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Por Martim Campos – Publicado originalmente no Universidade à Esquerda – 12/04/2021
O presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) realizou a leitura na Casa Legislativa nesta terça-feira (13/04) do pedido de criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que visa investigar as ações e omissões do governo federal no enfrentamento à pandemia do Coronavírus. A leitura da pauta não garante o início imediato das atividades da CPI, mas abre caminho para que a comissão seja instalada, na primeira sessão do colegiado quando serão escolhidos o presidente e o relator da CPI. Com a ampliação da proposta, a CPI também deve apurar eventuais irregularidades em estados e municípios, atendendo ao senador Eduardo Girão (Podemos), que pretendia criar outra CPI para investigar governadores e prefeitos.
O criador da proposta de instauração da CPI, Senador Randolfe Rodrigues (Rede), entrou com o pedido no dia 04 de fevereiro deste ano no Senado para investigar as ações e omissões do governo federal no combate à pandemia de covid-19, no momento de comoção com a crise sanitária no Amazonas e a falta de oxigênio para os pacientes internados. Naquele momento, já haviam sido coletadas 27 assinaturas, o mínimo requerido, entretanto, a CPI foi adiada por Pacheco por acreditar que esse tipo de investigação seria “contraprudecente” ao ocorrer de modo virtual, em razão do fator prático do funcionamento das comissões.
O presidente do Senado fez questão de ressaltar em sua leitura do requerimento, que estava criando a comissão apenas por ordem judicial — referência à decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, que obrigou Pacheco a criar a CPI por avaliar que os requisitos exigidos haviam sido cumpridos, incluindo a assinatura de mais de um terço da Casa.
A iniciativa conseguiu avançar somente na semana passada, após determinação do ministro Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal (STF), que mandou Pacheco instalar a comissão, apresentando a assinatura de 30 ministros de 11 partidos diferentes.
A ampliação do alcance da CPI para os estados e municípios havia sido proposta pelo senador Eduardo Girão (Podemos) e era defendida pela base governista e pelo presidente Jair Bolsonaro enquanto estratégia. Bolsonaro expressou sua oposição à CPI, fez críticas ao ministro Barroso e saiu um vazamento de áudio seu com outro ministro dando as coordenadas de ampliação da CPI.
O escopo acabou ampliado após líderes e bancadas governistas assinarem em peso outra proposta, do senador Eduardo Girão (Podemos-CE), que pretendia também envolver estados e municípios, conforme pedido de Bolsonaro. Pacheco tenta reunir as duas propostas com a inclusão desta feita por Girão, para que sejam apuradas as atuações do governo federal, incluindo também estados e municípios.
Quando os senadores apresentam o requerimento para instalar uma Comissão, precisam determinar o que querem investigar (de forma bem delimitada), ter a assinatura de 1/3 dos senadores e um prazo, como consta no parágrafo 3 da Constituição:
§ 3º As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.
Uma Comissão Parlamentar de Inquérito pode ter um alcance político grande por sua capacidade de coletar muitas informações e poder judicial na investigação, o que na prática pode significar ações como intimar pessoas a darem depoimento e quebrar sigilos fiscais e bancários. Entretanto, não cabe à CPI processar, julgar, condenar ou mesmo punir alguém, com prisões preventivas ou busca e apreensão. Existem expectativas de que um trabalho de uma Comissão de Inquérito possa dar uma conformidade jurídica aos crimes de responsabilidade que podem ter sido cometidos, servindo como uma base de pedido de Impeachment, pois apesar de não incriminar, o relatório da comissão poderia ser enviado para a Procuradoria da República desdobrando-se em um processo. Entretanto, essa expectativa depende de muitos fatores para ganhar corpo.
A base aliada do governo tem receios com a CPI, pois esta tem a possibilidade de desgastar e agravar a crise política contra o governo ainda mais, minando sua popularidade. Uma Comissão pode vir a ganhar uma massiva produção de materiais de vídeo e destaque na mídia, alcançando grande parte da população, expondo os erros, ações e omissões do governo federal suas estratégias: como o fato do Ministério da Saúde ter ignorado o alerta da falta de oxigênio no Amazonas, as decisões do governo para estimular tanto a produção e distribuição da cloroquina, registrando uma marca de responsabilidade no Governo Bolsonaro.
Outras CPI’s já foram criadas, tais como a CPI dos Bingos em 2005, instalada após senadores da oposição recorreram ao STF; em 2007 na Câmara com a CPI do Apagão Aéreo; e em 2014 com a CPI da Petrobras. Em todas essas ocasiões, ministros do STF destacaram que a investigação parlamentar é um direito constitucional à disposição das minorias no Legislativo.
Diante do fracasso do governo de inviabilizar a CPI e com uma relação mais estreita com o centrão, há uma possibilidade de parlamentares do Senado cobrarem caro num futuro próximo, com pedidos de cargos ministeriais, uma vez que a Câmara dos Deputados foi mais atendida.
A composição dos membros da CPI é um fator importante, pois indica se o governo vai estar em maioria para tentar controlar as investigações. O Presidente da CPI tem o poder de ditar o rumo e o ritmo dos trabalhos, de definir votações de quais testemunhas escutar, quais quebras de sigilo ou não serão votadas, enquanto o Relator pode indicar quem vai ser indiciado, responsabilizado, basicamente se encarrega de narrar a história da CPI.
Serão escolhidos 11 membros titulares para a Comissão e 7 suplentes, escolhidos por cada líder dos partidos, distribuídos da seguinte forma:
- o bloco MDB, Progressistas e Republicanos podem indicar 3 senadores;
- o bloco PSDB, PSL e Podemos podem indicar 2 senadores;
- o partido PSD poderão indicar 2 senadores;
- o bloco DEM, PL e PSC podem indicar 2 senadores;
- o bloco Rede, Cidadania, PDT e PSB podem indicar 1 senador;
- o bloco PT e Pros podem indicar 1 senador;
A distribuição de membros já mostra a composição de forças, com partidos de oposição sem grande peso na formação desse colegiado, com concentração maior na mão de partidos do centrão, aliados de ocasião ao governo.
O plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) referendará hoje (14/04) a instalação da CPI pelo Senado Federal, com início da sessão às 14h (de Brasília), transmitido pela TV Justiça. A ideia dos ministros, acertada antes, é fazer um julgamento rápido — ainda está na pauta da Corte desta quarta o julgamento da anulação das condenações do ex-presidente Lula.