Imagem de divulgação do seminário

[Notícia] Seminário debate aulas remotas na pós-graduação da UFSC

Beatriz Costa – Redação UàE – 16/09/2022

Na manhã de ontem, 15 de setembro, ocorreu o seminário “Disciplinas com presença remota na pós-graduação da UFSC”. O evento foi organizado pela Pró-reitoria de pós-graduação da UFSC (PROPG), a partir de uma solicitação realizada pela Associação de Pós-graduandos da UFSC (APG).

O seminário contou com a participação de docentes e discentes de diferentes áreas do conhecimento, apesar de ter sido divulgado somente muito próximo da sua realização (o convite foi enviado aos programas um dia antes da realização do evento).

Foram convidados quatro professores para participarem da mesa. Soraya Franzoni Conde, do Programa de Pós-Graduação em Educação; Patricia Della Méa Plentz, do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação; Renê Birochi, do Programa de Pós-Graduação em Administração; e Rafael de Camargo Catapan, do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciências Mecânicas do campus de Joinville, que participou remotamente. O Pró-reitor de Pós-graduação professor Werner Kraus mediou do debate. 

A APG também foi convidada a fazer uma fala inicial, após a fala inicial do pró-reitor, que explicou o teor da proposta de normativa. A representante discente Luisa Estácio, que pediu vistas do processo na CPG, fez a fala em nome da APG ressaltando alguns dos pontos que são imprescindíveis para o debate, do ponto de vista da entidade, como a relação desta política com os cortes de verbas e falta de bolsas. Por fim, também solicitou o comprometimento da gestão para que a normativa passe pelo Conselho Universitário (CUn).

Durante os debates, algumas falas favoráveis às aulas remotas ressaltaram experiências pessoais com o ensino remoto que foram consideradas positivas e procuraram alegar uma inevitabilidade do ensino remoto, como se não houvesse opção de não implantá-lo, somente de variar a forma de fazer isso. Também houve apelos no sentido de que a possibilidade de realizar a pós-graduação a maior parte do tempo à distancia poderia trazer mais candidatos para alguns programas que estão ficando com vagas ociosas. 

As aulas remotas foram apresentadas inclusive como uma solução paliativa, enquanto não temos bolsas e recursos, demonstrando como o debate neste momento está totalmente atrelado a situação enfrentada pelas universidades. Dentre as falas que defenderam as aulas remotas, nenhuma alegou que essa modalidade seria melhor que o ensino presencial em algum sentido, o máximo que aconteceu foi uma fala de um professor de que não há diferença entre a aula presencial e a remota, que o meio não faz diferença. 

Nas falas contrariarias às aulas remotas diversos apontamentos e questionamentos foram levantados, como a falta de convivência e trocas entre os estudantes e o professor e dos pós-graduandos entre si, a perda de qualidade nas aulas e no engajamento dos estudantes que normalmente as aulas remotas acarretam, a falta de estrutura física adequada para aulas híbridas na universidade e a saúde mental dos estudantes de pós-graduação.

Ainda, a principal questão que foi levantada entre as falas no seminário é a relação desta proposta com um determinado projeto de universidade alinhado com valores privatistas para a educação. A relação do ensino remoto com o teletrabalho dos TAEs, a reconfiguração da carreira docente e iniciativas do governo federal como o REUNI digital foram levantadas e problematizadas. 

Ao final, foi solicitado pela APG que a normativa fosse tirada de pauta e que houvesse mais espaços de discussão sobre o tema, que está longe de ser esgotado. O pró-reitor Werner Kraus afirmou que irá avaliar a melhor forma de prosseguir com esse debate, do ponto de vista institucional.

O espaço foi o primeiro no qual foi possível um diálogo aberto à comunidade universitária, no qual todos tiveram a oportunidade de expressar suas opiniões. Porém, não terá muita relevância se o que foi discutido não for levado em consideração na continuidade da tramitação da normativa. O envolvimento da comunidade universitária é fundamental para que os rumos dessa questão sejam os melhores possíveis para a UFSC e seus professores, estudantes e TAEs.

 

Confira a manifestação inicial da APG no espaço na íntegra:

 

“Bom dia a todas e todos que estão presentes aqui hoje, professoras e professores, estudantes, técnicos e demais membros da comunidade. 

Gostaríamos de agradecer o espaço promovido por parte dessa Reitoria, que concedeu o debate público e aberto após o pedido feito pela Associação de Pós-graduandas e graduandos pela ampliação do debate sobre este tema. 

A  Resolução Normativa que abre a implementação permanente das disciplinas remotas na pós-graduação foi feita inicialmente na gestão passada do Professor Ubaldo Balthazar e colocada em pauta pela ex Pró-reitora da Pós-graduação Cristiane Derani na Câmara de Pós-Graduação (CPG). Desde o início nos inquietamos com o fato de o debate estar avançando rapidamente e em paralelo ao cotidiano da universidade, e de não estar sendo formulado com toda a comunidade, sem sua presença contundente para fazer elaborações sobre a proposta e sem a reflexão das implicações a longo prazo intrínsecas a nova Resolução. 

Discutimos hoje sobre a regulamentação e permanência de aulas remotas na pós-graduação depois da experiência com o ensino remoto emergencial. Quando pudemos retornar com segurança para o território universitário, após a vacinação e protocolos sanitários estabelecidos, encontramos a precarização mais aprofundada dentro da universidade pública, por conta dos cortes em seu orçamento, que ocorrem há mais de uma década na instituição, fazendo com que as contas estejam  cada vez mais direcionadas por sua manutenção, impossibilitando muitos investimentos em sua estrutura. 

Durante o período de isolamento social, constatamos que o ensino remoto emergencial não resolveu nenhum dos problemas que temos hoje com a estrutura universitária. Mas, por conta da distância, não tivemos contato direto com a gravidade que enfrentamos hoje em meio a inúmeros problemas que vão desde a estrutura física, com prédios que possuem salas e laboratórios precários; a dificuldade de contratação de pessoal, de servidores e docentes; a dificuldade de acessibilidade para que toda a comunidade acadêmica possa circular no espaço, como é o caso da comunidade surda por exemplo. 

No que tange a pós-graduação especificamente, estamos em meio a um momento de escassez de bolsas e vivemos em uma das cidades com o custo de cesta básica mais cara do país, com aluguéis caros ao redor do Campus universitário, fazendo com que muitos precisem se deslocar longas horas por dia para chegar até suas aulas e trabalho.  Ter uma bolsa para realizar a pesquisa é o que define muitas vezes a permanência dentro da pós-graduação. E por isso, muitos sequer conseguem estar presentes na universidade hoje. 

Com esse cenário em mente, não podemos perder de vista algo elementar em relação ao momento em que vivemos: qual é o projeto de universidade que queremos e a quem interessa verdadeiramente essa modalidade híbrida dentro da universidade pública? 

Não podemos ignorar que a iniciativa existe dentro de um processo histórico. Há anos é aclamada por porta-vozes do projeto do Ensino a Distância – em qualquer uma de suas modalidades, seja ela chamada de Ensino Híbrido ou Ensino Remoto. Estes não estão interessados apenas em utilizar certos recursos tecnológicos na universidade, mas sim, de transformar o caráter do ensino universitário. Não por acaso temos conhecimento de que as modalidades remotas são adotadas por diversas universidades privadas do país e, também não por acaso esta política é defendida por pessoas conectadas a grandes oligopólios empresariais da educação, aqueles que estimulam há anos a inserção e substituição do espaço físico pelo meio digital.

Há diversas pesquisas produzidas nas universidades públicas, inclusive nesta, que apontam para a ligação intrínseca entre esta política e os interesses das classes dominantes. 

Essa transformação em curso da hibridização das universidades públicas não diz respeito somente aos discentes, mas impacta em uma transformação do papel do professor em mero mediador entre o aluno e o acesso à tecnologia. A introdução desse modelo educativo gerou demissão em massa de professores em instituições privadas, que foram substituídos por essas tecnologias e a figura do tutor, como a responsável de auxiliar estudantes com as plataformas digitais. 

Em seu estado mais avançado, a substituição do ensino presencial pela tecnologia aparece com a introdução das aulas pré-gravadas, softwares de correção de avaliação, plataformas digitais para o controle do conteúdo que deveria ser repassado em sala, entre outros. Na prática, o professor passa a ter um papel secundário, de orientador, cada vez menos intelectual ou criativo. 

Para criar um consenso de necessidade do ensino remoto, é comum escutarmos alegações de que aqueles que resistem a este modelo são contra a “modernização” do ensino, apresentando o ensino presencial como algo “arcaico”, no qual o aluno é muitas vezes passivo e o professor um transmissor de conteúdo e o ensino remoto com maior potencialidade de flexibilidade, participação e interação.  

Mas do nosso ponto de vista, não há um prejuízo inerente ao uso de tecnologias nos processos tecnológicos. A nossa crítica se apresenta diante do que está colocado: dois modelos de ensino completamente diferentes. No qual um se utiliza das tecnologias para transformar importantes características do ensino universitário.

Compreendemos que a universidade possui um compromisso social com a formação de pesquisadores e que esta deve ser promovida de forma integral, com uma educação completa que inclui possibilidades educativas e culturais. A qualidade do que é produzido dentro da universidade também está diretamente conectada com a possibilidade de uma dedicação exclusiva para a pós, que proporcione uma inserção do estudante no meio universitário para frequentar seus espaços de estudos, de lazer, de pesquisa.

Diante de opiniões e projetos dominantes para mudar a realidade da instituição pública, ressaltamos que a universidade é, até hoje, uma das poucas instâncias em nosso país que possui a autonomia necessária para formular seus processos e pensar de forma crítica sobre eles, apesar de portarias e regimentos externos. 

Gostaríamos, por fim, de pedir um comprometimento da atual gestão, que em diversos momentos da campanha eleitoral criticou a fragmentação das decisões nos diferentes espaços universitários. Por se tratar de uma política que altera permanentemente as características da pós-graduação, gostaríamos que a discussão e deliberação desta normativa se desse na instância máxima de deliberação dessa instituição: o Conselho Universitário. Acreditamos ser de interesse de toda a comunidade discutir este processo e que ele seja conduzido de forma transparente e democrática.

Desejamos um bom debate a todas e todos. “

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