Foto: Henrique Almeida/Agecom/UFSC

[Notícia] Justiça rejeita denúncia do MPF de “ofensa a honra funcional” contra o reitor e chefe de gabinete da UFSC

Foto: Henrique Almeida/Agecom/UFSC

Maria Alice de Carvalho – Redação UàE – 30/08/2018

Nesta quinta-feira (30), a juíza Simone Barbisan Fortes, da 1ª Vara Federal de Florianópolis, rejeitou a denúcia feita pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o atual reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Ubaldo Cesar Balthazar, e o chefe de gabinete da reitoria, Áureo Mafra de Moraes. Os dois estavam sendo acusados de “ofender a honra funcional” da delegada Erika Mialik Marena.

A responsável por analisar a denúncia feita pelo MPF seria a juíza Janaína Cassol Machado, da 1ª Vara Criminal Federal de Santa Catarina, a qual foi responsável também pela Operação Ouvidos Moucos. Esta operação, na época, levou à prisão do ex-reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo e de outros cinco professores da UFSC e um funcionário da FAPEU por determinação da juíza Janaína Cassol, à pedido da delegada Erika Marena. Porém, como Janaína Cassol se encontra em férias, a juíza Simone Fortes se responsabilizou por julgar a denúncia.

Ubaldo Balthazar e Áureo de Moraes estavam sendo incriminados pelo fato de que policiais federais encontraram indícios de calúnia e difamação em uma reportagem realizada pela TV UFSC, no dia 18 de dezembro de 2017, em uma cerimônia para comemoração do 57º aniversário da UFSC, na qual o ex-reitor Cancellier foi homenageado com a inauguração de um retrato seu na sala dos reitores.

De acordo com os policiais, os dois acadêmicos teriam atentado contra a honra da delegada Erika Marena. O material utilizado pelos policiais para justificar tal criminalização foi o fato de que quando entrevistados, era possível encontrar atrás do reitor e do chefe de gabinete faixas em protesto contra o abuso de poder de autoridades na operação Ouvidos Moucos.

O cartaz esticado por manifestantes estampava as fotos de Erika Marena, da juíza Janaína Cassol Machado e do procurador André Bertuol; e trazia escrito “Agentes públicos que praticaram abuso de poder contra a UFSC e que levou ao suicídio do reitor”. Além de outros cartazes nos quais se encontravam escritos “Não ao abuso de poder” e “Universidade rima com verdade e liberdade. Quem matou o reitor?”

O responsável pela denúncia, Procurador da República Marco Aurélio Dutra Aydos, considerou que a faixa estendida no evento “inequivocamente ofende a honra funcional subjetiva da representante (Erika Marena), dando causa injustamente a diminuição do sentimento pessoal de autoestima, eis que publicamente caracterizada pela qualidade negativa de ‘agente público que pratica abuso de poder’ e necessita de ‘punição’ para ‘reparação dos [seus] malfeitos’”.

De acordo com a acusação, o chefe de gabinete, Áureo de Moraes, foi denunciado pois  “consentiu em deixar-se fotografar/filmar em frente à faixa injuriosa, como cenário de sua manifestação naquele evento, conferindo, consciente e dolosamente, caráter oficial à injúria ali perpetrada”. E o reitor, Ubaldo Balthazar, pois “competia ao acusado, na condição de autoridade de primeira hierarquia da administração universitária presente na solenidade, exercitar regularmente o poder de polícia administrativo que coibisse o malferimento à honra funcional dos servidores públicos retratados na faixa”.

Com a denúncia por injúria contra funcionário público, os dois acadêmicos poderiam levar uma pena que varia de 40 dias a oito meses de detenção. E, ainda, o procurador, Marco Aurélio Dutra Aydos, requereu o pagamento de uma multa de R$ 15 mil como reparação por danos civis.

Diante de tal denúncia realizada pelo MPF, a UFSC lançou, no dia 27 de agosto, uma nota se manifestando acerca da situação:

NOTA OFICIAL

A Universidade Federal de Santa Catarina, por meio de sua Administração Central, reunida em Colegiado, vem expressar à comunidade brasileira sua profunda preocupação com as medidas tomadas pelo Ministério Público Federal em Santa Catarina, ao denunciar o Reitor, Professor Ubaldo Cesar Balthazar, e seu Chefe de Gabinete, Professor Áureo Mafra de Moraes, por crime de injúria contra servidora pública federal, visto não terem ambos proibido manifestação pacífica de membros da comunidade universitária durante solenidade de comemoração de aniversário da instituição e homenagem ao Reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo, em dezembro passado. A UFSC, como universidade plúrima e democrática, jamais cerceará a livre exposição de pensamento e a liberdade de expressão política, princípios garantidos na Constituição Federal, em seu artigo 5º. Como direitos fundamentais, decorrentes do princípio fundante da dignidade da pessoa humana, necessários à própria subsistência do Estado Democrático de Direito, estão acima de quaisquer outras considerações, constitucionais ou legais. Não cabe ao Reitor, ou ao seu Chefe de Gabinete, proibir a exposição de cartazes ou faixas que representem oposição ao pensamento deles ou quaisquer outros. Somente em um ambiente de livre discussão é possível avançar no processo democrático e na produção do conhecimento. Em pleno ano de 2018 é inconcebível que se promova a defesa da censura e da restrição aos direitos fundamentais à livre expressão e à reflexão crítica. Aliás, fortalezas de uma universidade. As questões agora em evidência não afetam somente os cidadãos. Mas implicam em ameaçar a retirada daquilo que, para as universidades em particular e a sociedade democrática em geral, é tão precioso: nossa vocação à crítica, ao exercício da cidadania e à construção do plural, contraditório e divergente. A denúncia fere fortemente a autonomia universitária, outro importante princípio constitucional, caracterizando-se como um típico gesto que visa diminuir a importância da UFSC como uma das principais universidades do país, centro de excelência no ensino, na pesquisa e na extensão. Florianópolis, 27 de agosto de 2018.

O Conselho Universitário, órgãos superior deliberativo da UFSC, após reunião nesta terça-feira (28), também lançou nota à comunidade se manifestando e se posicionando com relação aos trágicos acontecimentos do último ano.

Para além, a secretaria regional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) se manifestou com relação ao ocorrido e em nota manifestou “perplexidade, preocupação e repúdio” à denúncia contra o reitor e o chefe de gabinete da reitoria. A SBPC apontou, também, para o fato de que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal “vêm sistematicamente divulgando na grande mídia nomes e imagens de professores, pesquisadores e instituições de ensino superior do país, ferindo assim gravemente suas reputações, sob acusações das mais diversas, sem qualquer preocupação com as consequências devastadoras desta incompreensível campanha midiática”.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) se manifestou, nesta segunda-feira (27), classificando a denúncia do MPF como despropositada e que percebe um grave risco ao ambiente democrático em sua fundamentação. O presidente da OAB-SC, Paulo Brincas, liderou uma comitiva com 30 advogados e representantes do curso de direito da UFSC que esteve em visita ao gabinete do reitor nesta segunda-feira (27) para prestar apoio e solidariedade.

De acordo com Paulo Brincas, “A relevância do tema é de interesse de todo o brasileiro: tolher a liberdade de expressão e de manifestação constitui-se em grave risco à democracia, assim como o episódio envolvendo o reitor Luiz Carlos Cancellier representou ameaça ao direito constitucional do contraditório e da ampla defesa, com uma prisão provisória de exploração midiática, que resultou em tragédia imensurável e irreparável”.

A juíza Simone Barbisan Fortes rejeitou, então, nesta quinta-feira (30), a acusação contra Ubaldo Balthazar e Áureo de Moraes por considerar que “ a manifestação indicada na denúncia estaria dentro do exercício da liberdade de expressão, expondo sentimentos de revolta em um momento traumático para a comunidade universitária, sem que tenha havido ofensa à honra da delegada”.

Nesta sexta-feira (31), o reitor Ubaldo Balthazar se reunirá com os cinco professores que se encontram desde setembro de 2017 impedidos de entrar na UFSC em decorrência da Operação Ouvidos Moucos. O encontro tem como objetivo “demonstrar a preocupação com o afastamento de quase um ano imposto aos professores, além de manifestar o apoio do reitor aos colegas, e comunicar a abertura dos devidos procedimentos no âmbito administrativo, a fim de apurar devidamente as denúncias que deram origem à investigação”.

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