Luiz Costa* – Redação UàE – 24/10/2018
Estamos a menos de cem horas do início da votação do segundo turno para o principal cargo executivo do país. Infelizmente, com a ausência de debates, o resultado das eleições já está condenado de antemão.
Desde sua alta, no dia 29 de setembro, até agora, Bolsonaro gravou programas eleitorais, participou de evento com seus apoiadores, realizou dezenas de transmissões ao vivo nas redes sociais, deu mais de dez entrevistas à imprensa, mas nega-se a participar dos debates marcados para o segundo turno.
Segundo os médicos, a cirurgia que ele passou foi grave, mas do ponto de vista da recuperação médica, atividades como as executadas pelo candidato e uma eventual participação em debates não implicam chance de complicações. Alguns médicos, inclusive, não veem diferença entre o esforço dos atos já praticados pelo presidenciável e a participação nos debates.
Na quinta-feira da semana passada (18), Bolsonaro e o presidente do seu partido (PSL), Gustavo Bebbiano, afirmaram à imprensa que o candidato não participará de nenhum debate no segundo turno. Desde a redemocratização é a primeira vez que não haverá um confronto na televisão entre candidatos à Presidência nesta fase da eleição.
Bolsonaro afirmou que “debate é secundário”. Mas secundário para quem? Para a população, que neste momento crucial de escolha política precisa ver ideias sendo confrontadas? Ou para Bolsonaro, que, no primeiro turno, após cada debate no qual ele comparecia, seus votos reduziam?
Não resta dúvida de que a ausência nos debates é uma opção tática de sua candidatura. Tanto é que para o presidente do PSL, a privação de debates públicos entre os presidenciáveis não gera nenhum prejuízo ao eleitorado. “Não é ruim porque a campanha vem sendo feita”, declarou.
Será mesmo que não é prejudicial? Seria possível igualar o espaço de debate com os espaços unilaterais dos candidatos? Afinal, apenas no debate é possível ver e analisar os possíveis presidentes confrontando propostas, argumentos e posições. Este é o melhor momento para ver as diferenças entre cada um no que tange à saúde, educação, economia, etc. Este é o momento que mentiras não passam tão facilmente. Ao contrário de qualquer outro espaço do processo eleitoral, como comício, entrevista, programa televisivo, etc, este é o único espaço em que os dois aspirantes ao principal cargo do país confrontam-se diretamente.
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Por isso, o debate, no que tange às eleições, está longe de ser algo fútil ou insignificante. Ao contrário, talvez seja o principal espaço para que a população presencie, em rede nacional de transmissão, o confronto de propostas daqueles que querem governar o país por quatro anos.
Porque para que uma escolha seja efetivamente democrática, cada sujeito precisa ter o máximo de elementos possíveis sobre cada candidatura e suas propostas e, para isso, as posições precisam ser confrontadas. Do contrário, a escolha dos eleitores fica refém da esfera individual, da sua bolha virtual, dos algoritmos das redes sociais, das fake news, da corrupção de campanha, das mentiras.
Democracia está longe de ser mero direito ao voto. Pois, do contrário, este poderia estar completamente condenado à desinformação e à mentira. É preciso ir além, é preciso que o povo tenha ciência do que está em jogo com a maior clareza possível. Para isso, o debate é fundamental para as decisões democráticas.
A democracia burguesa, em sua forma representativa, é completamente defeituosa. Pois afasta o eleitorado das escolhas e decisões reais, que são tomadas, na verdade, pelos ditos representantes do povo. Todavia, é notório, em especial, no Brasil, a incongruência entre as decisões das classes políticas, como no Congresso Nacional, e a vontade da maior parte da população. Caberia outro texto de debate apenas para explorar as facetas podres da democracia representativa, como, por exemplo, o fato de que, no fundo, grande parte dos candidatos ao executivo ou legislativo, são eleitos, não pelo resultado da reflexão profunda de cada eleitor sobre suas propostas, mas pelo número de investimentos, de relações com as mídias, com as igrejas, etc, por trás de cada candidatura.
O mínimo que espera-se, então, desta democracia capenga, é que apresente as propostas, de forma clara, através dos debates. Se já somos alienados nas principais decisões no que tange a vida pública, que, ao menos, seja exposto claramente o programa político de cada um que almeja nos representar doravante. Não resta dúvida de que, para isso, é preciso que haja debates.
Portanto, definitivamente o debate não é secundário ao povo. Mas é óbvio que não é prioritário à candidatura de Bolsonaro, ao contrário, o debate é rejeitado pelo mesmo e com razão! Pois é no debate que melhor mostrou-se o completo despreparo de Bolsonaro. Sem conseguir apresentar o mínimo de conhecido sobre as principais questões sociais e como resolvê-las, Bolsonaro apelava para a suposta ditadura gayzista e comunista em ascensão ou coisa parecida. Mas não só isso. Era expressiva sua burrice ao falar de qualquer tema, com falas absurdas e que não apresentavam um programa de governo sólido.
Se para fazer um debate com oito candidatos, com poucas falas de cada um, Bolsonaro precisava escrever na mão, imagina o que aconteceria com ele sozinho num debate contra Haddad. Por isso, sua estratégia é se abster deste confronto e reduzir sua candidatura à falatório unilateral, no conforto de sua casa, via transmissão online nas redes sociais. Para não mencionar o financiamento indevido de sua campanha por setores privados, como revelado há alguns dias. Ou para não entrar nas minúcias dos danos prejudiciais das fake news que sustentam sua candidatura, inclusive, promovida pelo próprio candidato e seu partido, como a suposta irregularidade nas urnas.
Sua estratégia é manter-se no terreno seguro de votos, nos meios virtuais e por meio de mentiras. Sua candidatura está se criando e consolidando com a ausência dos debates e da apresentação clara das propostas. Seu plano tem sido desviar da necessidade de fazer algo crucial para nossa frágil democracia: posicionar-se nitidamente sobre as principais questões sociais. Em outras palavras, a estratégia de Bolsonaro tem sido fazer o povo de idiota!
*O texto é de inteira responsabilidade da autora e pode não refletir a opinião do Jornal.
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