Maria Helena Vigo – redação do UFSC à Esquerda
Uma greve nacional da educação está sendo convocada para esta quarta-feira (26). Em pauta, a luta pelo pagamento do piso salarial do magistério e pela revogação do Novo Ensino Médio. Em Florianópolis, regionais do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Santa Catarina (SINTE-SC) estão organizando um “Ato em defesa da Educação Pública”, a partir das 16h, em frente à Secretaria de Estado da Educação (SED).
A regional de Florianópolis do sindicato tem organizado a categoria dos professores contra a Reforma do Ensino Médio em sua íntegra.
O UFSC à Esquerda entrou em contato com a regional da capital catarinense para compreender os motivos que levam às mobilizações da categoria. A declaração na íntegra pode ser lida ao final.
Luís Deodato Ricardo Machado, professor e coordenador da regional de Florianópolis, defende que o Novo Ensino Médio é “irreformável”.
“Temos plena convicção de que essa reforma é ‘irreformável’. No nosso entendimento, não nos resta alternativa que não a revogação dessa excrescência educacional e política”, afirma o coordenador.
Em âmbito estadual, a categoria aderiu ao dia de paralisação.
Segundo Machado, o ato do dia 26 é parte do “esforço pela construção de uma grande mobilização”. O ato na capital é construído pelas regionais do SINTE Florianópolis, São José, Criciúma, Tubarão e Araranguá.
Leia também: Greve Nacional de Educação: 26 de abril contará com atos em Santa Catarina
A luta contra o Novo Ensino Médio tem ganhado dimensão nacional conforme a nova proposta vai sendo implementada no dia a dia das escolas.
“Mais do que apenas retrocesso pedagógico (com o esvaziamento do currículo do Ensino Médio), o que por si só já seria gravíssimo, estamos diante de um ataque à própria ideia de educação pública”, defende Machado.
Leia também: “Bagunçado” e “exaustivo”: estudantes relatam sua experiência com o novo ensino médio
Segundo Machado, é urgente e necessário que a contrarreforma do ensino médio seja derrubada e que trabalhadores e estudantes possam construir uma outra proposta.
“Convocamos todos aqueles indivíduos, grupos e entidades (e demais) que defendem a educação pública, gratuita, universal e de qualidade a se fazerem presentes no ato do dia 26/04 e se somarem à nossa luta”.
Confira a íntegra da declaração de Luís Deodato Ricardo Machado, professor e coordenador da regional de Florianópolis:
Muitos especialistas e diversas entidades ligadas à área da educação têm denunciado a chamada “Reforma do Ensino Médio” (às vezes, designada pela sigla NEM, que abrevia a expressão “Novo Ensino Médio”, e apresentada pelo governo Temer através da MP 746/2016 e consolidada com a aprovação da Lei 13.415/2017, que altera a LDB, definindo, entre outras coisas, uma “nova” estrutura curricular para o Ensino Médio) como um grande retrocesso. Mais do que apenas retrocesso pedagógico (com o esvaziamento do currículo do Ensino Médio), o que por si só já seria gravíssimo, estamos diante de um ataque à própria ideia de educação pública. Vejamos algumas razões que dão base a esse entendimento. De acordo com a “Carta Aberta – Pela Revogação da Reforma do Ensino Médio”, de 08 de junho de 2022, assinada por entidades como a ANPEd (Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação) e a CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), essa reforma precisa ser encarada como “um projeto antipopular e de contornos autoritários”, servindo ao “desmonte do Direito à Educação como preconizado na Constituição de 1988”. Ou seja, trata-se de uma contrarreforma.
O Prof. Daniel Cara (da USP e da Campanha Nacional pelo Direito à Educação) afirma que um dos objetivos estratégicos dessa “Reforma do Ensino Médio” é reduzir o investimento em educação pública. Esse objetivo estratégico vai ao encontro de uma série de ações dos últimos governos estaduais em Santa Catarina, que já vinham sendo tomadas para evitar que se concretizasse a efetiva valorização das carreiras do magistério público (de forma mais acentuada a partir de 2011, quando o STF reconhece a constitucionalidade da chamada “Lei do Piso”, a Lei 11.738/2008).
Podemos destacar três tipos de ações que têm se colocado como óbices à valorização do magistério público estadual catarinense: (i) o “achatamento” da tabela salarial (na prática, o que deveria ser um “piso” tem funcionado como um “teto” salarial); (ii)a preferência declarada pela contratação de trabalhadores temporários em detrimento da realização de concursos públicos; e (iii) uma regulamentação do cumprimento da hora-atividade que sobrecarrega os profissionais, sem garantir sequer o espaço adequado nas escolas para que as tarefas extra-classe sejam realizadas.
Em Santa Catarina, a linha básica da política pública em Educação do atual governo não é diferente dos anteriores. É a linha de enxugamento neoliberal do Estado e que defende que o “problema da educação não é de falta de recursos, mas de baixa qualidade de gestão”. O governo Jorginho Mello defende obstinadamente a “Reforma do Ensino Médio”, ocultando da população o fato de ela fazer parte dos esforços para institucionalizar o desmonte da educação pública no Brasil.
Com a implementação da “Reforma do Ensino Médio” em Santa Catarina, o que estamos testemunhando é: precarização da formação, aprofundamento das desigualdades educacionais, desorganização do cotidiano escolar e desestruturação da carreira docente. Determinada pela “lógica” da Reforma, é justamente a desestruturação da carreira docente a “tática” que visa, por um lado, conter a pressão pela valorização do magistério público (via “Lei do Piso”), e, de outro, reduzir a pressão por novos concursos públicos.
Some-se a isso uma regulamentação da composição da jornada de trabalho que, ao não reconhecer que a qualidade da atuação dos profissionais em sala de aula exige a realização de uma série de atividades extraclasse a serem desenvolvidas em ambiente adequado, acaba por impedir o pleno desenvolvimento profissional dos trabalhadores em educação. Isso significa que é pura hipocrisia o discurso oficial sobre a “qualidade” da educação pública catarinense.
A “Reforma do Ensino Médio” traz no seu bojo também uma disputa pela hegemonia na gestão educional. Não é por acaso que os institutos e entidades empresariais (como Todos pela Educação, Fundação Lemann etc.) tenham sido os principais responsáveis pela implementação da reforma. Em Santa Catarina, por exemplo, o atual desenho curricular para o Ensino Médio foi definido pelo Instituto Iungo (ligado à MRV, gigante da construção civil). Aos professores que foram recrutados para participarem do processo de definição do desenho curricular catarinense, infelizmente, não coube outra função que não legitimar algo que estava sendo decidido à sua revelia.
O impacto nas escolas tem sido muito negativo. Desorganização do currículo e precarização da atividade docente. Há professores com doutorado em química, em história ou sociologia se encontrando obrigados a lecionar “projeto de vida” (uma espécie de institucionalização escolar do “coaching”. Há escolas que, já indo para o final do primeiro trimestre letivo, não conseguiram sequer organizar um horário fixo para as aulas. Os professores efetivos estão evitando o quanto conseguem às disciplinas eletivas. Os professores temporários não sabem muito o que fazer com elas (e, aqueles que podem, têm desistido de chamadas “trilhas de aprofundamento”). Em meio a tudo isso, muitos alunos já começaram ver a possibilidade de ingressar na universidade pública como um sonho distante, dificilmente realizável.
O SINTE/regional Florianópolis tem acompanhado, denunciado à sociedade e buscado organizar a categoria na resistência contra essa política educacional antipopular. Temos plena convicção de que essa reforma é “irreformável”. No nosso entendimento, não nos resta alternativa que não a revogação dessa excrescência educacional e política. Enquanto sindicato, temos feito esforços para levar esse debate da revogação para o “chão da escola” (em novembro do ano passado, em parceria com a regional São José, realizamos um seminário sobre a Reforma; e, em breve, realizaremos novas ações e atividades que possam subsidiar um posicionamento crítico da categoria sobre o “Novo Ensino Médio”).
Em nosso entendimento, é só com a partir de uma grande mobilização dos trabalhadores em educação, dos estudantes e da opinião pública esclarecida é que conseguiremos revogar o chamado “Novo Ensino Médio” (que, de um ponto de vista estritamente educacional, não tem nada de “novo”, de “moderno”, de “bom”, ao contrário do que a propaganda ideológica tenta incutir na mente dos desavisados).
Compondo esse esforço pela construção de uma grande mobilização, no próximo dia 26/04, as regionais do SINTE Florianópolis, São José, Criciúma, Tubarão e Araranguá realizarão um “Ato em defesa da Educação Pública”, a partir das 16h, em frente à SED (Secretaria de Estado de Educação). Também estaremos atendendo à convocação feita pela CNTE para “Greve Nacional da Educação pela aplicação do reajuste do piso salarial inicial e na carreira para os/as profissionais da educação e pela revogação do NEM” (tal como aprovado em assembleia estadual da categoria, em 12/04).
Convocamos todos aqueles indivíduos, grupos e entidades (e demais) que defendem a educação pública, gratuita, universal e de qualidade a se fazerem presentes no ato do dia 26/04 e se somarem à nossa luta. Essa é uma luta pela valorização dos trabalhadores em educação, pela educação pública de qualidade e, portanto, pela transição em direção a uma sociedade mais justa e igualitária.
Pelo piso salarial do magistério na carreira!
Pela imediata revogação da “Reforma do Ensino Médio”!