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Nina Matos – Redação UàE – 10/07/2020
Publicado originalmente em Universidade à Esquerda.
265 mil estudantes de universidades privadas do país desistiram da graduação definitivamente ou trancaram suas matrículas nos meses de abril e maio. Em comparação com o ano passado, isso representa um aumento de 32% da evasão.
Os dados são referentes a 2ª edição da Pesquisa sobre o Cenário Econômico Atual das Instituições de Ensino Superior Privadas, realizada pelo Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp), que foi apresentada no final de maio.
Com as rendas afetadas severamente, continuar pagando as matrículas da graduação se mostra impossível. De acordo com uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), cerca de 80% dos estudantes que interromperam a graduação nas instituições privadas de ensino superior apresentam a perda da renda como o principal motivo para a decisão.
A princípio, soa bem que tais entidades patronais se disponham a ouvir sobre as condições de continuidade ou não de seus estudantes, inclusive quando vão a público afirmarem que as desmedidas do governo Bolsonaro, como a MP 936, que autorizou a suspensão de contratos, redução das jornadas de trabalho e cortes de salário, estão afetando seus estudantes — especialmente os matriculados em cursos à distância.
A aparente preocupação dessas entidades se esfacela frente sua intransigência na busca por lucros. Isto se expressa na sua posição e relação a redução de mensalidades e renegociações de dívidas que tem sido demandas frente a crise: aceitam apenas que seja feita de modo individual, sob a justificativa de que isto daria conta das situações particulares das famílias dos estudantes.
A argumentação dessas entidades empresariais e também das instituições privadas é que abrir a possibilidade de um desconto para todos prejudicaria muito mais aqueles que mais precisam, enquanto beneficiaria estudantes que não foram afetados pela pandemia.
Nos relatos que têm sido veiculados, o que tem se mostrado são as instituições privadas ligadas aos grandes oligopólios propondo no máximo parcelamento das dívidas, que pesam no bolso somadas às parcelas que continuam sendo cobradas mensalmente.
Com a pandemia, diversos movimentos de estudantes das privadas pela diminuição das matrículas levantaram hashtags nas redes sociais denunciando que, com a adoção dos sistemas de ensino à distância (EaD) para dar conta das atividades de aula paralisadas, essas instituições estão reduzindo os custos com as instalações e lucrando mais mantendo o mesmo valor de mensalidade. Os movimentos criticam essa postura das empresas e reivindicam uma redução das mensalidades.
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A implementação do ensino à distância — ensino remoto, como alguns gostam de nomear — também é alvo de severas críticas por parte dos estudantes, em especial com alegações de que a qualidade do ensino foi drasticamente afetada, apontado para uma quebra de contrato. Nesse sentido, diversas ações no Programa de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) contra as instituições têm sido movidas por alunos, pais de alunos e até mesmo grupos inteiros em conjunto.
Em resposta, o Ministério da Justiça e Segurança Pública publicou uma nota técnica (14/2020)¹ informando que os pedidos de redução das mensalidades devido a instituição ter reduzido os custos com a pandemia “não autoriza a exigência de desconto nas mensalidades”, além de que “recomenda que consumidores evitem o pedido de desconto de mensalidades a fim de não causar um desarranjo nas escolas que já fizeram sua programação anual, o que poderia até impactar o pagamento de salário de professores, aluguel, entre outros”.
As grandes empresas da educação não medirão esforços para lucrar em cima da pandemia, seja através da pressão para que as instituições públicas adotem o ensino remoto — fazendo com que o Estado compre seus produtos e vire seu cliente fiel —, seja com a manutenção das caras matrículas, mesmo que isto signifique uma taxa de evasão.
Os riscos são friamente calculados para que o lucro dos acionistas e empresários seja cada vez maior. Cada sonho de cada estudante é um mero objeto nas mãos dessas grandes empresas. É por tudo isso que a educação não pode ser mercadoria.
¹Nota técnica nº 14/2020 do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
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