Imagem: Divulgação da carta.
Luiz Costa – Redação UàE – 28/08/2019
Uma Frente de servidores do Colégio de Aplicação contra o Future-se se formou e publicou uma carta aberta à comunidade escolar do colégio. Publicado na terça-feira da semana passada (20), os servidores buscam analisar o projeto do MEC e suas implicações no funcionamento da Universidade Pública, bem como no Colégio de Aplicação.
Leia a carta na íntegra:
CARTA À COMUNIDADE ESCOLAR DO COLÉGIO DE APLICAÇÃO SOBRE O FUTURE-SE
Neste ano de 2019, o Colégio de Aplicação da UFSC foi habitado por muitas turbulências: as decisões do governo federal se refletiram diretamente em nossos corredores.Os cortes de verbas para as universidades públicas, anunciados pelo Ministério da Educação já no primeiro semestre, deixaram incerta a continuidade das atividades acadêmicas – e portanto, também, as de nossa escola. Nosso reitor não hesita em afirmar que o repasse do orçamento, como está planejado hoje, não suprirá as demandas a partir do mês de setembro. Medidas de readequação, sentidas inicialmente na redução do efetivo de trabalhadores terceirizados da limpeza e segurança e na diminuição do cardápio do restaurante universitário, prenunciam o risco alertado nas mídias de que o calendário letivo deste ano pode estar suspenso antes do tempo adequado para o encerramento de nossas atividades. A incerteza, o jogo de comunicados oficiais e extra-oficiais e a falta de transparência de nosso atual governo são sentidas inclusive nas falas angustiadas de nossos estudantes, que temem por fechamento de sua escola.
É contra este cenário da interrupção e do silenciamento que nós, servidores públicos do Colégio de Aplicação, nos unimos às paralisações dos dias 15/05, 30/05, 14/06 e 13/08,em defesa da universidade pública, pela manutenção de seu financiamento estatal e contra a reforma da previdência (utilizada como moeda de troca nas negociações parlamentares).
O projeto de destruição do ensino básico e superior público federal, da pesquisa científica e da autonomia acadêmica, em operação pelo governo federal se manifesta agora através do programa “Future-se”, anunciado em julho. Apesar de estar em elaboração e precisar ser avaliado pelo congresso nacional, já é anunciado na grande mídia como a alternativa necessária ao buraco financeiro em que nossas universidades foram lançadas nos últimos anos. Dentre as proposições do programa “Future-se”, gostaríamos de destacar duas,discutidas na reunião do dia 12/08 realizada na escola, com o suporte de pesquisadores que estudam os impactos das reformas administrativas aplicadas às universidades federais. Estas proposições permitem antever os objetivos principais do programa:
1. Desvincular o orçamento das unidades federais de ensino da responsabilidade estatal,oferecendo uma falsa “autonomia” às universidades, ao impor a necessidade de filiação à fontes privadas de investimento. Essa “autonomia” para pedir socorro à iniciativa privada se complementa com a consolidação de um fundo de investimento nacional, composto – majoritariamente – pelo patrimônio da união.
2. Desarticular a gestão das unidades federais de ensino, que hoje têm garantida constitucionalmente sua independência administrativa, ao possibilitar a partilha de gestão com Organizações Sociais, que terão livres atribuições na contratação e na avaliação dos servidores e na tomada de decisões. Para tanto, serão necessárias alterações nas regras do sistema de contratação estatutário da união.
Colocando nosso patrimônio, nossa ciência e nosso ensino básico e superior público federal à disposição do interesse de grandes corporações e do mercado financeiro, o programa “Future-se” não pode ser entendido como uma reforma necessária e urgente. É um ataque frontal ao sentido mais valoroso das universidades públicas em nosso país: seu compromisso social, sua liberdade e autonomia. Representa o encerramento da universidade como nós a conhecemos hoje.
O discurso veiculado pelo programa, centrado em uma exaltação ao empreendedorismo e à inovação, fala pouco sobre o ensino e a extensão realizados em nossas instituições federais – não há propostas claras, sequer uma análise acerca do impacto da implementação do programa nas atividades pedagógicas. Ainda mais obscuras são a simplicações para o ensino básico realizado nessas instituições e sobre elas podemos apenas lançar nossas suposições e questionamentos: O efetivo docente dos Colégios de Aplicação também será contratado como celetista através das Organizações Sociais? Estes órgãos externos avaliarão, também, o trabalho destes profissionais? Esta avaliação se aplica à gestão escolar? Como a associação com instituições particulares se infiltra no cotidiano escolar e de que maneira isso afeta a qualidade do trabalho pedagógico? Qual o impacto no financiamento dos materiais de apoio, da merenda, dos produtos de mantenimento essenciais da escola?Qual o impacto ao oferecimento de bolsas e outros suportes materiais para o programa de acessibilidade e educação inclusiva realizado pela escola?
As perguntas são muitas e as previsões que podemos fazer apontam para uma precarização violenta da realidade escolar. Não temos dúvida: a aposta do governo federal em mercantilizar nossa educação é um projeto de destruição de nossos direitos sociais. É em oposição a este projeto nocivo que nós, servidores do Colégio de Aplicação da UFSC,decidimos por nos posicionar publicamente e realizar o convite a toda comunidade para estarao lado de nossa instituição e em sua defesa.
O momento é grave e urgente; exige de nós posicionamento e ação.
Dizemos não ao “Future-se” e não aos cortes de verba para a universidade pública.
Em defesa de uma educação pública que sonha os sonhos da liberdade, da justiça social e da democracia.
20 de agosto de 2019,
Frente de servidores do Colégio de Aplicação contra o Future-se.