Imagem: UFSC à esquerda – Assembleia de 02/09/2019
Lara Albuquerque* – Redação UFSC à esquerda – 25/09/2020
No último dia 10 de setembro, a Câmara de Pós Graduação da UFSC avaliou e aprovou recurso interposto pelo professor Carlos Alberto Marques (Bebeto) contra decisão do Colegiado Pleno do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica (PPGECT), em reunião realizada em 07 de agosto, de não aderir ao ensino remoto no primeiro semestre letivo do ano de 2020. Um enorme golpe da CPG à autonomia do PPGECT, que abre precedentes perigosos na UFSC.
O programa passou por uma série de debates com massiva participação do corpo docente e discente durante os últimos meses, discutindo os rumos da formação, da universidade e os significados da aderência ao ensino remoto no contexto da pandemia. E concluiu pela não aderência à proposta de ensino remoto. Consequentemente, reformulou como deveria se dar o semestre 20.1, após a decisão de não ofertar em modo remoto disciplinas obrigatórias e eletivas regulares do programa, criando atividades complementares que melhor se adaptariam às condições de trabalho e estudo no momento, essas também aprovadas em Colegiado delegado do programa.
Todas essas atividades iniciaram com o calendário acadêmico (31/08) e foram planejadas para o decorrer do semestre até meados de novembro. Porém a decisão da CPG, embasada no recurso de Bebeto, coloca todo o planejamento do programa em risco, uma vez que tendo que voltar atrás sobre o andamento do semestre, as atividades em curso teriam que ser canceladas, o semestre replanejado, sobrando poucas semanas para o encerramento do semestre e a obrigação, imposta por Bebeto e Câmara ao PPGECT, de cumprimento de disciplinas que deveriam acontecer em 18 semanas letivas.
A decisão do PPGECT seguiu todos os ritos previstos, uma vez que realizaram debates e decisões nos seus respectivos espaços deliberativos. Além de reuniões estudantis e a criação de comissão interna para levantamento da situação de seus estudantes e professores em meio a pandemia. E encaminharam de acordo com esse processo coletivo. Assim, alguns aspectos do que aconteceu na CPG chamam atenção e mostram o quão absurda foi a decisão de, primeiro, aceitar o recurso e o aprovar:
Após o início do semestre, Bebeto interpõe um recurso diretamente à CPG e não ao Conselho de Unidade do Centro de Ciências da Educação, como preveem os artigos 20 e 25 do Regimento da UFSC:
“Art. 20. Das decisões caberá pedido de reconsideração à própria autoridade ou Órgão, ou apresentação de recurso à instância imediatamente superior, na forma seguinte: […] III – do Departamento e do Colegiado do Curso ao Conselho da Unidade;
[…]
Art. 25. Compete ao Conselho da Unidade: […] VIII – rever, em grau de recurso, as decisões dos Departamentos, Colegiados dos Cursos de Graduação e dos Colegiados dos Cursos de Pós-Graduação;”
Ou seja, o recurso estava endereçado ao órgão errado e mesmo assim foi acolhido. E em seguida aprovado, mesmo com parecer substitutivo construído pela Associação de Pós -Graduandos e também carta dos docentes do PPGECT lida durante a reunião defendendo a decisão do Programa e respeito à sua autonomia didática.
A primeira questão que paira é qual o interesse de comprometer a lisura de um processo como esse? Por que a CPG acolhe e aprova um recurso, mesmo não sendo instância recursal? Não é de se estranhar que o Conselho de Unidade do CED teria um ambiente mais incerto para Bebeto do que a CPG que atua, mesmo antes do CUn deliberar sobre, para impor o ensino remoto aos programas da UFSC.
A segunda questão é, por que um professor, que já foi presidente da APUFSC (2018-2020) e concorre agora a reeleição, atua contra seus pares em tantas ocasiões? Seja atuando contra o ANDES, enfraquecendo a possibilidade de greve contra o Future-se no ano de 2019 e atuando contra seus colegas de Programa nesse episódio. Bebeto demonstra o quanto está disposto a atuar representando interesses próprios de seu projeto nos espaços que ocupar, e não os interesses dos espaços coletivos de deliberação, demonstra o quanto não pretende colocar a APUFSC como um espaço de construção da lutas, como o nome de sua chapa tenta fazer parecer, ou mesmo um instrumento o qual os professores possam contar quando tiverem Câmaras ou Conselhos dispostos a passar por cima de suas decisões. Aqui cabe um parênteses, para evitar falsas polêmicas, tão pouco a outra chapa cumpriria qualquer papel no sentido de fortalecer ou construir a luta docente.
Porém, para além das questões legais, regimentais, ou da figura própria do professor Carlos Albero, a questão maior seria sobre o significado, o desdobramento, que fatos como esse podem significar para o cotidiano universitário. Espaços coletivos de decisão devem ser respeitados, bem como a autonomia dos colegiados sobre os desdobramentos pedagógicos, sobretudo em momentos de crise como o que vivemos atualmente, onde nos é imposto uma rápida adaptação a uma saída que não foi formulado por nós mesmos. Não se pode afirmar que o ensino remoto foi uma construção desta universidade ou de outra qualquer, mas algo que, por mais desorganizado e estranho às nossas formulações, vem organizando nossa vida acadêmica e universitária, rebaixando nossos processos educacionais e apequenando o sentido da Universidade naquilo que a constitui, aquilo que ela tem de melhor.
Nesse caso, na figura de Bebeto o ensino remoto foi didático na voracidade e violência que pode se impor para acatá-lo.
*Os textos de opinião são de responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, as posições do Jornal.