Flora Gomes – 23/04/2020 – Redação UàE
Já são mais de 2.5 milhões de casos confirmados do novo coronavírus no mundo. No Brasil registra-se 45.757 casos, com 2.906 levados a óbito – dados atualizados ontem (22). As regiões Nordeste e Sudeste acumulam juntas 78,9% dos casos. Com o aumento significativo do número pacientes, o sistema de saúde começa a expor sua fragilidade no enfrentamento à pandemia. Quatro Estados já possuem mais de 90% dos leitos ocupados: Amazonas, Ceará, Pará e Pernambuco.
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Confira a situação dos Estados brasileiros por região:
Região Norte
No total são 4907 casos confirmados da doença. Ainda que represente apenas pouco mais de 10% do número total no país, o sistema de saúde público da capital amazonense já apresenta colapso. Também no Pará, o sistema público está no limite.
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Em Manaus a prefeitura abriu valas comuns com o nome de “trincheiras” para pode realizar os sepultamentos, já que houve aumento de 50% da demanda desde março. Os cartórios estão fazendo plantão para poder administrar o grande volume de certidões de óbitos requeridas. São 2479 casos registrados no Estado, sendo 207 levados a óbito. Amazonas possui 682 respiradores cadastrados no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES). Destes, 232 estão voltados aos pacientes com a Covid-19. Apesar de estar no limite da recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) quanto ao número de leitos de Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) por habitantes, 1 a cada 10 mil, Amazonas apresenta o maior índice de letalidade da região, ultrapassando 8%. Isso significa não apenas a fragilidade do sistema de saúde em termos de leitos, mas também a escassez dos testes, já que, assim como na grande maioria das cidades brasileiras, não há o suficiente para a população, sendo submetidos à testagem apenas os casos mais graves, aumentando a proporção óbitos/nº casos. Muitos residentes de Manaus não estão conseguindo acesso ao sistema de saúde público, sendo forçados a recorrer à rede privada para tratamento. A Justiça determinou a isenção de dois pacientes que estão internados em hospitais privados por não conseguirem acesso via Sistema Único de Saúde (SUS).
No Pará, são 1195 casos, com 43 levados a óbito. O sistema de saúde público estadual já apresenta 97% dos leitos das UTIs ocupados. Em Belém, capital do Estado, todos os 125 leitos estão ocupados. O governo estadual está priorizando destinar os espaços hospitalares que atendem pacientes com sintomas leves ou moderados aos pacientes graves. Até o fim de abril devem ser instalados 400 novos leitos de UTI com aparelhos que chegarão da China.
No tocante aos outros Estados, Acre, Roraima e Amapá não possuem o número mínimo de leitos recomendado pela OMS disponibilizados pelo sistema público. Em contrapartida, a rede privada nesses Estados excede – e muito – nessa proporção. No Amapá, por exemplo, enquanto a proporção de leitos UTI/10 mil habitantes é de 0,5 via SUS, ou seja, metade do mínimo, na rede privada ela é de 9,6. Rondônia e Tocantins apresentam maior cobertura do sistema público. O primeiro com 1.3 leitos/10 mil habitantes e 72% da população coberta pela rede de atenção básica, ao passo que no segundo a proporção é de 1 com 95% de cobertura pela atenção básica.
Região Nordeste
Essa região concentra 26,2% dos casos totais no país. O sistema de saúde público do Ceará e de Pernambuco já apresentam esgotamento. O primeiro Estado registra 3910 casos, o maior número da região, com 233 óbitos. Assim como o Pará, Ceará aguarda a chegada de respiradores oriundos da China para ampliar 560 leitos de UTI. Atualmente, o sistema público não dispõe do mínimo de leitos por habitante recomendado pela OMS.
Em Pernambuco, ainda que disponha de uma ampla cobertura da rede básica de saúde e do mínimo de leitos, os disponíveis para pacientes com a Covid-19 estão com a ocupação beirando 100%. Além disso, a taxa de letalidade é bastante alta: 8,6%, com 3298 pacientes testados positivo. Alagoas também apresenta uma taxa de letalidade parecida, ainda que com quantidade consideravelmente menor de casos (243).
Dos outros Estados, Paraíba possui o maior índice de letalidade (13%), apesar de ter um número baixo de casos registrados (301) e do acesso à rede básica de saúde ser bastante elevado: 98% da população. A Bahia, mesmo sendo o terceiro com maior número de confirmados da região, apresenta o mais baixo índice de letalidade.
No Maranhão, 139 profissionais da saúde testaram positivo para a Covid-19, segundo boletim divulgado na última segunda-feira (20) pela Secretaria de Estado da Saúde. Destes, três vieram a óbito. Os leitos de UTI disponíveis são majoritariamente na rede privada, 7,9 a cada 10 mil habitantes, ao passo que no SUS o índice é de 0,9.
Os Estados com menor número de pacientes confirmados são Piauí e Sergipe, somando juntos 323. No Rio Grande do Norte são 646 casos, com índice de letalidade de 4,5%.
Região Centro-Oeste
A região Centro-Oeste tem o menor índice de infectados do país, Ao todo são 1742. No Distrito Federal, 90 leitos de UTI estão reservados para pacientes com coronavírus. Destes, 28 estão ocupados. Entretanto, todos os demais leitos, que totalizam 410, estão ocupados, o que pode dificultar a possibilidade de remanejamento interno. Nos demais Estados, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás, o índice de letalidade varia entre 3.4 e 4.8%. Todos possuem pelo menos a quantidade mínima de leitos de UTI recomendada pela OMS.
Região Sudeste
O sudeste é a região mais preocupante do país, registrando mais de 50% dos casos. São Paulo e Rio de Janeiro já apresentam alto índice de ocupação dos recursos disponíveis no sistema de saúde público.
Em São Paulo já são 15914 pacientes registrados com o novo coronavírus, dos quais 1134 vieram a óbito. No total, são 1800 leitos de UTI disponíveis na rede estadual para o cuidado desses pacientes. A UTI do Instituto Emílio Ribas, na capital do Estado e principal referência em tratamento de Covid-19, chegou a 100% da capacidade na semana passada. A Grande São Paulo registra o maior número de ocupação das UTIs, 73,7%. Cem cidades já tiveram ao menos uma vítima levada a óbito pela doença. Em projeção divulgada ontem (22), o Estado prevê cerca de 3200 mortes por coronavírus dentro de duas semanas. O governador, João Dória (PSDB) anunciou a reabertura gradual da economia a partir do dia 11 de maio. A flexibilização do isolamento será feita em etapas com medidas específicas para cada região.
No Rio de Janeiro o quadro também é preocupante. Com 5552 casos confirmados, as principais unidades de emergência do Estado estão com todas as 117 vagas de UTI ocupadas. São 74% dos leitos de UTI do Rio ocupados com pacientes com diversas condições médicas. O hospital de referência no combate ao novo coronavírus, Ronaldo Gazolla, está com apenas dois leitos livres. O Governador Wilson Witzen (PSC) publicou um decreto na segunda-feira (13) prorrogando as medidas de isolamento social até o dia 30 de abril.
Minas Gerais é o Estado com o menor número de confirmados, 1283. Entretanto, o quadro não é menos preocupante, já que 28 das 135 cidades com pacientes positivos para a Covid-19 em Minas não possuem respiradores. Esses aparelhos são de fundamental importância para garantir o tratamento dos casos mais graves do novo coronavírus. Na última segunda-feira (20), a Advocacia-Geral do Estado conseguiu o repasse de R$ 84 milhões de reais para comprar cerca de 1,6 mil novas unidades e para o reparo de cerca de 220 respiradores. A média de ocupação de leitos de UTI no Estado é de 45% nesta semana.
No Espírito Santo são 1313 confirmados com 34 levados a óbito. A estrutura em termos de leitos de UTI públicos é acima do recomendado pela OMS, 1,7.
Região Sul
É a segunda região com menor número de casos, 3077. No Rio grande do Sul são 923 pacientes. O Governador Eduardo Leite (PSDB) informou na última sexta-feira (17) que cerca de 54% dos leitos, públicos e privados, estão ocupados com casos de Covid-19. Nos leitos de UTI, A proporção a cada 10 mil habitantes é de 1,7 no SUS e 3,5 na rede privada. Cerca de 70% dos pacientes foram recuperados, índice superior à média nacional, que encontra-se em 56,7%.
No Paraná são 1063 registrados em 111 cidades do Estado. Destes, 11 são crianças menores de 9 anos. As cidades com maior concentração no número de casos são Curitiba, Londrina e Cascavel.
Em Santa Catarina são 1091 casos. Desde o dia 06 de abril o Governador do Estado, Carlos Moisés (PSL), vem flexibilizando as medidas de isolamento social. Na última segunda-feira, em coletiva à imprensa, Moisés anunciou a liberação de shoppings, academias de ginástica e igrejas, mantendo regras de distanciamento, uso de máscara obrigatório e com 30% da capacidade do estabelecimento.
É necessário relembrar que todos os dados divulgados devem ser compreendidos a partir da taxa de subnotificação. Muitos pacientes são internados com sintomas respiratórios graves, típicos do novo coronavírus, mas não compõe a taxa de casos confirmados devido a ausência de testes. Se compararmos com a Coreia do Sul, por exemplo, o índice de letalidade do vírus, devido a testagem massiva, é de 0.9%. Nenhum Estado brasileiro possui uma taxa como essa. Além disso, é necessário considerar que muitos dos casos leves ou assintomáticos não dão entrada no sistema de saúde, já que tem sido priorizado os casos mais graves e grupos de risco.
O sistema de saúde e funerário estão apresentando sinais de esgotamento em diversos Estados brasileiros. As medidas de flexibilização do isolamento social, portanto, não parecem ter justificativa na condição em que se encontra o sistema de saúde público brasileiro.