Imagem: Edição UFSCàE – Originais: Agecom e UFSCàEsquerda
Caio Sanchez – Redação UFSCàE – 24/09/2021
Essa é a segunda parte de um texto que buscou discutir a importância da Reforma do Centro de Convivências e seu sentido político para o Movimento Estudantil na UFSC. Nessa segunda parte, a centralidade não se dará tanto em torno da pauta, mas sim da forma como vem sendo construída a política no Movimento Estudantil da UFSC e, nesse contexto, a atuação do Diretório Central dos Estudantes (DCE).
Parte II: A importância dos espaços amplos de discussão
A forma como a política tem sido conduzida no movimento estudantil parece demonstrar uma tendência de cada vez maior burocratização. Há poucos espaços de discussão e os Conselhos de Entidade de Base (CEB), que costumavam ser espaços de profundos debates, parecem estar tendo seu sentido político alterado, se tornando apenas um espaço para que o DCE retifique as posições já definidas em outros espaços.
O CEB é superior ao DCE e inferior apenas às Assembleias Estudantis. Ele tem como função ser um mecanismo de gerência acerca da política do DCE e por isso pode ser convocado mediante assinaturas dos próprios CAs. Assim, o conjunto da base pode ter influência na política geral do movimento para além do que é proposto pelo próprio Diretório.
Além disso, o DCE e o CEB são instâncias diferentes e, por isso, é importante que se tenha espaço para que distintas políticas possam aparecer. Se o movimento de base tem discordâncias com a política do DCE, por exemplo, é por meio de CEBs que discussões amplas podem ser feitas.
Contudo, os últimos conselhos têm funcionado de forma extremamente rígida e com pouco espaço para divergências. No CEB ocorrido dia 10/09, por exemplo, a Associação de Pós-Graduandos (APG) foi impedida do direito à voz no espaço porque membros do DCE tinham discordâncias políticas com essa entidade, frente a isso o Diretório alegou que a APG deveria pedir permissão prévia para estar naquele espaço . Após a posição tomada pelo DCE, alguns CAs concordaram com ele e outros apoiaram a APG, o que acabou desviando a discussão sobre o Centro de Convivência para algo pouco relevante para o avanço das pautas.
Ambas as entidades parecem estar interessadas em levar adiante a reforma, mas compreendendo os próximos passos de forma distinta. Conflitos naturais na política. Mas o embate não se deu nesses termos, e sim, nas reiteradas tentativas de o DCE expulsar a APG do espaço, alegando que a entidade não poderia estar presente “influenciando” a política do movimento estudantil.
É certo que a APG não possui o direito de voto na instância do CEB, reservado aos Centros Acadêmicos e ao Grêmio Estudantil do Colégio de Aplicação, mas o quanto o movimento estudantil se beneficia do cerceamento das discussões? Como fechar portas entre pares pode contribuir nas lutas que se tem pela frente? Essa postura enrijecida em relação aos espaços de discussão do movimento estudantil não parece contribuir para que diversas pautas avancem.
Tradicionalmente, no movimento estudantil da UFSC a fala em espaços como o CEB é aberta. Isso porque o espaço tem como objetivo debater questões relativas à universidade, e todas as pessoas interessadas em construir política são bem-vindas. Inclusive, ele auxilia, já que fazer as falas circularem tende a contribuir para que as entidades possam tomar suas posições com mais segurança.
Se o DCE opta por fechar a sessão do CEB, como fica a participação dos diferentes grupos da universidade, sejam entidades ou não? Como fica a articulação do movimento estudantil se, em mais um espaço, a participação ampla é negada? Quando se está entre pares, em busca da defesa da universidade pública em momentos de tantos retrocessos, faz muito mais sentido ampliar os espaços de discussão, e não o contrário.
Posturas como essa demonstram uma política extremamente danosa para a construção de movimentos em conjunto. É provável que esta postura do DCE tenha a ver com o fato de a APG demonstrar uma divergência com a entidade em relação à pauta do Convivência. Entretanto, buscar eliminar as divergências de forma rasteira é uma forma bastante complicada para o movimento político em geral, pois se desviam as tensões para aspectos pequenos como estes, ao invés do debate sobre o que de fato está em jogo em torno da pauta.
Nessa reunião, ao invés de o Diretório se colocar para discutir a importância do Centro de Convivência, que tem sido cada vez mais esquecida – principalmente após quase dois anos em Ensino Remoto -, o DCE priorizou em apenas aprovar a pauta e tornar o assunto tema apenas das reuniões gerais do DCE, que são um espaço de menor adesão da base do que os CEBs. Uma entidade como o DCE poderia cumprir um papel muito diferente do que está cumprindo agora. Poderia estar convocando os estudantes para a pauta, e não fazendo justamente o contrário. Esse tratamento à política tem como efeito fazer o movimento dos estudantes regredir, passando a impressão de que o que importa são as negociatas em reuniões privadas e que na universidade é assim que funcionaria a política. Para quem chega na universidade, a sensação é de que os espaços de discussão comum são extremamente restritos.
Esse foi um exemplo dentre muitos nos últimos anos para elucidar como fechar as discussões não têm favorecido com que a correlação de forças esteja tendendo mais para o lado dos estudantes. Cercear os espaços de discussão ou torná-los uma mera extensão da política do DCE pouco faz avançar a política do movimento estudantil em geral e faz entrar em contradição com os próprios mecanismos existentes no movimento estudantil. As divergências que possam eventualmente surgir nos CEBs podem contribuir para o avanço das lutas em geral, ou da própria entidade.
Além da questão dos CEBs, outro reflexo da degeneração da política do DCE é o fato de que as reuniões gerais da entidade, com chamados públicos, têm acontecido uma vez a cada dois meses. Como uma entidade da magnitude do DCE tem conseguido lidar com a gestão da política se as reuniões ocorrem a cada dois meses? Ou as reuniões públicas apenas referendam as posições já definidas previamente em outros espaços, ou o DCE apenas discute política a cada dois meses. Ambas parecem um equívoco.
Em um momento delicado como o que a universidade vem passando, nos quais os ataques que são feitos há anos por todos os governos da Nova República encontram desde 2019 uma faceta mais autocrática, seria fundamental contar com espaços amplos de discussão. A defesa da universidade pública é, mais do que em momentos anteriores, imprescindível. Reuniões constantes para debater cada passo do capital em direção à universidade – que se dão por meio de propostas empreendedoras, aproximação com fundações e entidades empresariais, adoção de mecanismos para favorecer capitais ligados a tecnologias, a pressão da mídia burguesa, entre outras – seriam fundamentais.
Conforme apontou Morgana Martins em seu texto “A luta pela Universidade não pode ficar em segundo plano”, “temos que avançar, arrancar da universidade que cumpra com o seu papel, reivindicar sua autonomia, reivindicar que o orçamento seja organizado da maneira que a universidade bem entender e não destinado já para áreas específicas, muito menos depender de Emendas Parlamentares para obter dinheiro”. Essas são questões chaves para pensar o horizonte das lutas imediatas na UFSC. O Movimento Estudantil, pelas suas características e dinâmica, tem um papel fundamental em reivindicar os aspectos mais radicais da universidade e as entidades estudantis são instrumentos que devem estar convocando a base para essas lutas.