Clara Fernandez* – Redação UàE – 07/05/2019
Na Universidade, cada categoria têm a sua entidade representativa máxima que em tese, deveria ter como função primordial, organizar e mobilizar a sua categoria em torno da defesa da educação pública. Na Universidade Federal de Santa Catarina, Os professores têm a APUFSC – Associação de Professores da UFSC, e também a seção local do ANDES – Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior; os Técnicos Administrativos em Educação têm o SINTUFSC – Sindicato dos Técnicos da UFSC; os estudantes de graduação têm o DCE – Diretório Central dos Estudantes, além de seus Centros Acadêmicos em cada curso; e os estudantes da Pós-Graduação possuem a APG – Associação de Pós-Graduandos. Desde a constatação e anúncio dos cortes de 30% de verbas de todas as Universidades Federais, que hoje completa uma semana, foi possível identificar as seguintes ações por parte dessas entidades:
APUFSC: uma série de publicações na página do facebook.
ANDES: tem buscado mobilizar seus associados para a greve nacional da educação do dia 15 e convocou assembleia geral extraordinária para o dia 09, próxima quinta-feira.
SINTUFSC: algumas publicações no site do sindicato e convocação de uma Assembléia para esta semana, no dia 09 de Maio, com pouquíssima divulgação por parte do mesmo.
DCE: nota de repúdio, chamado para uma reunião ampliada sobre o tema na próxima quarta-feira, dia 08, e convocação de uma assembleia para o dia 14 – um dia antes da Greve Nacional da educação; através de sua página no Facebook.
Centros Acadêmicos: Pedagogia está chamando uma assembleia para o dia 08, Quarta-feira. Neste mesmo dia também há uma Assembléia que já estava prevista na semana acadêmica de história, onde foi incluída a pauta dos ataques à Educação. A filosofia está chamando uma reunião ampliada para este mesmo dia, também, visando organizar as lutas dos estudantes. A arquitetura terá Assembléia Geral no dia 09, Quinta-Feira.O Serviço Social está chamando Assembléia para o dia 13 de Maio, Segunda-feira da próxima semana.
APG: Realizou uma reunião na manhã de ontem, dia 06, para discutir sobre os cortes de verbas e convocou uma assembléia para debater o tema no próximo dia 08, Quarta-Feira.
Ontem, dia 06, também foi noticiado por parte do SINTUFSC, uma reunião em que este sindicato, APUFSC, DCE e APG se reuniram para ver seus pontos de convergência em defesa da Educação Pública.
Quando se trata das ações da maioria das entidades de representação máxima das categorias, o que chama a atenção é que as manifestações têm se restringindo as redes sociais, desde as reações a este corte, até os chamados para eventos de mobilização e assembleias. Ainda que neste meio hajam entidades que têm se dedicado de forma exemplar à construção de todas as lutas dos últimos ciclos em defesa da educação, não tem havido passagens em sala de aula e setores, ou mesmo alguma panfletagem em torno do tema acontecendo. As categorias da Universidade têm sentido que muito pouco está se fazendo frente a gravidade das situações apresentadas. E não é que não haja vontade política. Tem chegado a este jornal diversas mensagens de leitores pedindo sobre quais as atividades de mobilização que estão acontecendo na Universidade ou dando ideias de mobilizações possíveis. Frente ao marasmo de mobilizações, na última sexta-feira, dia 03, um bom número de estudantes até tentou formar um ato espontâneo em defesa das ciências humanas, como uma forma de tentar esboçar alguma reação a essa terrível conjuntura que tem se demonstrado de forma mais evidente na última semana.
Talvez, algum toque de aparência possa nos fazer crer que pelo menos o DCE têm feito algo a mais por nós, pois pelo menos convocou uma reunião e uma assembléia sobre o tema. Me parece que é justamente aí que precisamos olhar com bastante atenção e criticidade ao que tem sido feito até então, pois há grandes problemas a serem levados em consideração. O primeiro deles, é lidar como se os cortes já não tivessem se efetivado. Na convocação para a Assembléia Geral Estudantil da UFSC, o DCE fala que “Se cortar, a Universidade vai parar!”. Em que Universo a direção da entidade está vivendo? Que anacronismo é este? O MEC já cortou! É de uma irresponsabilidade tremenda atuar e lidar como se estivéssemos enfrentando algo por vir. O por vir têm de ser a derrubada desta medida criminosa que já está em vigência!
Outro fato que chama a atenção, é que mesmo que o anúncio dos cortes tenha sido feito há uma semana, a assembleia está sendo convocada apenas para o dia 14, um dia antes da greve nacional da Educação. Para que, afinal, há de servir esta assembleia? Para concluir que as pessoas devem participar da greve? E antes disso? Por onde passa a mobilização e organização do movimento estudantil? Pois vejam, não se trata de somente “meter o louco” e reagir de qualquer modo. Se trata de organizar quais ações serão feitas, de que modo, de onde é possível dispender as energias de forma mais prudente, sem que também nos deixemos dominar de forma irresponsável pela urgência da situação. Um exemplo disto são as ações dos metroviários de São Paulo, que fizeram coletes com suas pautas e organizaram panfletagens junto à população contra a reforma da previdência. Afinal, achamos que vamos salvar as Universidades sem estarmos junto dos demais setores da sociedade contra todas as demais pautas destrutivas deste governo?
Pode-se argumentar que a reunião ampliada chamada para o dia 08 pelo DCE possa vir a ter esse fim, e talvez tenha mesmo, mas certamente não será por parte da direção da entidade. Por que afirmo isto? Em primeiro lugar, porque nos últimos dois anos em que a direção do DCE está nas mãos do grupo atual, estas reuniões ampliadas têm tido a finalidade de justificar o fato de que não se chamam mais reuniões do CEB – Conselho de Entidades de Base com outros fim, que não o de resolver questões burocráticas. Este espaço perdeu seu caráter organizativo das questões mais emergentes dos estudantes.
O CEB é o organismo deliberativo que reúne todos os Centros Acadêmicos, Diretórios Acadêmicos e Grêmio Estudantil do Colégio Aplicação. É o espaço em que as entidades estudantis debatem e deliberam questões que tocam a comunidade estudantil. Na hierarquia do Movimento Estudantil, o CEB é superior à gestão do DCE e inferior à Assembleia Geral e ao Congresso. As conclusões das reuniões ampliadas que visam suprimir o real papel do CEB sempre têm se dado em agendas de mobilizações que a própria direção da entidade não coloca esforços reais para que se efetive, ou então, para que as lideranças da entidade usem os espaços como palco para falas sem muito propósito além do de autopromoção.
Em segundo lugar, ao mesmo tempo em que é possível observar que a pauta dos cortes de verbas tem poucas energias despendidas para si por parte da direção da entidade, há esforços tanto da direção desta, quanto de outros setores do movimento estudantil da Universidade em chamar os estudantes a votarem nas chapas para o Congresso da UNE e seguirem construindo o regimento do Congresso Estudantil da Universidade, como se estas atividades continuassem sendo muito mais urgentes do que qualquer mobilização que deveria estar ocorrendo neste momento em função dos cortes. Há até reuniões do CEB sendo convocadas pelo DCE com menos de 48 horas de antecedência (após a reunião desta segunda-feira, dia 06/05, foi convocada uma nova para esta terça, dia 07/05). Mas com que finalidade? Terminar o regimento do Congresso de Estudantes da UFSC que tem como intuito atualizar o estatuto do DCE. Nada de reunir todos os Centros Acadêmicos da Universidade para debater a pauta do corte.
Ou seja, não é por mera estratégia equivocada que a Assembléia Geral Estudantil foi marcada tão em cima do laço. O DCE e todos os outros setores do movimento estudantil envolvidos com as eleições do CONUNE e com a realização de um congresso que vai acontecer para colocar o estatuto do DCE em dia, colocaram a prioridade de suas energias em outro lugar e não estão dispostos a rever tal foco mesmo com o anúncio de que a Universidade pode fechar em Agosto! Mas não se trata somente de uma questão de negligência, esta escolha acaba tendo uma outra função, extremamente desorganizativa: nega as condições necessárias para que os estudantes possam se articular e formular a estratégia mais acertada para enfrentar este momento decisivo ao futuro da Universidade Pública. Esta escolha acaba por nos deixar mais uma vez, assim como tem sido nos últimos ciclos de luta, reféns do desespero da decisão que precisa ser realizada na última hora.
Quando se trata do SINTUFSC, é notório que sua direção desenha uma política para fracassar a mobilização. Nas últimas semanas convocaram dois atos, no dia 24 e 30 de Abril, aos quais não se deram o trabalho de construir, divulgar, mobilizar. O resultado: ambos não tiveram mais que 30 trabalhadores aproximadamente e um clima de derrota e enfraquecimento.
Não à toa, afinal nem mesmo estão dispostos a debater as estratégias de luta com os trabalhadores. Há semanas que uma assembleia é reinvidicada pelos TAEs, mas apenas no dia 09 ela será realizada. E novamente, outra atividade pouco divulgada e construída. Nem mesmo esperam que muitos trabalhadores participem.
Com a APUFSC a situação é ainda mais precária: anos de imobilismo e burocratização não apenas deixam de promover mas dificultam a luta dos professores. Tem sido o trabalho árduo da seção sindical do ANDES na UFSC o ponto de debate e mobilização dos docentes.
Enquanto isso, em Universidades como UFPE, UFGD, UFF, UFBA, USP e UFPR já estão sendo realizados nesta semana atos, assembleias, e agendas de panfletagens e passagens em sala. Seja por setores específicos ou unificados da Universidade. Este sentido de urgência não têm sido menosprezado.
“Não é hora de criticar! É hora de se unir!”
Pelo contrário, esta é a hora em que a crítica mais dura precisa ser feita, pois só assim poderemos nos dispor a não cair nas armadilhas e equívocos que têm nos levado a todo o tipo de derrota e fracasso em questões tão cruciais para o futuro da nossa Universidade.
Muitos dos que compõem as diversas categorias da Universidade hoje estão desacreditados da efetividade de uma assembleia, de uma passagem em sala e setores de trabalho. Por vezes estes espaços têm servido muito mais como palco para que as organizações políticas se utilizem de falas que visem uma autopromoção, perdendo sua real efetividade para ações que nos ajudem a reagir aos ataques que sofremos na Universidade. Mas isto não precisa e não pode continuar se dando deste modo em um momento tão decisivo, pois estas são as únicas armas efetivas de combate que nos restam.
Além disto, nos últimos momentos de lutas que vivemos, vimos que as estratégias de reação feitas sem uma boa organização, em cima do laço, na base do impulso, fizeram com que movimentos perdessem seu fôlego mesmo tendo acabado de nascer. É preciso dispender nossas energias de forma inteligente! E isto depende de termos condições de debater nossas estratégias e não sermos apenas guiados cegamente pelo momento.
O que quero dizer com este texto é: independente de a direção das entidades estarem vacilantes, não há outra saída para nós, se não, que as bases ocupem as entidades para conduzi-las ao sentido necessário de resistência que se faz nesse momento. A mobilização que pode ser capaz de defender a nossa Universidade não pode passar por fora das nossas entidades, mas também não pode ficar exclusivamente nas mãos daqueles que têm nos conduzido aos caminhos da derrota. Os estudantes secundaristas do país há tempo têm nos dado exemplos da capacidade organizativa que temos desde a base, temos muito a aprender com eles, mas isto não pode ser apenas uma questão retórica
Exemplos não nos faltam: na UFSC em 2015 os docentes decidiram pela greve, passando por cima da direção da APUFSC, entendendo que esta é uma decisão da categoria e não da direção sindical – tendo inclusive reconstituído uma experiência histórica de greve unificada com TAEs e estudantes de diversos cursos paralisados; em 2016 contra a vontade da direção do DCE que estava nas mãos da direita, os estudantes produziram uma onda de ocupações e greves contra a PEC do teto dos gastos, tendo inclusive realizado uma massiva assembleia convocada pelo CEB; em 2014, os garis do Rio de Janeiro fizeram uma gigantesca luta por condições dignas de trabalho que saiu vitoriosa, tendo enfrentado inclusive a direção de seu sindicato que compactuava com o patronato; e em 2013 às ruas desse pais foram tomadas por nossa indignação e queimaram com nossas reivindicações. Experiências não nos faltam!
É possível que isto possa ser feito também no movimento estudantil, hoje, por parte dos setores não orgânicos ao DCE. É preciso empurrar a gestão atual a fazer a mobilização que se necessita, ou seja, pressionar que pelo menos da reunião do dia 08 saiam efetivamente organizadas panfletagens e passagens em salas de aula. Além disso, é preciso não deixar as tarefas de organização e planejamento das mobilizações na mão da direção da entidade. Os estudantes que têm vontade política de fazer algo para salvar a Universidade neste momento precisam ir além de esperar e confiar na direção do DCE para garantir a mobilização necessária para enfrentar os cortes da Universidade. Docentes e TAEs tem o mesmo desafio frente às direções da APUFSC e do SINTUFSC.
Vejam, este corte não é o primeiro, cortes vêm ocorrendo desde o governo Dilma, e desde lá temos tido dificuldades de mobilização. Entretanto, este não é só mais um corte. Ele é o corte que está anunciando o fim das Universidades. Diversas instituições, entre elas a UFSC, estão declarando que com este estrangulamento de verbas suas portas estarão fechadas a partir do próximo semestre. Estamos diante de um momento decisivo e não podemos vacilar. Isto não significa somente que precisamos romper com o engessamento que tem nos tomado, mas que agora, mais do que nunca, nossas ações precisam ter sentido, precisam ser astutas, precisam ser certeiras! A nossa indignação tem poder de transformação, precisamos confiar na nossa capacidade de mobilizá-la e temos um caminho possível para fazer isso: através das lições históricas que outras lutas que já travamos têm a nos oferecer
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