Fotos: UFSC à esquerda
A Greve Nacional dos Servidores Técnico-Administrativos em Educação (STAEs) já alcança 59 dias e 66 Instituições de Ensino (60 Universidades Federais, 5 Institutos Federais de Educação e 1 CEFET). Sendo uma das maiores greves dos STAEs, em relação à adesão dos sindicatos, demonstrando a força e a disposição das trabalhadoras e trabalhadores de lutar pela defesa da Universidade Pública, contra os cortes e pela valorização dos trabalhadores do serviço público federal. No entanto, há ainda muita dificuldade de traduzir efetivamente este momento das bases nas instâncias diretivas do movimento (tanto localmente na UFSC, quanto nacionalmente) o que torna o cenário da greve ainda mais complicado para os STAES.
Perspectiva Geral – Apresenta-se a possibilidade de uma saída conservadora para a greve dos STAES
Em primeiro lugar, é preciso colocar em evidência o que de fato está em jogo nessa greve. Neste momento está em curso um desmonte geral dos serviços públicos, com os cortes no orçamento da educação e saúde, e com o governo apontando para o achatamento do peso da folha salarial da servidoria no orçamento da União. E mais especificamente um duro ataque à Universidade Pública – com o claro intento de precarizar para privatizar.
Não à toa o corte no orçamento da Educação Pública, cerca de 9,4 bilhões, enquanto o investimento no Programa de Financiamento Estudantil (FIES) e no Programa universidade para Todos (PROUNI) que em larga medida sustentam as universidades particulares (controladas por fundos de investimento) supera esse valor, 13 bilhões e 3,9 bilhões de reais respectivamente. Sem contar as emissões de títulos da dívida pública em favor do FIES que já chegam a quase 2 bilhões de reais só neste ano. Ou seja, os cortes não são um mero ajuste de contas do governo, mas sim uma opção por alocar os recursos do fundo público para o capital financeiro e uma opção por um projeto de educação empresarial e privatizante. O que está em questão neste momento é o próprio futuro das universidades e do caráter público da educação.
Assim, o momento da greve na educação passa pela necessidade da defesa ampla da Universidade Pública, Gratuita, Laica e de Qualidade Socialmente Referenciada. Passa pela luta firme contra os cortes, pela recomposição do orçamento da educação pública. Pela defesa de condições dignas de trabalho e estudo nas universidades. Pela valorização dos trabalhadores, pela recomposição das perdas salariais. Contra as terceirizações e pela reabertura de concursos para cargos extintos. Enfim, um momento de lutas para fortalecer a Universidade Pública.
São estas questões que têm levado grande parte dos trabalhadores a greve e a mobilização. São estas questões que tem levado as bases a avançarem cada vez mais na luta. E que têm criado a necessidade e a possibilidade de lutas conjuntas com servidores docentes e estudantes. Colocando em diversas universidades experiências significativas de radicalidade e força (como na UFF, UFBA, UFRJ, entre outras).
No entanto essas experiências, o avanço das bases e as lutas conjuntas, muito pouco tem se traduzido no Comando Nacional de Greve (CNG) e na direção da FASUBRA[1]. O que tem dificultado que elas se multipliquem e que a greve nacional tome o corpo e a força que pode ter. Tampouco a disposição dos trabalhadores na luta contra os cortes tem refletido significativamente nas ações destas instâncias de direção. A conjunção destes fatores, por sua vez, abre o campo para se desenhe uma saída conservadora para a greve dos STAES.
Esta possibilidade se apresenta na cenográfica mudança de postura do governo e pode se concretizar se os trabalhadores não mantiverem uma postura firme na defesa de suas pautas. Diferentemente do início da greve, nas últimas semanas o governo tem chamado mesas de negociação, tanto mesas gerais com o conjunto dos servidores públicos federais quanto mesas específicas com os STAES. Essa aparente abertura para o processo negocial foi conquistada com muita pressão dos movimentos. E por parte da FASUBRA e do CNG, no que tange principalmente a mesa específica, tem sido avaliada como uma vitória do movimento paredista.
No entanto, o que essa suposta abertura do governo esconde é que não há realmente em negociação nenhuma questão central. Na mesa geral, o governo colocou uma proposta descabida em relação ao reajuste salarial, de 21,3% em 4 anos quando a pauta dos servidores é de 27,3% neste ano apenas para recompor as perdas inflacionárias[2]. Esta proposta do governo, obviamente rechaçada pelos movimentos, decreta a desvalorização dos salários e joga para imobilizar os trabalhadores por 4 anos. Nenhum outro ponto da pauta dos servidores públicos federais foi tocada nas negociações.
Na mesa específica dos STAES o mesmo tem ocorrido: nada de central está efetivamente nas discussões. Ou seja, o governo simula negociar com os trabalhadores para efetivamente não atender as questões centrais de suas reinvindicações.
Neste contexto se desenha uma possível saída conservadora para a greve dos STAES: aceitar um acordo rebaixado em mesa específica e enfraquecer a luta em defesa da Universidade Pública. Os setores governistas nas direções nacionais e locais (inclusive no SINTUFSC) já dão indícios desse caminho, apontando os “avanços” das negociações e com o discurso que os trabalhadores não podem ser “intransigentes” e partir para “tudo ou nada”. Escamoteiam que tudo que o governo apresenta é quase nada para os trabalhadores – enquanto, apresentam muito para os empresários da educação.
Mas, nada de diferente era esperado destes sujeitos (governismo). A tendência que está aberta é que a racionalidade eficientista do que se chamou de “sindicalismo de resultados” possa tomar o restante do CNG e da FASUBRA. E se assim poderão ceder e trabalhar para que as bases aceitem um acordo que estrangule a luta da categoria para garantir que a greve termine com algo que possam chamar de “vitória”. Se essa possiblidade se concretizar a real vitória será do governo e dos empresários que iniciam a desobstaculizar seu caminho para o desmonte e privatização da Universidade.
No entanto, a contra-tendência é que as trabalhadoras e trabalhadores rejeitem massivamente este tipo saída para luta e tentem passar por cima de qualquer direção que pelegar neste momento. Traçando assim uma importante experiência de acúmulo na organização e qualificação das lutas.
SINTUFSC – A Luta Interna Contra o Governismo e a Impaciência dos Trabalhadores
Na UFSC a luta interna dos trabalhadores contra o conservadorismo representado na direção do SINTUFSC é concreta e intensa. Já temos apontado em nossos textos o papel que vem cumprindo a direção do sindicato na desorganização e amortecimento da luta dos trabalhadores[3]. Esta direção sintetiza o que há pior no sindicalismo brasileiro, assentando-se em mecanismos clientelistas e patrimonialistas.
Sua posição é cínica. Não se posicionam abertamente contra a greve, mas agem para desorganizá-la e impedir que os trabalhadores ofereçam qualquer ameaça política para o governo e a reitoria. Exemplos não faltam: ausência na audiência pública com a reitoria no dia 9 de julho; obstrução do comando local de greve dos STAES para que este não organizasse protestos em eventos importantes como a inauguração da ponte de Laguna em que a Presidente Dilma Rousseff esteve presente, ou na visita do Ministro da Educação a Joinville no dia 22/07; tentando impedir a aprovação do Comando Unificado de Greve (CUG-UFSC) nas assembleias; Agindo de forma truculenta, machista e desrespeitosa com as trabalhadoras e trabalhadores, etc.
De forma geral a atuação da direção do SINTUFSC na greve só fez tentar de todas as formas desanimar os trabalhadores, imobilizá-los e impedir que avancem na luta tanto em seus métodos quanto programaticamente. Sua postura é de cercar a greve e amortece-la, e de tentar garantir que as novas gerações de trabalhadoras e trabalhadores não possam adquirir uma significativa experiência de lutas. Assim, ainda que discursivamente possam criticar o governo e a reitoria, representam a face mais retrógrada do governismo.
O pior é que o fazem utilizando politicamente os trabalhadores mais precarizados da categoria: os aposentados, e os trabalhadores (em geral também de idade avançada) das faixas salariais mais baixas. Esses trabalhadores que em grande parte estão nas greves desejando contribuir com a luta são usados pela direção por meio de uma política clientelista com distribuição de diárias nas viagens a Brasília que funcionam na prática como um complemento salarial, brindes em festas, etc. Assim, tratam estes trabalhadores como seus instrumentos, cobrando que adiram a suas posições sob ameaças que não terão vaga nas caravanas. Não há dúvidas que esses STAES, em sua maioria, estão ali porque querem dar sua contribuição legítima ao movimento, e é exatamente por isso que é ainda mais perversa a atuação da direção do SINTUFSC para com eles – usando-os contra seus próprios anseios de luta por melhores condições de trabalho e vida.
Com estes mecanismos a direção consegue certo lastro para executar suas ações de sabotagem da organização dos trabalhadores. Por exemplo, desorganizando o Comando Local de Greve para que seja uma instância inutilizável pelos trabalhadores, atravancando as assembleias… No entanto, os trabalhadores tem perdido a paciência. E não toleram mais a política conservadora da direção do sindicato.
A indignação dos trabalhadores está visível no movimento, nas assembleias, nas reuniões do comando local de greve, no cotidiano da greve. E atinge uma ampla gama da categoria, incluindo parte dos trabalhadores que poderiam ser considerados como base de sustentação da atual direção do SINTUFSC. Ainda que com inciativas incipientes esta movimentação tem tornado menos árida a greve dos STAES na UFSC.
Foi a revolta da base dos trabalhadores que garantiu a aprovação em assembleia de greve dos STAES no dia 8 de julho da proposta dos docentes em greve de criação de um Comando Unificado de Greve na UFSC (CUG-UFSC). Uma vitória contra o cerco da direção do sindicato, que prefere fazer coro ao reacionarismo da APUFSC (a mesma associação que é contrária à democratização interna das IFES e defende os 70/30 na eleição para reitor) deslegitimando o movimento docente, os trabalhadores deram uma importante prova de sua combatividade.
Esta vitória, com a criação do CUG-UFSC pode proporcionar uma significativa experiência para ambas as categorias na luta em defesa da Universidade. Possibilitando aos trabalhadores a construção de atos conjuntos, a defesa do direito de greve, a amplificação dos debates. Enfim abrindo campo para uma caminhada conjunta pela garantia do sentido público da educação.
O que é significativo é que essa vitória indica que a indignação dos STAES com o governismo e conservadorismo da direção do SINTUFSC começa a se constituir, ainda que com muitas dificuldades, em um corpo de lutas. O caminho de fato é longo, o cercamento do SINTUFSC por esses setores trouxe muitos danos à categoria, para conformação de uma consciência de classe coletiva entre os trabalhadores. Priva-os de extrair as experiências de lutas das gerações anteriores que tanto pelearam pela Universidade Pública; priva-os de construir uma boa memória crítica sobre as experiências recentes de luta da categoria; de avançar programaticamente na construção de posições e entendimentos para a Universidade e para a sociedade e consequentemente também de avançar nas lutas. Há que se furar ainda todos esses cercos, de forma organizada e incisiva. Se esse corpo vai se concretizar é incerto, mas é uma aposta necessária que as trabalhadoras e trabalhadores STAES têm corajosamente realizado.
[1] Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil
[2] No dia 20/07 o governo apresentou um complemento a essa proposta, com reajuste dos benefícios (auxílios alimentação, saúde, creche). No entanto, ainda muito aquém das demandas dos trabalhadores.
[3] https://ufscaesquerda.com.br/editorial-comando-unificado-de-greve-e-os-prepostos-do-governo/ e https://ufscaesquerda.com.br/a-politica-conservadora-da-direcao-dos-sintufsc-e-os-desafios-a-luta-dos-taes/