Morgana Martins – Redação UàE – 23/11/2018
Nesta quinta-feira (22), a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) absolveu o ex-catador de latas Rafael Braga do crime de associação ao tráfico de drogas, sendo assim, a pena caiu de 11 anos e 3 meses para 6 anos. Participaram do julgamento os cinco desembargadores que compõem o TJRJ. O desembargador Marcos Basílio aceitou o que foi alegado pela defesa de Rafael, de que não há nenhuma prova que conecte o acusado a qualquer grupo de tráfico.
O julgamento ocorreu depois um longo tempo de espera, em que foram negados os embargos declaratórios – instrumento jurídico pelo qual uma das partes de um processo judicial pede ao juiz ou ao tribunal que esclareça determinado(s) aspecto(s) de uma decisão proferida quando há alguma dúvida, omissão, contradição ou obscuridade. Diante disso, a defesa de Rafael Braga entrou, em março deste ano com os embargos infringentes – medida que poderia resultar em alteração no resultado do julgamento, como ocorreu na quinta-feira (22).
“A decisão faz justiça ao que a defesa vem sustentando ao longo de quase três anos. Rafael Braga não é e nunca foi associado ao tráfico. Iremos aos tribunais superiores para pleitear sua absolvição também do crime de tráfico de drogas para estabelecer os fatos e a Justiça”, diz o advogado Lucas Sada, que atua na defesa de Rafael.
Rafael braga respondeu a dois processos, ligados a casos de falha processual e abuso de autoridade, um por porte ilegal de artefato incendiário e outro por tráfico de drogas e associação ao tráfico. Em 2013, momento de ascensão das lutas contra o aumento da tarifa, Rafael foi detido quando chegava a um casarão abandonado, onde por vezes dormia; ele não havia participado das manifestações, porém carregava consigo duas garrafas de plástico, uma de Pinho Sol e outra de desinfetante. Por isso, foi acusado de portar material explosivo, os quais seriam para a confecção de coquetéis-molotov.
A condenação equivocada de Rafael Braga teve grande repercussão nacional e levou a diversos coletivos a se solidarizarem com o caso. Frente a isso, foi organizada a Campanha Nacional pela Liberdade do Rafael Braga, a qual é fruto de uma articulação da Campanha local junto com o Instituto dos Defensores dos Direitos Humanos (DDH) e o extinto Fórum de Enfrentamento ao Genocídio do Povo Negro. Além disso, a defesa de Rafael frente às acusações que recebeu foi assumida pelo próprio DDH.
Em 2016, Rafael Braga foi abordado pela Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) quando caminhava em direção a uma padaria na Vila Cruzeiro, zona norte do Rio. Os policiais o levaram para um beco onde o ameaçaram de diversas formas para que ele falasse quem eram os traficantes do local. A Justiça, Braga relatou: “Mandaram eu abrir a mão, abriram o plástico, botaram pó na minha mão, me forçando a cheirar. Mas eu não cheirei. Aí me levaram para a 22ª DP e apresentaram essas drogas, que não eram minhas não. Nunca participei [de tráfico], nunca vendi droga na minha vida”¹.
Diante desse último ocorrido, Braga foi condenado em 20 de abril de 2017 pelo juiz Ricardo Coronha Pinheiro a onze anos e três meses de reclusão em regime inicial fechado e pagamento de 1.687 dias-multa por tráfico de drogas e associação ao tráfico. Na sentença², o magistrado chega a afirmar (sem provas) que
No caso presente a posse do material entorpecente (maconha e cocaína) embalado em saco plástico (vide laudo de exame de entorpecente de fls. 99/100), fracionado, inclusive, contendo inscrições “CV”, que sabidamente destinava-se à venda, evidencia a estabilidade do vínculo associativo com a facção criminosa “COMANDO VERMELHO” que controla a venda de drogas no local dos fatos. Ademais, com o réu houve a apreensão de um rojão (fl. 17), sendo certo que no momento da prisão em flagrante do réu RAFAEL BRAGA, conforme relato dos próprios policiais neste Juízo, havia inúmeros elementos que se evadiram. Dessa forma, restou inequívoca a estabilidade do vínculo associativo para a prática do nefasto comércio de drogas, sendo certo que a facção criminosa “Comando Vermelho” é quem domina a prática do tráfico na localidade conhecida como “sem terra”, em que o réu foi preso, situada no interior da Vila Cruzeiro. Por outro lado, a regra de experiência comum permite concluir que a ninguém é oportunizado traficar em comunidade sem integrar a facção criminosa que ali pratica o nefasto comércio de drogas, sob pena de pagar com a própria vida. Portanto, não poderia o réu atuar como traficante no interior da Comunidade Vila Cruzeiro, sem que estivesse vinculado à facção criminosa “Comando Vermelho” daquela localidade.