Mais uma vez a falsa polarização entre PT e PSDB/extrema direita parece ditar os rumos dos debates e análises no país e escamotear qual o verdadeiro problema que enfrentamos. O motivo pelo qual esse governo corre um risco real de não se manter no poder diz mais respeito à incapacidade do mesmo de preservar os interesses da burguesia intactos do que às tentativas de uma oposição caricata, base do PSDB e de figuras extremistas como Bolsonaro, de tomar o seu lugar. Dilma não foi capaz de frear os avanços da operação Lava Jato, a investigação atinge a gigante empreiteira Odebrecht, empresa que não foi só um dos seus maiores patrocinadores de campanha eleitoral, mas também cresceu fazendo grandes obras para o Estado brasileiro, sendo a construtora que mais realizou obras fora do país com o intermédio do mesmo. Portanto, tornou-se estratégico para setores do empresariado/burguesia, amedrontados pela possibilidade da Lava Jato avançar mais e terem de arcar com as consequências, responsabilizar o Governo por um fenômeno que só ocorre em função do alto nível de permeabilidade de seus interesses que, por sua vez, foram alicerçados pelo PT nos últimos 14 anos. Ou seja, a corrupção só acontece porque a iniciativa privada se sustenta de forma parasitária no Estado, ditando onde e como os recursos públicos serão usados e utilizando todo e qualquer tipo de manobra baixa, como desvio ilegal de recursos, para garantir sua parcela. A forma arbitrária e parcial com que a justiça vêm agindo, sempre esteve presente no cotidiano da classe trabalhadora, se atingiu alguém do poder nesse momento, foi porque o petismo não conseguiu manter o grande empresariado intacto no seu envolvimento nessa história. Para nós, socialistas, é necessário entender que a corrupção não é um problema apenas do governo petista, mas de qualquer outro que venha a assumir este dentro do capitalismo, uma vez que é um problema inerente à este sistema e se faz necessário ao seu funcionamento, pois é este modelo que permite à iniciativa privada o controle dos rumos das políticas e recursos do país à seu favor. Gerando, por sua vez, todo tipo de dano e ampliação dos processos de precarização das condições de vida da classe trabalhadora e consequentemente o aprofundamento da superexploração, ao mesmo tempo que esconde quem verdadeiramente decide os rumos do país e dita as regras do jogo político e econômico com base em seus interesses escusos. A questão é que, independente de com quem se manterá o poder, os próximos ataques à classe trabalhadora serão duríssimos e é ela quem sairá mais lesada de toda essa disputa para defender os interesses da burguesia. Afinal, o que vai manter Dilma no poder ou retirá-la será a sua capacidade de reestabilizar a economia do país e esfriar os avanços da operação Lava Jato. Não a toa bastou apenas o anúncio da nomeação de Lula para Ministro da Casa Civil fez com que a Bovespa fechasse em alta na última quarta-feira, dia 16/03¹, beneficiando principalmente as negociações das multinacionais. É evidente que isso não significa que não devemos nos preocupar com o avanço no campo político da pequena burguesia conservadora e reacionária que se sente mais à vontade para demonstrar seus interesses retrógrados nesse momento. Porém é necessário lembrar que essa insatisfação massiva com o Governo, capitaneada pela oposição de (mais à) direita do PT, também é fruto do desgaste do modelo de um pacto de classes que permitiu o ascenso do poder de compra de alguns setores da classe trabalhadora. O que vai restabelecer “a ordem” e distensionar o cenário político é um novo pacto capaz de oferecer-lhes alguma garantia econômica. O que também não é desacreditar que não vamos ter enfrentamos com essa base pequeno burguesa em momentos de disputas importantes para a luta de classes. Por fim, não nos cabe ir às ruas defender um governo que não rompeu com a burguesia e com o capitalismo e seus mecanismos de manutenção, mas forjou um pacto de classes ideológico, ou seja, mascarando as contradições entre as classes. Tão pouco esbravejar contra a corrupção descolada da crítica ao capitalismo. Sem uma crítica e análise acertada sobre questões estruturais que envolvem o Capital e o Estado – que carrega as características que citamos não porque estas são essenciais sobre ele, mas sim porque estamos inseridos no capitalismo dependente; não avançaremos um passo na luta de classes. Com isso queremos sinalizar que é preciso, sim, disputar as ruas, o conjunto das manifestações contra os ataques ao que resta de democracia, mas em nossos termos – nos termos concretos da luta de classes – por uma perspectiva ético-política socialista. A classe trabalhadora e a Universidade Brasileira já estão sofrendo com as consequências e pagando pela crise. As greves nas universidades federais em 2015 denunciaram a dimensão de precarização que estas instituições estão submetidas. Enquanto os cortes no orçamento da educação pública que giraram em torno de R$12 bilhões, o governo investiu cerca de R$17 bilhões no ProUni e no FIES, canalizando o fundo público para a iniciativa privada. Estes dados nos indicam que independente do desfecho da crise e quem estiver no Governo nos próximos anos, os ataques a Universidade Pública não cessarão. O que demanda a comunidade universitária mais firmeza e independência em suas posições. Que nossas energias e esforços se voltem para a análise mais rigorosa para guiar nossa prática, não adianta querermos olhar com imediatismo para uma política extremamente complexa e que retomemos o trabalho de base e as ruas para a disputa de consciências que evidencie e reorganize quem realmente é refém em toda essa história: a classe trabalhadora².
¹ – http://www.valor.com.br/financas/4485008/bovespa-fecha-em-alta-em-meio-expectativas-sobre-lula
² – Recomendamos leitura das contribuições de Virgínia Fontes para compreender o cenário atual: http://pcb.org.br/portal2/10663