Montagem por UFSC à Esquerda com base em foto de Henrique Almeida/Agecom/UFSC e foto própria.

[Opinião] Eleições do DCE: um projeto político para a entidade está em segundo plano

Nina Matos e Clarice Alves* – Redação UFSC à Esquerda – 12/07/2022

As eleições do Diretório Central dos Estudantes (DCE) Luís Travassos se aproximam e, até o momento, foi realizado o primeiro debate entre as chapas que concorrem ao pleito, na UFSC. Nós do Jornal UFSC à Esquerda estivemos presentes e visamos, com esse texto, contribuir com o processo eleitoral apontando nossa análise a partir do que surgiu no período de campanha eleitoral, em especial no debate do dia 08 de julho. 

É possível falar em “acúmulo” de debates até o momento?

Concorrem ao  processo eleitoral as chapas:

Chapa 1 – “Para Virar o Jogo”, composta por militantes da Juventude Revolução (JR, do PT). A chapa que defende Lula presidente em uma das postagens que tem no Instagram e chama atenção a presença escassa tanto nas redes sociais (com apenas duas postagens), como no cotidiano da universidade, sendo pouco vista nas passagens em sala, nos cartazes ou mesmo nas conversas entre estudantes.

Chapa 2 – “Pra Mudar o DCE”, que conta com a participação de militantes da União da Juventude Socialista (UJS), do PCdoB. A chapa tem feito distribuições de panfletos durante a fila do RU e colado cartazes que divulgam as propostas da chapa. É composta também pela presidente da União Catarinense dos Estudantes (UCE), que neste primeiro debate, em diversos momentos, levantou a ausência de diálogo entre a última gestão da entidade e a UCE.

Chapa 3 –  “É Tudo Pra Ontem, composta por militantes do Movimento Correnteza (vinculado à Unidade Popular), Coletivo Juntos (vinculado ao PSOL) e Movimento de Mulheres Olga Benário (também vinculado à Unidade Popular). A chapa tem realizado passagens em sala, distribuição de panfletos nas filas do RU e nas turmas, cafés para conversar com os estudantes, e postagens nas redes sociais.

Chapa 4 – “Só a Luta Muda a Vida” – composta por militantes organizados em diferentes partidos: Coletivo Alicerce, Juventude Manifesta, Juventude Comunista Avançando(JCA), Afronte,  Brigadas e a União da Juventude Comunista (UJC). Essas organizações compunham a gestão anterior do DCE e propõe uma unidade de esquerda em prol do Fora Bolsonaro e contra o fascismo. Têm realizado cafés com os estudantes, passagens em sala e panfletagens nas filas do RU. 

No debate, estiveram presentes membros das chapas 2, 3 e 4, e a chapa 1 participou através do Google Meet, sendo interrompida em uma das falas após a bateria do computador da Comissão Eleitoral (CE) acabar.

Este primeiro debate foi apresentado pela CE como voltado aos demais campi da universidade, que não o campus central, localizado na Trindade, em Florianópolis. A maioria dos presentes no auditório estavam compondo as chapas ou já definiam apoio em alguma medida.

Divergências abstratas entre as diferentes forças políticas que pretendem atuar no DCE: o que está em disputa? 

O debate contou com três blocos, sendo o primeiro de apresentação, o segundo de perguntas entre as chapas e o último de perguntas da plateia, priorizando quem estava acompanhando a transmissão online realizada pela CE.

Partindo das discussões acerca da realidade dos estudantes dos demais campi, as chapas direcionam suas falas para as dificuldades enfrentadas pelos estudantes nos campi com relação à mobilidade e integração com o campus central e com a entidade. Foram feitas perguntas sobre a presença das chapas nos campi e participação destes estudantes nas elaborações dos programas das chapas e sobre a mobilidade urbana entre os centros de ensino e outros espaços físicos dos campi.

Entretanto, além da listagem das dificuldades que atravessam outros campi, o foco principal que foi dado ao debate foram questionamentos sobre a atuação das organizações no movimento estudantil em relação à última gestão do DCE. 

É nítido que há disputas e divergências, como por exemplo quando a chapa 2 entende que é necessário ter representantes do DCE em outros campi, e a chapa 4 fala que mais do que controlar e ter representantes da entidade, é importante que os campi elaborem quais são as demandas. 

A partir desses elementos, ficamos com a ideia de que as chapas estão disputando para ver qual partido tem mais poder no movimento estudantil da UFSC, do que  apresentando distintos projetos políticos para a universidade para serem construídos pelos estudantes, mesmo que independentes. Falta às chapas apresentarem uma análise de conjuntura robusta e consistente que permita que os estudantes terem dimensão das lutas que são necessárias e o cenário que estamos enfrentando. 

As eleições de 2018 e os critérios para a formação de uma unidade de esquerda: por que hoje vemos essa divisão nas forças que antes atuavam juntas?

Em 2018, além da chapa eleita, Canto Maior (Chapa 2), havia uma chapa (Chapa 1) que era composta por militantes do PT e da UJS e outra chapa integrada por militantes de partidos de direita e movimentos conservadores presentes na UFSC — a Chapa Zero. Com a análise de que era necessário unir forças para impedir a Zero de ser eleita, a Chapa 1 abriu mão da disputa e passou a convocar sua base a votar na Chapa 2 – Canto Maior.

Portanto, compôs a antiga gestão do DCE militantes de muitos partidos de esquerda atuantes na UFSC: Coletivo Alicerce, Juventude Manifesta, Juventude Comunista Avançando (JCA, do Polo Comunista Luiz Carlos Prestes), Afronte, Brigadas Populares (BP), União da Juventude Comunista (UJC, do PCB), Movimento Correnteza (ligado à Unidade Popular, UP) e a Juventude do PT.

Na eleição deste ano, como foi apresentado em notícia neste jornal, essas forças que antes aliaram-se para derrotar a direita na UFSC hoje saem divididas. Mas o motivo dessa cisão não parece dizer respeito a divergentes projetos políticos para a universidade, ou de uma leitura diferente sobre o que é a entidade pela qual estão disputando, qual o sentido que é necessário o movimento estudantil se guiar nos próximos anos frente àquilo que a conjuntura exigirá de nós — se há uma divergência acerca desses pontos, ela não foi evidenciada neste primeiro debate.

Observamos que as chapas reproduziram as propostas que já constam nos programas divulgados nos panfletos e nas campanhas, mas pouco foi explicitado em que os programas diferem entre si. 

Durante a maior parte do debate houve trocas de acusações entre as forças presentes nas chapas: a chapa 4 acusou a UP de ter abandonado a antiga gestão do DCE; a chapa 3 falou que as organizações presentes na Chapa 4 não puxaram efetivamente atos fora Bolsonaro; e a UJS, integrando a parte majoritária da UNE e compondo a chapa 2, foi acusada pela chapa 3 de não dialogar com as bases da UFSC. 

Um exemplo disso é quando a Chapa 2 e 3 discutiam entre si sobre a falta de diálogo entre a União Catarinense dos Estudantes (UCE) e o DCE, com afirmações da chapa 2 de que “a UCE é estratégica no movimento estudantil nacional e que buscou construir política acertada na universidade, apesar dos impedimentos e barreiras para estar presente”. Outro exemplo é quando a chapa 3 ressaltou que a última gestão do DCE não esteve presente no cotidiano da universidade através de atividades culturais e políticas, e isso foi rebatido pela chapa 4 com uma breve e abstrata resposta de que “sim, é preciso fazer autocrítica, mas também reconhecer tudo o que o DCE conseguiu fazer”. 

Esses são pontos bastante sensíveis e que devem ser postos em debate pelas chapas de maneira transparente, apresentando com convicção aos estudantes quais foram as análises que levaram militantes de cada partido a atuar da forma como atuaram, tendo uma entidade por 4 anos em suas mãos, num momento sem precedentes que passaram as universidades — com a pandemia, o ensino remoto e a desmobilização que se sucedeu.

Mas se não há uma divergência explícita, por qual motivo tais forças teriam atuações tão distintas a ponto de não poderem se aliar em uma entidade na defesa de suas pautas?  

A pergunta é legítima dado que, ao olharmos para o passado mais recente da atuação dessas forças no movimento estudantil, vemos que muitas estão dispostas a aumentar as fileiras de suas organizações, negociar em espaços fechados com a reitoria e virar as costas para os estudantes e enfraquecer as lutas fundamentais ao corpo estudantil em prol de interesses particulares dos partidos. Portanto, para além das propostas de cada chapa, há compreensões diversas sobre o papel da militância estudantil e da política que estrutura as lutas. 

Em temas que concernem a polêmicas históricas do movimento estudantil — como Empresas Juniores, Atléticas, festas nos campi, entre outros — sequer houve discussões ou apontamentos entre as chapas em suas falas no debate do dia 08. O papel que as Atléticas exercem de refreamento das lutas do Movimento Estudantil e como também possuem projetos políticos para a universidade não foi discutido. Do mesmo modo a de regulamentos das festas não foi debatida, proposta que é apresentada pelas chapas 2, 3 e 4 sem levar em conta toda a atuação repressiva da polícia militar na cidade – que transforma um problema político em uma questão burocrática a ser resolvida com mais burocracia. Apenas a chapa 2 e a 4 falaram de forma mais explícita sobre o apoio às atléticas.  A chapa 3 abordou que as atividades de esporte e integração são importantes, citou as atléticas sem fazer uma contraposição ou prestar apoio, de forma a não ficar claro para os estudantes qual o posicionamento político ante essa forma de organização dentro da universidade. 

O que indica que nem mesmo sobre discussões que tendem a polarizar o movimento estudantil as chapas apresentam alguma divergência, o que abre duas hipóteses: ou não aprofundam tais discussões, ou partem de concepções muito similares entre si, o que impede o entendimento de porque, afinal, as leva a se fragmentarem em diferentes chapas. 

Apesar de muito ter sido falado sobre a urgência de um DCE combativo e articulado com demais movimentos sociais e centros acadêmicos, não houve falas em defesa uma radicalidade necessária para nosso tempo: uma radicalidade que precisamos inventar, não sem nos debruçarmos sobre a história do movimento estudantil, mas novas respostas e ações que precisam ser construídas se não quisermos ver a universidade ser fechada e completamente destruída dentro de um curto período de tempo. Para construirmos uma política que de fato tenha capacidade de determinação sobre a atual conjuntura, precisamos sair da posição de reagir a ataques para a construção coletiva de um projeto de universidade que almejamos. 

O dia da votação se aproxima e, além dos cafés e atividades de passagens em sala, postagens nas redes sociais e uso de faixas com propostas das chapas, o que se analisa é que o debate ainda não ferve no interior da universidade da forma como deveria acontecer em um momento político tão importante como o processo eleitoral do DCE. 

É na campanha que as chapas devem mostrar  o potencial do movimento estudantil e a disposição para tocar as ações que são necessárias em defesa da universidade. O que se vê, ao contrário dessa agitação e efervescência, é o aumento do número de estudantes circulando com suas bandeiras específicas das organizações, focados em atividades que não geram grandes discussões para o maior número de estudantes. 

As chapas parecem estar, sim, em posição de disputa entre os que já compõem o movimento, envolvidos em conflitos de interesses entre os próprios partidos, sem a preocupação de ampliar a discussão.  E assim fica o questionamento diante desse clima morno da campanha eleitoral: não estão os partidos políticos, que compõem as chapas, abrindo mão de proporcionar debates amplos e qualificados junto aos estudantes por colocar a luta pela universidade em segundo plano? 

*O texto é de inteira responsabilidade das autoras e pode não refletir a opinião do jornal.

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