[Entrevista] “Essas prisões são completamente ilegais”, UàE entrevista a advogada popular Daniela Felix

Da Redação – UàE – 11.10.2016

Durante o ato realizado ontem (10.10), a Polícia Militar (PM) atacou os manifestantes iniciando um confronto que resultou em dezenas de pessoas feridas. A PM iniciou os ataques no momento em que a manifestação seguia o trajeto convocado, em direção à ponte, utilizando a cavalaria, bombas de gás lacrimogêneo e tiros de borracha – disparados na altura do rosto dos manifestantes. Conversamos com a professora universitária e advogada popular, sempre presente nas causas dos trabalhadores e estudantes da cidade, Daniela Felix, que atuou junto com outras advogadas no caso de duas estudantes e um jornalista presos ilegalmente pela PM para criar um sentimento de medo na população catarinense.   UàE – Daniela Felix, como ocorreram as prisões e qual a atual situação das manifestantes presas pela PM?

Daniela Felix – Foram presos três manifestantes, um fotógrafo amador e duas estudantes da UFSC. O fotógrafo foi liberado mediante fiança porque as acusações que foram forjadas para ele permitiam essa possibilidade, ele foi indiciado por lesão corporal, acusado de ter atirado uma pedra nos policiais, e também por desacato e resistência. As outras duas estudantes foram autuadas em flagrante pelos crimes de resistência, desacato e dano qualificado – segundo a PM, a materialidade do dano qualificado se deu pela queima do cone. Como prisão por dano qualificado não permite pagamento de fiança, as meninas ficaram presas, elas estão na delegacia. Tentamos contato com a juíza de plantão que foi informado que não analisaria em razão da audiência de custódia que acontece todos os dias, no período da tarde no fórum, então, hoje a tarde, por certo, elas serão liberadas. Então, elas dormiram na delegacia, e nós conseguimos evitar, inclusive, que elas fossem levadas ao presídio feminino, como queria a Polícia.

Segundo Felix, as prisões ocorreram sem nenhuma evidência de materialidade das acusações, ficando clara a dimensão política das prisões:

Daniela Felix – O que nós verificamos, nesse contexto, é que eles pegaram pessoas aleatórias e colocaram a responsabilidade sobre toda a violência, que a polícia iniciou, nesses três presos. Isso ficou muito claro desde o início para a nós que acompanhamos as estudantes e o jornalista na delegacia. O caráter dessas prisões como forma de repressão é a violência como elas aconteceram. Essas pessoas foram levadas, estão sofrendo imputações de crimes que não cometeram – inclusive as filmagens e registros fotográficos das prisões estão mostrando que elas não haviam oferecido nenhuma resistência. O que estão querendo fazer é forçar uma conexão entre os três manifestantes, porém, todos os três foram apreendidos e conduzidos em momentos diferentes do protesto. O jornalista amador, inclusive, foi preso no momento do início, em que ele estava fotografando o primeiro confronto da PM contra os manifestantes, quando estes caminhavam pacificamente em direção a ponte, as outras meninas foram pegas do outro lado, perto de um posto de gasolina, já do meio pro final da manifestação, uma carregava a faixa e outra estava sentada no meio fio, ou seja, elas não se conheciam, se conheceram ali, no camburão. Outro elemento, é claramente um flagrante forjado, no qual o delegado teve que efetuar o flagrante em razão da fé pública, sem qualquer materialidade, sem qualquer prova, a não ser o cone e as pedras que foram trazidas de locais diferentes, fora de contexto, não foram apreendidos com elas, não existe ali qualquer foto ou filmagem da polícia para de fato indicar e individualizar as condutas de cada um dos presos, enfim, sob o ponto de vista do processo penal, são flagrantes as ilegalidades, vemos claramente as características de prisão política, a PM tenta forjar personagens de que os manifestantes são vândalos para conseguir justificar a quantidade de bomba, spray de pimenta e bala de borracha que foram distribuídas ontem para os manifestantes sem qualquer tipo de causa.

Ainda que as estudantes sejam soltas hoje no período da tarde, é preciso deixar claro que a PM é a responsável única pelos episódios de violência ocorridos na noite de ontem. A causa dessa violência aparece em primeiro lugar como uma ingerência do Estado, ao querer definir quais os trajetos seguidos pela manifestação. Mas, quando percebemos o ocorrido na noite de ontem no contexto de uma conjuntura dura de repressão aos trabalhadores e estudantes que lutam contra a PEC 241, ou seja, contra a institucionalização da transferência de recursos públicos para a iniciativa privada às custas da saúde, educação, previdência e outros direitos conquistados historicamente, percebe-se que o endurecimento da PM nas manifestações responde às necessidades do Estado de silenciar as amplas maiorias que estão forjando um caminho político nas ruas e na ocupação das escolas do país. A coordenação editorial do UàE condena veementemente o papel desempenhado pela Polícia Militar e pela Polícia Civil na repressão às manifestações, a articulação entre as polícias para coibir o livre exercício democrático de se manifestar politicamente sobre os acontecimentos do presente, demonstram que a desmilitarização da polícia não basta, é preciso que a polícia seja democratizada e submetida ao jugo popular. Ainda mais grave que entre os presos na noite de ontem esteja também um jornalista, que cobria por livre iniciativa os atos de repressão violenta da PM. Sem a liberdade de imprensa, não há nação. Todo apoio às manifestantes e ao jornalista presos ilegalmente.   … A manifestação em apoio aos presos ilegalmente nas manifestações ocorrerá hoje durante a audiência de custódia às 13h30 na frente do Fórum da Capital. Espera-se que a manifestação possa ocorrer livre da violência policial.

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