselho Universitário da UFSC na última terça, 1.º de dezembro, pode presenciar o significado bélico que o governo de Roselane e Lúcia imprimiu aos girassóis – inicialmente símbolo de um governo universitário dito “republicano”, para o qual “velhas práticas políticas” estavam superadas. Evidentemente, esse era apenas um discurso de campanha eleitoral (e campanha que não garantiu reeleição).
O cenário remontava o regime militar: as autoridades universitárias seguiram em fila a uma unidade da Polícia Militar para aprovar a entrega do Hospital Universitário da UFSC à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH). Todavia, observe-se um detalhe central: não se tratou de uma “intervenção militar” como outrora, o Conselho Universitário da UFSC dirigia-se ao quartel por ordem de sua própria Reitoria e o consentimento da maioria dos conselheiros universitários. Nem mesmo as objeções dos pareceristas da matéria ao local escolhido conseguiram demover a marcha – aqueles conselheiros entraram e fizeram o que a Reitoria ordenava, independente do que alertaram os professores Locatelli e Paulo Pinheiro.
Quase ao fim do espetáculo no quartel, uma pequena multidão de manifestantes chega para anunciar algo a mais do que um protesto. Suas palavras de ordem pareciam constranger as “entidades máximas” presentes, uma vez que figuras públicas do DCE e do SINTUFSC que por ali estavam esforçavam-se para manter uma certa distância. Antes que o relógio marcasse 15:00, já havia terminado a sessão do Conselho e as autoridades caminhavam para fora do quartel de modo ordenado, ensaiando um ou outro gesto para interagir com a multidão. As Reitoras, como de costume, retiraram-se por outra saída (a tradicional porta dos fundos).
A “procissão de retorno” do quartel para a universidade não tinha clima de comemoração, nem mesmo para os conselheiros que diziam “salvar o HU” ao seguir os passos da Reitoria. Ante a rebelião dos estudantes de São Paulo perante o governo Alckimin, a submissão dos mestres e doutores de Santa Catarina perante as imposições do Governo Federal. Um dia longo e triste, aparentemente fim; o girassol estava a murchar, o sol a se esconder, e uma sutil ventania fazia-se sentir. Era outro tipo de vento, a soprar de modo livre, imprevisível e incontrolável. Mal era vivido o luto diante do quartel da PM, e coisas incríveis começaram a ocorrer…
No mesmo dia, chega a notícia “bombástica” de que estudantes de Engenharia de Produção e Engenharia Mecânica estavam a debater greves na indústria e no serviço público, questionando uma série de questões políticas dentro do Centro Tecnológico (CTC). Do outro lado do rio, ventos de rebelião dentro do Centro Sócio-Econômico (CSE) levaram um grupo de oposição a sacudir o movimento estudantil no Serviço Social: anunciava-se uma nova gestão para o CALISS (Centro Acadêmico Livre de Serviço Social). Entre as palavras de ordem na vitória da chapa Oposicione-se, evidenciava-se a dura crítica aos setores que blindaram barbaridades do governo de Roselane/Lúcia, especialmente o Polo Comunista Luís Carlos Prestes.
Na quinta, dia 3, a Reitoria foi abalada pela aparição repentina de um caixão dentro do evento que homenageava o prof. Stemmer, onde estavam representantes da CERTI, FAPESC, FIESC, WEG e RBS. Era a hora do coffe break, quando se recitavam discursos sobre a excelência acadêmica da UFSC e o “sucesso” do empresariamento da universidade, isto é, o business acadêmico. Tudo em paz, até chegar um grupo de estudantes e fazer uma intervenção sobre condições precárias de uma “universidade hipócrita” com seu caixão, bebendo nas mesmas taças e comendo a mesma comida refinada dos presentes. O ato não dura nem 5 minutos, mas deixa imóveis uma gama de autoridades que há pouco falavam sobre a excelência, a inovação e o papel social da UFSC. Figuras públicas do CTC, como o prof. Sergio Colle, demonstravam-se profundamente indignadas com aquela “invasão” de setores não tão beneficiados pelo business da universidade.
Já na sexta, dia 4, algumas horas antes de se noticiar a exoneração do secretário de educação de São Paulo (fruto da luta, organização e resistência estudantil na ocupação das escolas), estudantes da UFSC que são pais e mães realizaram seu protesto pelo campus, no Restaurante Universitário, pelos corredores e no Laboratório de Informática. Falavam sobre a exclusão por parte da universidade aos estudantes que são pais ou mães, além do explícito descaso institucional para com essas crianças. Alguns seguranças acompanhavam de longe multidão que carregava cartazes destacando que “crianças são sujeitos de direito”, como se aquilo pudesse representar alguma ameaça à “segurança” da UFSC. No mesmo dia circulava pelas redes sociais que o Núcleo de Desenvolvimento Infantil (NDI) lançou nota dando razão aos que aqueles estudantes pais e mães reivindicavam.
E nem é preciso falar do Encontro Nacional de Educação que começa a ser preparado em Florianópolis…
Posto isso, é evidente que o último gesto do governo universitário de Roselane e Lúcia, de levar uma decisão do CUn sobre o HU/UFSC para dentro da PM, deixou uma cicatriz nessa universidade; e uma cicatriz que é ainda mais profunda para quem é descendente de uma luta contra o regime militar. Mas há movimentos e sentimentos no submundo UFSCiano que não são apenas de luto: está também em curso um paulatino processo de organização da Resistência, protagonizado por atores que insurgem contra essa ordem e essa “hipocrisia universitária”, como denunciaram os “filhos bastardos” do empresariamento universitário que invadiram o coffe break dia 3 de dezembro.
A proposta de universidade pública (business) que os empresários oferecem não dá conta de encher sua barriga, não sacia a sua fome de pão e nem a sua fome de arte, seja a oferta realizada por empresários privados ou empresários públicos. Tal como anunciara a canção Amanhã… Será? de O Teatro Mágico: “um jardim novo se levantará, o jasmim urge de um solo sem medo”. Seja entre os CA’s, nas oposições sindicais, nos velórios dos artistas, nos estudantes pais e mães que buscam um espaço para si e seus filhos nessa universidade, ou em uma aparentemente singela escola pública no interior de São Paulo; o tempo da insurgência está anunciado nessa Pátria Educadora.