[Debate] Quando ser representante no CUn é fazer mau uso dessa autoridade: censura, servilismo, subordinação e outras histórias mirabolantes

Allan Kenji Seki para UFSC à Esquerda – 01/11/2017

O último Conselho Universitário foi repleto de polêmicas, convocado por uma parcela de conselheiros que se denotavam descontentes com a continuidade da professora Alacoque Erdmann na reitoria e queriam discutir de “tapetaço” a sucessão. Foram várias as falas motivadas por razões assemelhadas, chegou-se até a cogitar encerrar a reunião e convocar uma nova para a mesma tarde, tendo em vista que uma reunião extraordinária e autoconvocada não poderia incluir na pauta uma questão de surpresa.

Essa fração, disposta a arrancar a professora Alacoque do cargo de Reitora em exercício, poderia ter sido maioria no CUn, faltou maior amplitude das suas demandas, convicção e articulação política em meio à crise geral que se instalou na UFSC. Isto seria terrível para a comunidade universidade. Ventilava-se nos bastidores do CUn a possibilidade de que uma eleição indireta, no próprio Conselho, pudesse compor uma lista tríplice e enviar ao Ministério da Educação ainda no início de novembro. Teríamos a velha política de volta à casa, com eleições indiretas e articulações políticas sendo tocadas no ritmo de interesses mesquinhos bem longe dos olhos dos movimentos, sindicatos e da comunidade. O risco era real porque as intenções eram reais. Foi nesse contexto que se discutiu longamente sobre o fechamento das portas para a comunidade e a privação da liberdade de imprensa.

A estupidez de ambas as medidas é cabal. Afinal, é justamente no momento de maior risco à democracia na universidade que precisamos que as portas dos conselhos e dos gabinetes sejam escancaradas. A presença da comunidade, dos sindicatos, dos movimentos, dos estudantes e da imprensa é desconfortável para muitos. Contudo, nesse desconforto reside uma força fundamental para aqueles que se colocam em um campo crítico. Como muito bem-dito por Álvaro Vieira Pinto, se não somos capazes, neste momento, de impedir que os interesses mais mesquinhos tenham lugar permanente nos gabinetes da universidade, nossa presença tem, pelo menos, a potência de obrigar os poderosos a moralizar minimamente as discussões políticas. Esse é um dos motivos basilares pelos quais o CUn não se transforma em mero balcão de negócios entre as distintas frações dominantes em nossa universidade.

Os conselheiros discursaram largamente sobre seus próprios diagnósticos e do papel da imprensa. Sob o pretexto de que os jornalistas só queriam “fazer sensacionalismo”, decidiram por censurar. Convictos e “bem informados”, os conselheiros, ao sabor de suas vontades momentâneas, fundadas em absolutamente nada, encontraram de mãos dadas as justificativas para a ceifadeira: foram para o mesmo saco da NSC à Agecom, da RIC ao TJ UFSC (jornal produzido por estudantes do curso de jornalismo e acusado por um conselheiro de apenas querer vender sensacionalismo). Infelizmente não é irônico, tornou-se quase natural, chega a passar desapercebido nos dias de hoje que as constatações “sociológicas” no órgão mais importante de uma Universidade Federal sejam baseadas no mais raso senso comum, algo que parece compor a regra geral de uma universidade que combina, cada vez mais, a tecnocracia e o requentado macarthismo, com anticientifiquíssimo e o anti-intelectualismo rasteiros.

Como apontaram, Maria Alice de Carvalho e Morgana Martins, esse ato político, realizado precisamente no momento de crise e risco à democracia universitária, marcado pelos veios do autoritarismo, não foi realizado apenas pelos professores: TAEs e estudantes defenderam politicamente a mesma posição e, em certas ocasiões, com até mais ênfase do que alguns acanhados conservadores docentes – talvez a melhor exceção tenha sido feita pelo estudante de mestrado, Artur Gomes de Souza, marcou a única postura verdadeiramente sóbria daquela reunião, divergindo dos demais colegas indicados pela APG.

O fechamento das portas do CUn, mostra como o conselho conseguiu formar uma maioria disposta a dar de costas para a comunidade. Essa brecha abrirá caminho para riscos maiores agora com o afastamento da profa. Alacoque e novas eleições, o maior deles é a tentativa de o CUn realizar uma eleição no próprio conselho, expondo a universidade ao vexame. Risco que precisamos combater com todas as nossas forças.

Mas uma questão resta ainda por ser totalmente analisada. Em texto publicado no UFSC à Esquerda, Morgana Martins apontou para a necessidade de debatermos profundamente sobre os métodos políticos de escolha dos representantes para os órgãos deliberativos da universidade. Em seu argumento, indicou como é necessário que a posição dos representantes seja facilmente discernível em uma política global da entidade que o indicou, como forma de ampliar o controle democrático sobre essas representações – afinal, deveriam ser representações e não cargos políticos com vida própria. Essa questão volta à baila quando vemos a maioria dos representantes votando com uma maioria da pior espécie, no principal órgão deliberativo de nossa instituição. Como cobrar os representantes quando eles não se apresentam de modo vinculado à política de uma entidade democrática?

Ainda mais grave foi o episódio que envolveu a Agecom, agência de comunicação da UFSC. Os trabalhadores da universidade, jornalistas, também impedidos de adentrar na sala dos conselhos para acompanhar a reunião, noticiaram tal fato através dos instrumentos de comunicação disponíveis. Esses trabalhadores estão, desde então, sendo alvo de inúmeros assédios. Neste sentido, talvez o ato mais emblemático, tenha sido aquele perpetrado justamente por um conselheiro estudantil:

 “Aproveito esse espaço para externar minha preocupação à Reitoria sobre os órgãos de comunicação da UFSC, que devem servir aos interesses da instituição e não de terceiros. Há cerca de uma hora a página oficial da UFSC no facebook publica noticia sobre o CUn fechado e sem imprensa, com comentário altamente parcial, como que deslegitimando o ocorrido. Eu também discordei do fechamento da sessão para a comunidade universitária, mas a questão da imprensa foi claro que nosso entendimento foi o de evitar uma espetacularização, jamais de esconder informações muito menos censurar alguém. Como pode um órgão de comunicação da universidade como esta página manifestar-se contrariamente ao órgão máximo de nossa instituição.  Deve-se sim reportar os fatos mas colocar um juízo político em cima não me parece que seja a função da AGECOM, caso tenha sido ela a responsável. Sugiro que isso seja apurado pela administração central, pois para mim trata-se de mais uma ação de insubordinação que pode querer aumentar a instabilidade de nossa universidade nesse momento. Não sei se estou exagerando, deixo para reflexão de todos. Em anexo print da postagem. Saudações, Henrique Martins, discente.”

Dirigindo-se a todos os conselheiros do CUn e ao gabinete da reitoria, pede, não, exige a SUBORDINAÇÃO dos jornalistas de nossa universidade. A censura, a violência, as pressões políticas pesam dolorosamente sobre esses trabalhadores para fazê-los “servir aos interesses da instituição”. Como se os interesses de uma instituição qualquer não fossem, a cada tempo, os interesses de uma classe que a domina. Triste fim para o movimento estudantil. Marx, com máxima correção, poderia nos emprestar perfeitamente uma sentença dada a outro caso igualmente destruidor, afinal, até “as pessoas mais covardes, as mais incapazes de se contrapor, tornam-se intolerantes assim que podem lançar mão de sua autoridade […] O mau uso dessa autoridade é igualmente uma compensação grosseira para o servilismo e a subordinação aos quais essas pessoas estão submetidas, de bom ou de mau grado, na sociedade burguesa”.

Triste, triste fim.

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