Dados cesta básica/Montagem UàE
Dados cesta básica/Montagem UàE

[Opinião] O aspecto urbano da crise

Imagem: dados do IBGE, montagem Universidade à Esquerda

Lara Albuquerque – publicado originalmente em Universidade à Esquerda

Cada vez mais a crise alcança diversos setores da classe trabalhadora, é certo que a pandemia fez agudizar a crise que já se encontra em curso há mais de uma década. A alta nos preços mês a mês, vem corroendo os salários dos trabalhadores e deteriorando as condições de vida.

Na última nota à imprensa do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) sobre a Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos, constatou-se que houve alta dos preços da cesta básica em 13 das 17 capitais investigadas no mês de agosto de 2020. As cestas mais caras foram as das cidades de Porto Alegre, seguida de Florianópolis, São Paulo e Rio de Janeiro. Ao comparar os preços de agosto de 2020 e os deste ano, o preço subiu em todas as capitais em percentuais que vão de 11,90% (Recife) até 34,13% (Brasília). Considerando o piso do salário mínimo (R$1100), na média das 17 capitais, é necessário trabalhar 113h49m para comprar a cesta básica. Ou seja, em quatro semanas trabalhando em uma jornada de 40h e totalizando 160h no mês, sobram apenas 47h11m de trabalho remunerado para as demais despesas, ou um valor próximo a R$300,00.

A alta no preço dos alimentos afeta diretamente a capacidade de consumo dos trabalhadores, consumindo a maior parte dos salários, restando pouco para os demais itens de consumo básico. Por um lado limita a possibilidade de acesso a outros itens da cesta e, por outro, compromete os salários futuros pela via do endividamento. Com o botijão de gás girando em torno de R$100, sobram as contas de luz, água, telefonia, farmácia e aluguel- para citar o mínimo.

Conjuntamente, vivenciamos nos últimos anos – e em especial neste último, uma elevação nos preços dos aluguéis. O mercado imobiliário mobiliza um grande conjunto de capitais nas grandes cidades, e sua dinâmica também compromete grande parte dos salários (e das dívidas). Além de forçar o afastamento das áreas centrais das cidades por parte da classe trabalhadora, gerando assim o consumo da renda com transporte etc. A infraestrutura urbana é central no cotidiano dos trabalhadores que vivem nos centros urbanos, porém nessa área avançam as terceirizações e privatizações da distribuição de energia, das águas, do saneamento, da limpeza urbana, do cabeamento de internet e telefonia, do transporte etc, em suma, há um conflito de interesses entre público e privado que diz respeito à busca dos capitais por expansão da valorização.

Ou seja, a lógica capitalista dirigindo nessas áreas é uma das responsáveis pelo aumento dos preços, pela precarização do trabalho nestes setores e pela baixa qualidade dos serviços prestados à população. Uma vez que são estes capitais que estabelecem qual qualidade oferecerá, quais trabalhadores vão ou não receber os serviços de acordo com o bairro que residem. A política de privatização tem seguido um curso contínuo durante toda a Nova República, e ganha agora novo impulso no governo Bolsonaro.

Todos esses fatores, atingem em cheio a classe trabalhadora e comprimem a qualidade de vida principalmente nos grandes centros urbanos, onde o custo de vida tende a ser maior. Tudo isso está diretamente relacionados à estrutura econômica dependente e a disposição do Estado em despender fundo público na manutenção desta estrutura, seja na injeção de fundo público pela via de financiamentos, obras auxiliares ou incentivos e desonerações fiscais, seja pela entrega do patrimônio público – formado, mantido, restaurado pelo fundo público – com as terceirizações e privatizações.

Os leilões de imóveis da União, autorizados a partir da lei nº 14.011/2020, somado a outros mecanismos, visam acelerar e facilitar processos de concessão e venda dos imóveis da União. No caso dos imóveis nos centros urbanos é evidente que a venda a preços abaixo do mercado, trata-se de uma política de entrega do patrimônio públicos, a qual, se concluída, pressionará ainda mais a vida da classe trabalhadora nos centros urbanos, uma vez que incidirá nos custos de vida de cada região e na própria organização urbana, favorecendo processos de gentrificação.

Num cenário de crise, somado a níveis alarmantes de desemprego e informalidade, a entrega desse patrimônio se torna ainda mais drástica, uma vez que enfraquece a capacidade coletiva de respondermos a ela a favor dos interesses da classe trabalhadora. O enfrentamento dos grandes dilemas econômicos de nossa classe é urgente e pensar as condições mais básicas de vida é essencial, por isso se faz necessário debater as cidades, os projetos urbanos em disputa e os conflitos com a lógica capitalista.

Leia mais: Confira os textos sobre o tema publicados no Jornal Universidade à Esquerda

Amanhã, dia 30 de setembro, às 18h30 a Escola de Formação Política da Classe Trabalhadora Vânia Bambirra (EFoP) irá realizar um debate com Cláudio Ribeiro e Sara Granemann, ambos professores da Universidade Federal do Rio de Janeiro, intitulado Patrimônio público, urbanismo e a sanha capitalista. Inscrevam-se através do site:

https://www.efopvaniabambirra.com.br/events/patrimonio-publico-urbanismo-e-sanha-capitalista-1

Confira também o último Circulação da Balbúrdia que debateu a pesquisa Mercantilização de terras públicas e direito à moradia realizada por Luiza Bertin.

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