Maria Alice de Carvalho – Redação UFSC à Esquerda – 24/10/2022.
Na última quinta-feira (20),quatro homens foram presos pela Polícia Civil em Santa Catarina por constituírem uma célula neonazista no estado, sendo três deles estudantes da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). As informações da investigação vieram à público no último domingo (23).
Dentre os presos, estão um homem de 20 anos estudante do curso de graduação em Letras, um de 20 anos estudante do curso de graduação em Direito e um de 21 anos estudante do curso de graduação em Engenharia Automotiva. Para além dos estudantes da UFSC, também foi preso um homem de 27 anos, que trabalha como auxiliar de escritório. Das prisões, três foram realizadas na cidade de Joinville e uma na cidade de São José (Grande Florianópolis). Mais informações sobre eles ainda não foram reveladas pela polícia.
Um outro homem envolvido com a célula neonazista, de 24 anos, já havia sido preso em abril de 2022 por envolvimento com tráfico de drogas em São Miguel do Oeste (SC). Esse homem também era estudante da federal de Santa Catarina, no curso de graduação em Engenharia de Agricultura, e foi detido com bandeiras e símbolos nazistas e uma arma de fogo ilegal. A partir desta apreensão se iniciou a operação que identificou os outros criminosos.
Na operação realizada na última quinta-feira (20), chamada de “Gun Prooject”, foram apreendidas nas casas dos membros da célula neonazista armas de fogo ilegais, diferentes bandeiras neonazistas, uma impressora 3D, além de fotos e vídeos que mostram eles em reuniões da célula e em treinamentos com armas de fogo e explosivos. A impressora 3D era utilizada para fabricar peças de uma arma de fogo, uma carabina semiautomática calibre 9mm — que é crime no Brasil.
A partir da apreensão de seus aparelhos celulares e computadores, a polícia teve acesso aos grupos de mensagens utilizados pelos integrantes da célula neonazista para se comunicar. Em uma das mensagens, um dos homens diz que produziu um detonador a distância para explodir granada, ao que um outro responde que ele está planejando um ataque terrorista.
Em uma outra conversa interceptada pela polícia, um dos membros fala: “vamos matar mendigo amanhã”; ao que um outro responde: “todos os mendigos negros nordestinos deveriam ser fuzilados”.
Nos diferentes vídeos e imagens acessados pela polícia durante a operação, há alusões do grupo ao nazismo (a partir de diferentes símbolos) e mensagens racistas e xenofóbicas. Os membros da célula possuem como centro de seu exemplo a SS (Schutzstaffel, em português Tropa de Proteção), milícia nazista responsável pelo holocausto nos campos de concentração durante a 2ª Guerra Mundial. Roupas, equipamentos e bandeiras do grupo possuíam estampado o símbolo da SS.
Um dos vídeos mais antigos apreendidos pela polícia, que mostra os integrantes com bandeiras nazistas e disparando armas de fogo, data de agosto de 2020.
A operação que ocorreu na última quinta-feira (20) foi comandada pela delegacia de Repressão ao Racismo e a Delitos de Intolerância da Diretoria Estadual de Investigações Criminais (DEIC). A investigação já identificou outros suspeitos e decretou a prisão de seis pessoas. A polícia segue investigando a relação dessa célula com outras do estado de Santa Catarina.
Reitoria da UFSC se manifesta
Na manhã de hoje (24), a Reitoria da UFSC publicou uma nota em rechaço a toda e qualquer forma de nazismo. A universidade confirmou que irá solicitar à Polícia Civil informações sobre os estudantes presos por neonazismo para adotar medidas disciplinares cabíveis no âmbito da universidade. A nota na íntegra pode ser lida:
“A Administração Central da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) tomou conhecimento através da Imprensa do envolvimento de estudantes com movimentos neonazistas. Ao tempo em que cumprimenta a ação da Polícia Civil na investigação, oferece colaboração para o total desvendamento e punição a este crime.
De sua parte, a UFSC solicitará às autoridades informações sobre os estudantes presos, para a adoção das medidas disciplinares cabíveis.
A Universidade também reforça que a Ouvidoria mantém canais para recebimento de denúncias, com a finalidade de mapear qualquer indício de redes neonazistas na UFSC.
Em outras frentes de atuação, a UFSC informa que o Conselho Universitário, em sessão realizada no dia 11 de outubro de 2022, aprovou uma moção de repúdio ao racismo, após o relato de casos ocorridos em Unidades Acadêmicas.
Uma política de enfrentamento ao racismo, construída em colaboração com entidades estudantis e representantes do movimento negro, será levada a consulta pública no início do mês de novembro, sendo posteriormente apresentada ao Conselho Universitário.”
A UFSC repudia toda e qualquer ação racista e que atente contra os direitos humanos e o patrimônio ético, científico e cultural da instituição.”
Casos de racismo e outros que atentam aos direitos humanos na UFSC
Como cita a nota oficial publicada pela UFSC, durante o último mês ocorreu na universidade pelo menos dois casos de racismo no espaço físico do Centro de Ciências da Educação (CED), mais especificamente envolvendo o curso de Pedagogia. Nos casos, foram escritas nas paredes frases racistas. Na primeira situação, a frase citava nominalmente uma estudante quilombola falando que ela deveria voltar para o lugar de onde veio. Na segunda situação foi escrito na parede “preto sujo”.
Os estudantes de pedagogia vêm se reunindo em assembleias e reuniões e construindo uma mobilização contra esses casos de racismo, além de exigir um posicionamento oficial da Reitoria da UFSC e expulsão do responsável pelo ato.
Nesta segunda-feira (24) veio a público manifestações escritas no Centro de Ciências Jurídicas (CCJ) com apologia ao feminicídio, estupro de mulheres e vulneráveis, antissemitismo, neonazismo e pedofilia. O Centro Acadêmico XI de Fevereiro, entidade dos estudantes de graduação em Direito, se manifestou repudiando o que ocorreu e manifestando que já está encaminhando medidas cabíveis.