Foto: Beto Quissak / Edição: UFSCàE
Martim Campos – Redação UFSCàE – 03/08/2022
O último levantamento do índice da FipeZapde mostra a alta na especulação imobiliária refletida no preço dos aluguéis em 25 cidades do país destacando-se Florianópolis, uma das capitais com um dos maiores aumentos acumulados. Na tabela a seguir elaborada pela Fipe, Florianópolis lidera no ranking das variações acumuladas comparando com outras capitais, só ficando abaixo de Goiânia (GO) na variação acumulada para as locações desse ano:
Os dados acima indicam o aumento expressivo do preço do aluguel, sentidos no bolso da classe trabalhadora, que a cada ano entrega uma parte cada vez mais significativa do seu salário para manter-se na cidade, pagando muito pelos poucos metros quadrados alugados. Os preços do solo encarecem com as construções e valorizações de certas áreas da cidade, como o sul da ilha e o entorno da Universidade Federal de Santa Catarina, empurrando parte da população de trabalhadores e estudantes para áreas cada vez mais distantes das regiões centrais.
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Esse encarecimento no aluguel reflete as desigualdades sociais e disparidades entre as zonas da cidade. Podemos observar também essa disparidade em alguns dados: cerca de 164 mil moradores de Santa Catarina passaram a viver na pobreza, de acordo com o Mapa da Nova Pobreza divulgado no final de junho (30/06) pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Isso significa que mais de 160 mil pessoas vivem com renda domiciliar per capita de até R$497. Esse valor não cobre sequer o total do custo de uma cesta básica na cidade, que com a estimativa do Dieese, custa hoje em torno de R$760.
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Na cidade de Florianópolis é também onde se concentra a maior parte da taxa de pobreza do estado de Santa Catarina (15,33%). E ao mesmo tempo que se aprofundam os efeitos da crise, temos um crescimento de 40% nas vendas de apartamentos de luxo em Florianópolis apenas nos últimos meses de 2022, indicando uma consolidação ainda maior no mercado imobiliário de alto padrão na capital catarinense. Em sites como “alto padrão Floripa”, estão a venda apartamentos com preços exorbitantes nas áreas de praia, alguns chegando a custar mais de R$2 milhões de reais.
O contraste urbano da desigualdade social é gritante ao pensarmos nas diferenças entre as construções de luxo da cidade, cada vez mais gourmetizadas, com áreas internas dos condomínios tornando-se verdadeiras pequenas cidades, com áreas de lazer, academia, entre outros, por trás de seus muros; em comparação com outros bairros afastados que sequer possuem centros de saúde, ou acesso a saneamento básico.
Comparando o crescimento urbano Florianópolis ao longo dos anos, há modificações na produção dos loteamentos, dado que pode ajudar a pensar a expansão de seus projetos turísticos. Na pesquisa publicada em 2020 pelo PET de arquitetura da UFSC sobre produção imobiliária residencial em Florianópolis, aponta que na década de 1970 essas produções tinham a finalidade de fornecer loteamentos para classes de renda média alta, mas, que a partir dos anos 1980, “a produção imobiliária de loteamentos passa a ser quase exclusivamente para a população de maior renda.” (p. 272) Das construções das residências para o surgimento dos grandes condomínios fechados, resorts, flats, apart-hotéis, entre outros tipos de construções.
A cidade, seus espaços públicos e planejamentos não servem ou refletem as necessidades que possuem os trabalhadores, operários e estudantes de viver, trabalhar e estudar dignamente. A maioria passa parte de suas jornadas diárias em longas filas de trânsito ônibus apertados e com poucas opções de lazer, esportes e cultura próximo de suas moradias. A cidade vive sob o conflito de classes expresso no deterioramento e na falta de investimentos em patrimônio público para subsidiar a expansão dos negócios de uma classe empresarial que possui direta relação com o Estado. Algumas das formas como são viabilizadas essas ampliações das práticas espaciais dos atores hegemônicos, tal como as grandes construtoras da cidade, é elencada na pesquisa do PET de Arquitetura:
“ a) implementação seletiva de obras públicas; b) flexibilização das legislações de ordenamento e renovação urbana; c) geração de setores urbanos embelezados e a promoção da competitividade turística; d) facilitação do mercado imobiliário para empreendimentos residenciais, comerciais, etc. e) implementação de políticas habitacionais em áreas de abertura urbana ou periférica;”
É preciso construir coletivamente e disputar os projetos para a nossa classe trabalhadora. Este texto não tem a pretensão de esgotar os elementos que compõem a problemática, mas trazer alguns elementos para a discussão. A Escola de Formação Política da Classe Trabalhadora – Vânia Bambirra (EFOP) fez um debate para contribuir sobre o tema intitulado “Patrimônio público, urbanismo e a sanha capitalista”, com os professores Cláudio Ribeiro e Sara Granemann. Você pode conferir o debate na íntegra em nosso canal no youtube. Uma série de textos também foram escritos no jornal UàE e UFSCàE, trazendo discussões sobre as políticas de moradia em Florianópolis. É imprescindível refletir sobre quais projetos e planos poderiam de fato intervir nesse momento, dentro dos movimentos sindicais, estudantis, e partidos. Quais projetos são pensados para a nossa classe que se contrapõem a essa dinâmica de mercado?
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