Edição UàE a partir da foto de Isac Nóbrega/Fotos Públicas.

[Notícia] EnSilica anuncia abrir filial no Brasil logo após a extinção de Ceitec, estatal brasileira

Edição UàE a partir da foto de Isac Nóbrega/Fotos Públicas.

Morgana Martins – Redação UàE – 26/06/2021

Três semanas depois de o governo federal confirmar o fechamento da Ceitec, estatal brasileira do ramo de semicondutores, uma empresa multinacional inglesa anunciou o início de suas operações em Porto Alegre (RS). 

A Ceitec, Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada, foi uma empresa pública, fundada em 7 de novembro de 2008, vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações que atuava no segmento de semicondutores desenvolvendo soluções para identificação automática e para aplicações específicas. 

A empresa é conhecida como “estatal do chip boi” em razão de ter desenvolvido o chip para rastreabilidade bovina, e é a única empresa da América Latina que fabrica chips com silício, cobrindo toda a escala da produção. Em Porto Alegre, além de chips, eram produzidas etiquetas eletrônicas e sensores, que são utilizados em meios de pagamento eletrônico.

Foi no início deste mês que a extinção foi concluída pelo governo de Bolsonaro, sendo formalizada pelo conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), sob a alegação de que, apesar de aportes de R$ 800 milhões em duas décadas, a estatal ainda depende de injeções anuais de pelo menos R$ 50 milhões para cobrir a diferença entre receitas e despesas.

A EnSilica, multinacional que atua no ramo de semicondutores, anunciou abertura de filial em Porto Alegre três semanas depois da conclusão da extinção da Ceitec, alegando buscar reduzir o impacto do fechamento da estatal. 

Porém, a empresa não trabalha na produção de chips próprios, apenas com a projeção de chips, que são produzidos por terceiros. A matriz fica em Oxford, onde há aproximadamente 120 trabalhadores, e a companhia também possui outros centros no Reino Unido e em Bangalore, na Índia. 

Em Porto Alegre, a companhia pretende reunir mais de 30 engenheiros nos próximos três anos para trabalharem em projetos de circuitos integrados digitais e analógicos, além de software a ser embarcado nos chips. O objetivo da empresa britânica é aproveitar a experiência obtida nesses anos de funcionamento da estatal, bem como aproveitar-se das universidades próximas, buscando formar estudantes através de estágio oferecido. 

A liquidação de Ceitec resulta na demissão de cerca de 130 trabalhadores no total, enquanto cerca de 48 devem ficar na empresa após a desestatização. 

A entrada da EnSilica no Brasil foi planejada por Julio Leão, um dos primeiros demitidos da estatal, junto de outros funcionários demitidos. As operações iniciam ainda em julho, em formato remoto e o centro de projetos deve ser inaugurado em outubro deste ano. 

Em texto para o sul21, Maurício Andrade Weiss, professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), destaca que a indústria de semicondutores é extremamente relevante no âmbito mundial, já que produzem componentes dos principais bens de consumo duráveis utilizados atualmente, como celulares, computadores, automóveis e eletrodomésticos. 

“Os semicondutores são empregados não apenas nos bens de consumo, como em toda a infraestrutura de telecomunicação, inclusive satélites, na indústria de energia alternativa, destacando a transformação da energia solar em elétrica; bem como na diversidade cada vez maior de bens de capital e nas cadeias produtivas como um todo, a exemplo da indústria de alimentos e fármacos”, complementa.

No mundo, há uma preocupação e disputa em relação aos rumos dessa indústria, enquanto no Brasil, se demitem 34 trabalhadores altamente qualificados e se dá prosseguimento ao plano de liquidação da Ceitec, única empresa brasileira que reúne capacidade de desenvolvimento e produção no segmento de semicondutores.

Maurício destaca que o governo sequer buscou alternativas antes de realizar um projeto de privatização e, “no ramo de semicondutores, seguir a lógica da financeirização simplesmente inviabiliza projetos fundamentais para que o país seja competitivo”. Com lógica de financeirização ele se refere à priorização do curto prazo e da valorização na forma líquida, em detrimento do longo prazo e da valorização na forma física. 

Para finalizar, o professor faz uma observação adicional de que algumas decisões dos governos podem trazer prejuízos importantes para a economia de um país, que até podem ser revertidas. Entretanto, a conclusão da liquidação da Ceitec se enquadra no tipo de medida que é irreversível, ou revertida a um custo altíssimo e desnecessário.

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