[Opinião] Há 50 anos atrás o Movimento estudantil de Curitiba protagonizou um dos fatos mais emblemáticos da história das lutas estudantis no Brasil

Por Jonathan F.* – Redação UàE – 18/05/2018

Em meio a grande tensão e o aumento da repressão e do terror da ditadura empresarial-militar, o clima de tensão era crescente. O golpe militar, em determinada medida, também colocou em xeque os direitos sociais até então alcançados. Nesse sentido, na Universidade Federal do Paraná (UFPR) se esboçou uma tentativa de teste para a privatização do ensino superior público.

Nas vésperas de maio de 1968, o ex-reitor da UFPR e Ministro da Educação Flávio Suplicy de Lacerda¹, determinou que, a partir do próximo vestibular, os calouros dessa Universidade começariam a pagar mensalidade. Isso se configuraria como um grave ataque as outras universidades federais e a todo o ensino superior público.

Segundo o então presidente do DCE da UFPR Vitório Serathiuk :“Lacerda fez um acordo com os Estados Unidos para transformar a universidade não em uma universidade popular e avançada, como querí­amos, mas em uma universidade tecnocrática com a introdução do ensino pago. E o grande teste seria em Curitiba”.

A escolha de uma implementação gradual do ensino pago tinha um caráter estratégico “Foi uma estratégia muito bem bolada pelo Suplicy, já que o calouro, que já passou pelo funil do vestibular, faria o que fosse preciso para entrar na universidade, inclusive pagar.” conforme explica Stênio Sales Jacob, ex-presidente da União Paranaense de Estudantes (UPE) e um dos articuladores do movimento na época².

Sob este fato se aglutinaram diversos setores do Movimento Estudantil, os quais prontamente se reuniram e começaram a se organizar frente a esta pauta. Devido a gravidade da situação, universitários, pré-universitários e secundaristas se uniram nesta luta. Sem o medo de travar os debates em espaços amplos e diretamente com os estudantes, esse movimento passou em todas as salas de aula de todos os cursos pré-vestibulares da cidade assim como a sala de aula em outros colégios e faculdades.

Paralelamente a isso, descobriu-se uma brecha no regulamento que possibilitaria a isenção da cobrança das mensalidades mediante a uma “ficha de requerimento de isenção”. Fato que foi prontamente utilizado pelos estudantes para aglutinar mais pessoas ao movimento. Com as devidas mobilizações o movimento conseguiu que 93% dos calouros conseguissem isenção do pagamento.

No entanto, isso não significou uma vitória e haveriam outros vestibulares referentes aos cursos novos, com isso, o processo de mobilização continuou a crescer. No dia 12 de maio, cerca de 200 estudantes tentaram inviabilizar o vestibular que iria ocorrer no Centro Politécnico, as forças repressoras foram prontamente acionadas e o confronto resultou na prisão de 59 estudantes que foram fichados e liberados em seguida.

No dia 14 de maio, às 7:30 da manhã, cerca de 1500 estudantes tomaram os 3 prédios centrais da Reitoria e o quarteirão foi isolado pelos manifestantes. O busto de Flávio Lacerda foi arrastado, teve o seu nariz serrado, apedrejado pelos estudantes e foi utilizado como material para a construção das barricadas.

Com o crescente aumento de radicalismo, mobilização e organização do movimento as forças da ordem foram obrigadas  a negociar e o pagamento de mensalidades foi revogado. Esse fato representava a crescente onda de radicalização e descontentamento dos setores progressistas frente a crescente repressão. Novamente o Movimento Estudantil dava uma lição de organização popular e vigor para o enfrentamento do status quo e a crítica a sociedade se expressava na prática do movimento.

Esses exemplos assim como diversos outros fatos sobre a organização da classe trabalhadora, são cuidadosamente subnotificados da grande mídia³. No entanto, não os esqueceremos, mas aprendemos com ele. São exemplos dessa ordem que nos ensinam que a política não se faz dentro dos gabinetes ou em reuniões de cúpula entre organizações mas sim no processo de mobilização e de formulações destinadas a todas e todos os estudantes.

¹ autor da conhecida Lei Suplicy que serviu como base para criminalizar e proibir qualquer ação política pelos estudantes e seus orgãos de representação. ² Ambas as declarações assim como boa parte das informações desta matéria podem ser acessadas em http://www.jornalcomunicacao.ufpr.br/jornal/?p=3709 ³ https://www1.folha.uol.com.br/banco-de-dados/2018/05/1968-universitarios-protestam-cercam-reitor-e-obtem-vitoria-em-curitiba.shtml *O texto é de inteira responsabilidade do(s) autor(es) e pode não refletir a opinião do Jornal. ]]>

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