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[Opinião] Das marquises ao gabinete do prefeito: A questão da população em situação de rua em Florianópolis.

Foto: Reprodução/Página de Facebook Mnpr/sc – Movimento Nacional População Rua – Santa Catarina 

Por Maria Alice de Carvalho – UàE – 04/10/2017

Na manhã de sexta-feira (30/09) a cidade de Florianópolis amanheceu com mais uma demonstração da política higienista que a prefeitura municipal possui com a população em situação de rua da capital catarinense. Um tapume foi colocado em frente à sede do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) – irônico, não? – , local o qual vinha a ser ocupado pelos moradores de rua há alguns meses, já que as marquises do centro da cidade são uns dos únicos lugares de abrigo que esses sujeitos conseguem encontrar.

A política higienista efetuada pela prefeitura da cidade de Florianópolis não é nova em cena, na verdade, é uma herança que vem sendo levada como tradição pelas consecutivas gestões da cidade; ela apenas está mais evidente agora na gestão de Gean Loureiro (PMDB).

Desde o início de seu mandato em 01 de janeiro de 2017, a gestão Gean Loureiro não se poupou em deixar claro o embate que travaria com a população em situação de rua de Florianópolis. Já nos primeiros meses, principalmente a partir do mês de maio, ataques aos direitos dessa população puderam ser observados; um exemplo disto é o Floripa Social. Lançado em 17 de maio pela prefeitura em parceria com secretarias municipais, Ministério Público de Santa Catarina, Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) e ainda outros órgão afins, o programa Floripa Social surge com o lema de “devolução de dignidade aos moradores de rua”, porém, quando analisado o projeto e a forma como ele foi construído, é perceptível que as últimas pessoas a se beneficiarem com este são as pessoas em situação de rua.

Um projeto que possui como uma de suas principais propostas a promessa da reativação do NAF ( Núcleo de Apoio à Família) na rodoviária, enviando de volta para suas cidades sujeitos que ocupariam as marquises da capital; que busca realizar um levantamento dos moradores de rua, no sentido de delinear os motivos pelos quais estes estão nas ruas e decidir encaminhá-los da melhor forma possível – melhor forma para quem? -; um projeto que em sua formulação não parte de um diálogo com os sujeitos alvos dessa política para uma construção com eles e não para eles; na verdade, quais são os sujeitos envolvidos na construção do projeto já diz muito sobre o caráter deste, não é senão ingenuidade acreditar que um projeto voltado para a população de rua construído em parte por Dirigentes Lojistas possa beneficiar a população que dorme pelas calçadas do centro da cidade, tendo em vista que o que conta como ideal para estes comerciantes é o esvaziamento das marquises pelos papelões e cobertores, visando o embelezamento de suas vitrines e assim maior lucratividade do capital.

Para além das políticas higienistas travestidas de políticas de cunho social, o projeto Floripa Social buscou, ainda, se camuflar como uma política interessada com a garantia dos direitos previstos em lei à população em situação de rua através do objetivo de prever a revitalização e ampliação do Centro de Referência Especializado para a População em Situação de Rua (Centro Pop) – instituído no decreto 7053 – nos finais de semana; porém, o que se observou no mês de agosto foi a tentativa da prefeitura municipal em fechar o espaço, sem diálogo algum com os usuários do serviço ou com o corpo técnico de servidores, justificando o ato com a necessidade de readequação do local e que, enquanto isso, transferiria os serviços prestados à responsabilidade de voluntariados. O ato conseguiu ser evitado pela ocupação do gabinete do prefeito em 23 de agosto, realizada pelo Movimento Nacional de Pessoas em Situação de Rua de Florianópolis (MNPR-SC), porém, a presença de voluntários de cunho religioso dentro do serviço não pode ser evitada, gerando hoje uma maior restrição ao uso do dispositivo por usuários – uso este o qual já era extremamente dificultado antes, com a presença da Guarda Municipal atuando violentamente no espaço e horários rigorosos de entrada e saída.

Atualmente, com a presença do voluntariado, o uso do serviço tem sido condicionado pelo doutrinamento dos sujeitos que necessitam do serviço e que o tem por direito; além de o banho estar sendo permitido apenas a quem possua documento de identidade.

A questão da população em situação de rua em Florianópolis, a qual acorda vezes com jatos d’água no Coreto da Praça XV e vezes com sprays de pimenta no rosto nos bancos da cidade, é tratada de forma a ser criminalizada pelo município, tendo como principais agentes de intervenção a Polícia Militar, a Guarda Municipal e a Comcap para retirada de seus bens.

O tapume colocado em frente à sede do INSS, além de espantoso, é senão uma representação de como se encontram as portas do Serviço Público às pessoas em situação de rua: fechadas e cercadas por violência.

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