Jussara Freire* – Redação UàE – 07/05/2018
Na última reunião do CEB – Conselho de Entidades de Base, ocorrida em 27 de Abril, após uma longa discussão sobre o encaminhamento de notas a respeito do assédio cometido pelo Secretário de Esportes, Edison Roberto de Souza, às atléticas durante o processo de consulta para a reitoria e sobre práticas de censura presentes no movimento estudantil, entrou para a pauta do dia o retorno da deliberação de regimento próprio daquele Conselho.
Em primeiro lugar, é preciso atentar para o fato de que a discussão que havia iniciado em novembro do ano passado, foi colocada de volta em pauta sem nenhuma pretensão de contextualizar e retomar a pertinência daquilo que estava sendo encaminhado, ou seja, quais exatamente eram os problemas que precisavam ser resolvidos e que resultaram na deliberação de formulação de um regimento. O que são requisitos mínimos para a retomada de qualquer debate. Agir diferente disso significa tratar o movimento estudantil como se fosse estanque e não houvessem mudanças de pessoas e gestões nos Centros Acadêmicos.
Desta forma, houveram investidas que tentaram iniciar um debate sobre como e por que aquele regimento estava em debate para aprovação, tentando colocar os representantes dos centros acadêmicos para refletir se estavam esclarecidos sobre os problemas que ele se propunha a resolver, se e por que ele seria a melhor alternativa para isto, além de questionar a prioridade em debatê-lo naquele conselho, frente a outras questões urgentes, como as OS’s no serviço público da cidade.
Contudo, tentou-se abafar a tentativa de iniciar esse questionamento e o debate acabou descambando em uma votação sobre os Centros Acadêmicos serem contra ou a favor do regimento, já ali, naquele momento. É preciso deixar claro que a discussão ter tomado esse rumo foi um grande erro. Pois antes de qualquer votação, era preciso ter clareza se os representantes ali presentes haviam debatido o regimento em suas bases! E no fim das contas esta é a pergunta central: Quais foram os C.A.’s que conseguiram ampliar a discussão e refletir sobre as implicações desse regimento tanto na forma de fazer política do próprio Conselho, como de suas entidades? Tanto na época em que foi deliberado inicialmente por este caminho, quanto agora na retomada de sua discussão. Houve alguma discussão nas reuniões dos Centros Acadêmicos que foram além dos repasses sobre como se votou na reunião anterior?
É preciso perguntar para o conjunto dos estudantes que constroem ou se interessam pela atuação de seu Centro Acadêmico: “você sabe o que sua entidade está votando no Conselho de Bases? Sabe que isto existe e qual é o seu papel?” . Aqui não é preciso de muita ousadia para arriscar que em quase toda a Universidade a resposta para esta pergunta é não.
Penso que por um lado é compreensível que os c.a’s talvez nem pensem em debater estas questões em seu interior, tanto pela própria forma que as discussões acabam tomando neste conselho, como por estarem envolvidos com outras demandas urgentes de seus cursos e da conjuntura. Além de algumas representações serem realizadas por comissões eleitorais, que não possuem um programa eleito que lhe permita atuar nos termos de reuniões deliberativas de uma gestão. Porém, hoje uma nova reunião do CEB está convocada para ser realizada ao meio dia, para dar continuidade a discussão dessa pauta e é preciso colocar em questão: como se portarão os representantes discentes dos Centros Acadêmicos? Permitirão que esta deliberação continue sem refletir sobre seus efeitos com sua base?
Quais são os reais problemas do CEB?
Com as perguntas realizadas acima, é possível perceber que sim, o CEB possui problemas hoje. Se formos fazer um exercício reflexivo, eles podem ser compreendidos da seguinte forma: 1) O caráter deste Conselho, de articulação para mobilização dos Centros Acadêmicos na atuação de pautas centrais e controle social do DCE está há muito tempo perdido, 2) Os conflitos e pautas que ganham corpo neste espaço estão dentro dos marcos da pequena política¹ e é por ali que se resolvem, mas esta não é uma característica própria deste espaço; 3) Este desvio de característica faz com que levar as discussões que acontecem no CEB para serem debatidas na Base perca o sentido, se torne algo banal, e quando discussões decisivas vêm à tona já é tratado com normalidade que os representantes votem sem discussões amplas em suas bases sobre as implicações das deliberações que ali são feitas.
Para melhor compreender os problemas que foram pontuados, em primeiro lugar, basta olhar para as pautas de convocação de todos os CEB’s dessa gestão. O único CEB que se propôs a discutir uma pauta central foi o da moradia, todas as demais pautas, como ru, envolvimento das fundações em processos fraudulentos, atuação da força policial na Universidade, OS’s no serviço público, etc, não passaram e não estão passando por aquele conselho. No máximo são tratadas tardiamente em reuniões ampliadas do DCE, que não possui, nem de longe, a mesma função de articulação.
E para os que sofrem de problemas de memória sobre o papel articulador de lutas do CEB, basta retomar como nos últimos anos, mesmo com uma gestão de direita, este espaço cumpriu também um importante papel para ajudar a mobilizar o movimento estudantil nas pautas e assembleias sobre os cortes orçamentários na Universidade e a PEC 241.
Em segundo lugar, é preciso olhar para as últimas reuniões do CEB, as mais conflituosas que houveram neste ano até então. Os temas debatidos tratavam da não regulamentação da gestão, que tem implicado na inviabilidade de produção de carteirinhas, da ausência dos representantes discentes indicados pela gestão em órgãos representativos e da tentativa de impedir a autoconvocação do CEB pelo CALICO – Centro Acadêmico Livre de Computação.
Depois de um longo período de cobranças diárias e incisivas sobre essas faltas, protagonizado por uma série de atores ligados à Chapa zero e aos grupos anteriores que compuseram as gestões de direita anteriores do DCE, como todas essas questões acabaram se resolvendo com o encaminhamento de produção de notas pelo próprio CEB? O que significa esta conformação diante de problemas que claramente não foram resolvidos? Questões que são sim graves – e diferente do que possa parecer, é a omissão em reconhecê-las que é uma forma de contribuição com a direita -, de repente se resolvem com notas de facebook que boa parte deste grupo de oposição adora rechaçar?
Tudo isto leva à perguntas que acredito serem as mais necessárias quanto a este ponto: por que, logo depois de tantos conflitos, a proposta de regimento volta assim repentinamente ao CEB? E por que os atores da oposição envolvidos no conflito anterior, estão votando junto com o DCE? Como inimigos de uma reunião para a outra viram aliados? Ouso arriscar um palpite aqui, de que talvez essa tenha sido a forma de incorporação (seja ativa ou passiva), capaz de tranquilizar as críticas realizadas pela direita. Um sintoma da pequena política operando na sua forma mais precisa.
Por fim, uma simples leitura nos artigos propostos pelo regimento deixa claro que ele está longe de resolver qualquer um dos três problemas apontados acima. Pelo contrário, a forma para qual se encaminha sua aprovação atua exatamente dentro desses termos: mantendo as pautas centrais e que demandam articulação do movimento estudantil longe da ordem do dia do CEB; resolvendo os conflitos pela incorporação ativa e passiva da oposição; e a principal entre todas as questões – a base está excluída do debate sem sequer ser lhe dada a possibilidade de perceber isto. O que um regimento para este Conselho, que se institui dentro desta forma de fazer política, significa para o futuro organizativo das questões do movimento estudantil?
É preciso lembrar que o conselho de entidades de base não é um parlamento! A participação no conselho não é o de um representante delegado para fazer o que quiser, mas é a própria participação dos centros acadêmicos e das discussões que fazem com seus cursos. Seguir tratando-o desta forma é o que permite a resolução de seus conflitos pela gramática da conciliação e destrói tanto com a liberdade de crítica quanto com a ação transformadora do movimento estudantil.
¹ De forma resumida, pode-se dizer que a pequena política é aquela que se sujeita ao que está dado pela via da conciliação, porque reduz os conflitos aos debates de menor importância parlamentares e às lutas pelo predomínio no interior de uma estrutura já estabelecida. (Para uma melhor compreensão, recomendo a leitura deste texto de Alváro Bianchi: Hegemonia da pequena política: uma fórmula errada que deu certo.)
*Este texto não necessariamente reflete a opinião do jornal.Leia também: [Debate] Uma outra esquerda é possível: As consequências de um frente abstrata de esquerda no DCE
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