[Opinião] Menos Marx, mais Mises: As disputas por hegemonia no ensino superior brasileiro por parte das think tanks liberais

Imagem: Edição UàE a partir de foto da Editora Boitempo

Evandro Coggo Cristoffoletti para UàE – 13/09/2021

Nos últimos anos, frases como ‘menos Marx, mais Mises’ foram vistas em manifestações e redes sociais da direita. Tal frase pode ilustrar um dos elementos necessários para se entender o cenário atual: a reivindicação de uma troca teórica, ideológica e política baseada na ideia de que, no Brasil, o marxismo povoa a cultura e a educação – troca em favor de perspectivas liberais no campo da economia. Seria extensivo mencionar, neste texto, as ramificações desta ideia, que podem perpassar pelo argumento de ‘doutrinação esquerdista’, ‘marxismo cultural’ (acusando-se especialmente Antonio Gramsci e Paulo Freire), ‘ideologia de gênero’, dentre outros. O próprio Escola Sem Partido, por exemplo, poderia ser citado. Além deste fenômeno, observamos a política de austeridade que vem engendrando a atuação do Estado. Diante deste panorama, o campo da educação e da educação superior passou a ser alvo de questionamentos e ataques neste sentido. Um dos tipos de organizações que realizam este movimento de articulação política e ideológica são as chamadas ‘think tanks liberais’.

Pode-se dizer que as think tanks – em tradução ao pé da letra, algo como ‘tanques de pensamento’ – liberais vêm participando, de um modo particular, deste contexto. Dentro da chamada ‘Nova Direita’ (não vamos arriscar defini-la aqui), tais organizações, geralmente pertencentes ao âmbito da sociedade civil, caracterizam-se pela reunião de ‘especialistas’ em ciências sociais e humanas (economia, direito, ciência política, filosofia, dentre outros) que objetivam influenciar diretamente a opinião pública e as políticas públicas, atuando na ‘guerra das ideias’ – se quisermos usar um termo gramsciano, seriam tipos específicos de aparelhos privados de hegemonia conectados ao desenvolvimento do neoliberalismo. No caso, tais think tanks remontam a um movimento intelectual mais amplo, arraigado no próprio desenvolvimento das diversas correntes de pensamento características do neoliberalismo, como a Escola de Chicago, a Escola Austríaca de Economia (as quais Paulo Guedes é fã, por exemplo), Teoria da Escolha Pública, anarcocapitalismo, dentre outros. Um dos marcos históricos deste processo de constituição do pensamento neoliberal foi a criação, sob liderança de Friederich Hayek, da chamada Sociedade Mont Pelerin em 1947, com o intuito de reunir acadêmicos, jornalistas e empresários dispostos a criar estratégias para ‘renovar’ o pensamento liberal clássico e disputar a batalha das ideias contra a predominância do ‘socialismo’ no âmbito da cultura e da intelectualidade – nesse sentido, a ideia da doutrinação esquerdista nas instituições de educação superior, no que se refere às think tanks neoliberais, é mais antigo do que aparenta. Na década de 1970, diante de uma conjuntura propícia, tais think tanks neoliberais ganharam força, atuando junto a partidos conservadores em diversos países dentro do contexto da implementação do neoliberalismo.

Gostaríamos de destacar a fundação da chamada Atlas Network, nos EUA, em 1981, pelo empresário e amigo de Hayek Antony Fischer. Tal organização se destaca pois seu objetivo é estimular e organizar (através de treinamentos e financiamento) a criação de think tanks neoliberais ao redor do mundo. Em outras palavras, a think tank norte-americana dá suporte e propicia a formação de uma rede de outras think tanks neoliberais em todos os continentes. No Brasil, a Atlas Network possui 15 filiados[1].

Historicamente, as think tanks liberais no Brasil surgiram na década de 1980, sob iniciativa de empresários ligados ao movimento neoliberal citado – alguns deles com contato direto com Antony Fischer e Hayek, como Henry Maksoud (empresário, criador da Revista Visão, e membro da SMP). A primeira think tank liberal foi criada em 1983 no Rio de Janeiro, chamada de Instituto Liberal, nascida com o intuito de divulgação do pensamento neoliberal e de proposição de políticas públicas. Tal think tank se ramificou ao longo da década de 1980 por São Paulo, Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Bahia, dentre outros – muitas delas acabaram encerrando as atividades na década seguinte e, hoje, destaca-se o Instituto Liberal do Rio de Janeiro e, como organização independente criada em 2014, o Instituto Liberal de São Paulo. Outra organização fundada na década de 1984 é o Instituto de Estudos Empresariais, com o objetivo de formar lideranças liberais dentre empresários e filhos de empresários[2]. O Instituto Liberal, particularmente, afirmava desde a década de 1980 que o ensino de economia nas faculdades e universidades brasileiras era defasado em relação às demandas do mercado, justamente por ser altamente permeado pela ideologia keynesiana e marxista. Além disso, defendia a privatização do setor, a cobrança de mensalidades e a retirada de gastos públicos no setor, considerado pouco rentável – nesse aspecto, estava alinhado às recomendações do Banco Mundial no campo.

Ao longo do tempo, com altas e baixas, outras organizações foram fundadas: Instituto Atlântico (1992), Instituto Liberdade (2004), Instituto Ordem Livre (2007), Instituto Millenium (2006), Instituto Mises Brasil (2008), Students For Liberty Brasil (2012), Instituto Liberal do Nordeste (2013), Instituto Liberal de São Paulo (2014), Mackenzie Center for Economic Freedom (2016), Instituto Borborema (2015), Livres (2016), Instituto Tropeiros (2016), Burke Instituto Conservador (2017), dentre outros. Nomes conhecidos, como Rodrigo Constantino (atual presidente do Instituto Liberal e personagem de destaque na fundação de outras think tanks), Paulo Guedes (membro do Instituto Millenium) figuram dentre o rol de membros destas organizações. Tais organizações atuam em duas frentes: tentam influenciar o que consideram como ‘elites intelectuais’ e ‘formadores de opinião pública’, como estudantes e professores, jornalistas, advogados e juízes, militares, políticos e empresários; e dedicam-se à promoção do pensamento neoliberal (dentre suas diversas vertentes), a formulação de propostas de políticas públicas, e a criação de conteúdos para atuar na batalha das ideias, com destaque a atuação em redes sociais[3]. As think tanks liberais geralmente são compostas um conjunto de ‘especialistas’ e ‘intelectuais’ (dentre acadêmicos, jornalistas, filósofos, etc.) e empresários. Declaram-se sem fins lucrativos, recebendo doações de pessoas físicas e jurídicas.

Este rápido panorama descritivo é importante para entendermos a atuação destas organizações no campo do ensino superior. Antes de entrarmos neste tema, vale lembrar que elas se organizam e atuam em redes coordenadas – como a chamada Rede Liberdade, criada em 2016 com a proposta de fortalecer o movimento liberal e propor privatizações, como a dos Correios; e, vale mencionar, a realização anual do evento chamado ‘Fórum da Liberdade’, que reúne as principais organizações liberais do país, bem como figuras políticas e intelectuais importantes da direita. Outro adendo importante: as think tanks possuem conexões diretas com outras organizações políticas da chamada ‘Nova Direita’, muitas vezes atuando como suporte cognitivo (conhecimento, estudos, publicações, expertise) a estas.

A atuação recente das think tanks neoliberais na educação superior

De forma geral, as think tanks liberais possuem uma postura paradoxal em relação ao ensino superior e, especialmente, à universidade pública: ao mesmo tempo que defendem um rol de medidas na direção da privatização e desregulamentação do setor e buscam deslegitimar e atacar a comunidade acadêmica por ser ideologizada à esquerda, atuam no interior das instituições de educação e ciência pois identificam o público estudantil e docente como importantes fontes de ‘formadores de opinião’ e potenciais lideranças intelectuais e políticas – em outras palavras, a academia seria uma fonte de expertise (conhecimento especializado), pela qual as think tanks podem pinçar potenciais especialistas para seus quadros. Nesse sentido, atuam de duas formas: buscam influenciar a opinião pública através da publicação e divulgação de textos sobre temáticas relacionadas, defendendo determinadas agendas e propostas ao segmento (abaixo) e, no interior das IES, buscam influenciar a agenda de ensino, pesquisa e extensão – considerando o ensino superior e a academia um espaço de disputa intelectual e política.

A agenda das think tanks neoliberais ao ensino superior

De forma geral, considerando que as think tanks abarcam diversas correntes de pensamento do neoliberalismo, o seguinte rol de argumentos e propostas são defendidos pela Rede Liberdade:

  • Em âmbito imediato/prático, defende-se maior desregulamentação do setor (principalmente do setor privado) e menor gasto/investimento público nas IES públicas e na ciência. A educação não é considerada um direito, mas um produto como qualquer outro e que deve ser regulado pelos mecanismos de oferta e demanda. Outro argumento defendido, em uma linha mais pragmática, é aplicação de vouchers escolares.
  • Em consonância com os argumentos do Banco Mundial, argumenta-se pela cobrança de mensalidades nas IES públicas. Considera-se que a educação superior é muito onerosa aos cofres públicos. No que se refere às universidades, para além disso, argumenta-se maior aproximação entre universidade-empresa e maior abertura para recursos privados (‘investimentos’, ‘doações’ e etc.) às instituições. Defende-se, também, que os conteúdos formativos e pesquisas devem alinhar-se, o maior possível, às demandas do mercado.
  • Considerando especialmente as vertentes da chamada Escola Austríaca de economia (sobretudo, provenientes de Ludwig von Mises), defende-se idealmente a total privatização do setor, visto que a utilização de recursos públicos é considerada maléfica aos princípios do livre mercado por ser compulsória (lembra-se do bordão ‘imposto é roubo’). Além disso, a educação pública, de uma forma geral, seria muito suscetível a influência e imposição política dos grupos de esquerda que supostamente dominam as esferas políticas e governamentais (como por exemplo sindicatos e movimentos sociais). Consequentemente, tanto a educação pública e a educação privada regulada seriam canais de doutrinação estatal, inculcando ideologias ‘estatistas’, ‘coletivistas’, ‘esquerdistas’ e outros ‘istas’ nos estudantes.
  • Algumas think tanks liberais defendem, por conta do argumento da doutrinação e na direção dos ‘princípios da liberdade’, o ensino domiciliar. Em outras palavras, propõe-se e defende-se que as famílias possam ter a condição de optar por educar seus filhos, em todos os níveis, em casa.

Destaca-se que tais argumentos reforçam movimentos como o Escola Sem Partido, por exemplo. Além disso, também alinham-se à condução atual da política econômica e educacional (austeridade, cortes de recursos na educação e ciência, o Programa Future-se, dentre outros).

A atuação das think tanks liberais no ensino, pesquisa e extensão

Além dos argumentos difundidos, as think tanks liberais atuam no interior das IES, buscando disputar a agenda de ensino, pesquisa e extensão. Para isso, algumas organizações dispõe de uma série de projetos e iniciativas particularmente voltados ao campo. Vamos citar alguns exemplos relevantes.

O Instituto Millenium, por exemplo, realiza o projeto chamado ‘IMIL na Sala de Aula’, criado em 2011. O objetivo do projeto é levar seus especialistas para palestrar em faculdades e universidades públicas e privadas por todo o país. Segundo o site da organização: “O projeto Imil na sala de aula surgiu da vontade de debater e conversar com os jovens sobre a importância da liberdade individual, Estado de Direito, economia de mercado e democracia”[4]. Nestas palestras, fala-se em diversos temas relativos à economia, política, empreendedorismo, dentre outros assuntos. Segundo o IMIL, os estudantes e docentes podem entrar em contato com a organização e solicitar palestras. Estima-se que até 2018, o IMIL na Sala de Aula tenha realizado mais de 120 edições. Por conta da pandemia, o projeto foi modificado, tornando-se uma série de ‘Aulas Magna’ abertas aos assinantes do ‘Clube Millenium’. Outro projeto com intuito similar, mas que hoje não se encontra em funcionamento, chamava-se ‘Liberdade na Estrada’ do Instituto Ordem Livre. Novamente, o objetivo do projeto consistia em levar a estudantes de graduação de IES públicas e privadas as perspectivas teóricas e políticas cultivadas pelo instituto. Criado em 2009, o projeto contava com o financiamento do Grupo Localiza.

Além de projetos especificamente voltados ao público acadêmico, há uma think tank liberal no país oficialmente vinculada a uma universidade privada: o ‘Centro Mackenzie de Liberdade Econômica’ (CMLE), fundado em 2016. O CMLE configura-se como um grupo de pesquisa, ensino e extensão da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Segundo site, a think tank “é um Centro de Pesquisa Econômica Aplicada e think thank liberal clássico brasileiro voltado para o debate em torno do papel do mercado e das características e consequências dos diferentes tipos de intervenção e regulação na economia brasileira”[5]. Contando com um corpo de pesquisadores da universidade, o grupo oferece cursos de pós-graduação profissional, realiza eventos (palestras, seminários) e projetos de extensão, bem como produz pesquisa. O grupo edita, por exemplo, os chamados ‘Índices de Liberdade Econômica’, com o objetivo de auferir o grau de liberdade nas regiões e cidades do país. O CMLE é oficialmente membro da Rede Liberdade e parceiro da Atlas Network, bem como mantém relação próxima ao Instituto Mises Brasil.

Por falar no Instituto Mises Brasil, o IMB também pode ser considerado como uma das principais think tanks liberais que objetiva atuar no campo acadêmico. Fundado em 2007, o instituto possui uma gama diversificada de projetos, incluindo-se seu flanco acadêmico. Para o IMB, atuar no meio acadêmico era importante na batalha das ideias, visto que aumenta as chances de legitimação do conteúdo produzido pelo instituto e, consequentemente, a capacidade da organização em influenciar a política e as políticas públicas. Além da atividade editorial voltada à tradução, divulgação e comercialização de obras da Escola Austríaca de Economia, o IMB possui o objetivo de se tornar o principal centro acadêmico brasileiro voltado ao cultivo da chamada Escola Austríaca de Economia. Para isso, vem realizando uma série de seminários e conferências acadêmicas, reunindo especialistas provenientes de universidades nacionais e internacionais (em sua maioria, membros de think tanks liberais, notadamente do Mises Institute dos EUA). Nestas conferências ditas acadêmicas, discute-se o panorama econômico e político brasileiro e mundial, bem como discute-se o ‘estado da arte’ da Escola Austríaca e suas vertentes. Além dos eventos, dois projetos chamam a atenção neste sentido: a Revista acadêmica “MISES: Interdisciplinary Journal of Philosophy, Law and Economics”, fundada em 2013; e a Pós-Graduação em Escola Austríaca, criada em 2016. No caso da revista, constitui-se enquanto um periódico acadêmico oficialmente reconhecido pelo Qualis Capes e tem o objetivo de reunir os estudos de pesquisadores que adotam as perspectivas da Escola Austríaca, bem como divulgar textos de Hayek, Mises, dentre outros. No caso da pós-graduação, constitui-se como um curso lato sensu, com o objetivo de formar profissionais e futuros pesquisadores dentro das vertentes teórico-ideológicas do IMB. Em ambos os casos, nota-se a presença dos especialistas do IMB e de outras think tanks liberais brasileiras e internacionais no quadro de editores/membros e docentes.

Uma das principais think tanks liberais que atuam no campo do ensino superior no Brasil (e no mundo) é a Students For Liberty Brasil (SFLB), fundada em 2012. A organização é uma filial da norte-americana Students For Liberty (SFL), criada em 2008 (financiada por bilionários norte-americanos, como os irmãos Koch, da indústria do petróleo e outros). O objetivo da SFL é treinar, através de repasses de recursos e conhecimento, lideranças estudantis (sobretudo de graduação) para atuar como ativistas liberais dentro e fora das instituições de educação superior. Assim, oferece-se oportunidades de financiamento de projetos, bem como diversos cursos que perpassam desde conteúdos referentes as diversas vertentes do liberalismo até treinamentos de gestão de think tanks, comunicação, liderança, dentre outros. Segundo o SFL, seu objetivo é educar, desenvolver e empoderar futuras lideranças liberais pelo mundo. Nesse sentido, a organização brasileira importa a agenda e o modus operandi de sua matriz norte-americana, selecionando coordenadores (nacionais, regionais, estaduais e locais) dentre estudantes de graduação interessados em concorrer nos processos seletivos da organização. Tais coordenadores, atuando como lideranças, ramificam os projetos da SFLB por faculdades e universidades em todas as regiões do Brasil. No interior das IES, geralmente, os membros e simpatizantes do SFLB organizam eventos, grupos de estudo, treinamentos, dentre outras atividades relacionadas. O SFLB diferencia-se das outras think tanks liberais por atuar especificamente no âmbito do ensino superior, fornecendo lideranças políticas para a própria rede liberdade e para a Nova Direita em geral. O próprio Movimento Brasil Livre (MBL), por exemplo, originou-se de treinamentos desta organização. Noutros termos, a think tank oferece a possibilidade de profissionalização do ativismo liberal, oferecendo uma rede de conexões as suas lideranças estudantis para que possam, depois de formados, atuar no campo da política.

Em muitos casos, os grupos de estudo liberais, com o suporte do SFLB, fundam outras think tanks liberais pelo país. Poder-se-ia citar algumas organizações que nasceram no próprio ambiente estudantil sob iniciativa de estudantes e docentes, como o Instituto Liberal do Nordeste, Instituto Atlantos, Instituto Ajuricaba, Clube Farroupilha, dentre outros – vale mencionar outro grupo de destaque, ligado a este contexto: o Clube Caiapós, considerado como um projeto de extensão da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP Ribeirão Preto.

Por fim, vale notar que, além das think tanks liberais, nota-se alguns movimentos políticos estudantis cujo objetivo é contestar a legitimidade da União Nacional dos Estudantes (UNE) e oferecer uma ‘alternativa’ liberal ao movimento estudantil. Nesse sentido, pode-se mencionar o movimento ‘Universidades Livres’ (UniLivres) que, sob o argumento de que a política universitária é dominada pela esquerda, busca montar grupos políticos estudantis em diversas IES pelo país. Considerando a tese da doutrinação esquerdista, outro projeto (já extinto) poderia ser citado: o MBL Estudantil, fundado em 2018. Alinhado ao Escola Sem Partido, a iniciativa buscava treinar estudantes para montar chapas de direita e concorrer a eleições de grêmios estudantis, bem como oferecer canais de denúncia de supostos professores doutrinadores (noutros termos, mecanismos de perseguição de professores e docentes). O projeto foi abandonado um ano depois.

Conclusão

Ao longo deste texto, observamos que as think tanks liberais enxergam o campo do ensino superior e acadêmico como espaços importantes de disputa por hegemonia. Nesse sentido, para além dos argumentos defendidos (privatização, desregulamentação, ensino domiciliar, doutrinação de esquerda), buscam criar nichos de atuação no interior das IES através de uma série de projetos e iniciativas. Em busca de expertise, legitimação e lideranças, tais campos são visados desde os marcos fundadores do movimento intelectual do neoliberalismo. Na atual conjuntura, tais organizações compõe o quadro político da direita e, nesse sentido, atuam como pontes entre as pautas colocadas pela Nova Direita e o campo do ensino superior, complementando, dentro de suas limitações e características, o projeto de austeridade e as pautas do Escola Sem Partido (e correlatos), contribuindo ao atual cenário de ataques, desvalorização, deslegitimação e desmonte/sucateamento das IES públicas e da ciência.


*Evandro é doutor em Política Científica e Tecnológica pelo Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e membro do Laboratório de Estudos do Setor Público da FCA-Unicamp (LESP-FCA) e do Grupo de Análise de Política de Inovação (GAPI) do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Unicamp. Também é mestre em Política Científica e Tecnológica e Bacharel em Gestão de Políticas Públicas pela UNICAMP. Ele apresentou sua tese “Disputando hegemonia no ensino superior e na universidade: atuação das Think Tanks Liberais na academia” no Circulação da Balbúrdia, o vídeo da atividade está disponível no canal do Youtude da EFoP e a tese está disponível na biblioteca da EFoP.


Recomendações de leitura

Rocha, Camila. Think tanks ultraliberais e a nova direita brasileira. Link: https://diplomatique.org.br/think-tanks-ultraliberais-e-nova-direita-brasileira/

Fang, Lee. Esfera de influência: como os libertários americanos estão reinventando a política latino-americana. Link: https://theintercept.com/2017/08/11/esfera-de-influencia-como-os-libertarios-americanos-estao-reinventando-a-politica-latino-americana/

Algumas referências acadêmicas (abordam o tema sob diferentes perspectivas)

CASIMIRO, F. H. C. A Nova Direita: aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.

FERREIRA, E. C. Think tanks da nova direita e suas estratégias de cooptação: o caso do  programa Imil (Instituto Millenium) na sala de aula. Crítica Educativa, v. 4, n. 2, p. 24-40,  2018.

GROS, D. B. Institutos liberais e neoliberalismo no Brasil da Nova República. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2002.

ONOFRE, G. F. 2018. A Nova Direita no Brasil: o caso dos Institutos Liberais brasileiros. Tese (Doutorado em História). Rio de Janeiro: Universidade Federal Fluminense, 2018.  Disponível em:<https://www.historia.uff.br/stricto/td/2042.pdf>.

ROCHA, C. ‘Menos Marx, mais Mises’: uma gênese da nova direita brasileira (2006-2018). 2019. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências  Humanas, University of São Paulo, São Paulo, 2019.


[1] Lista de Parceiros da Atlas Network no Brasil: https://www.atlasnetwork.org/partners/global-directory/latin-america-and-caribbean/brazil.

[2] Nas referências do artigo, serão listadas algumas obras que relatam este processo, bem como as tentativas destas primeiras think tanks em influenciar a constituinte e demais políticas públicas.

[3] Podemos listar as seguintes atividades: tradução e divulgação de obras; produção de artigos e estudos em economia e política; participação em rádio e televisão; realização de cursos e treinamentos para docentes e estudantes dentro e fora de universidades; prêmios de jornalismo; publicações diversas como revistas, cadernos e cartilhas; realização de eventos acadêmicos e não acadêmicos; e interações diversas com partidos, grupos políticos e associações de classe.

[4] Instituto Millenium: https://www.institutomillenium.org.br/imil-na-sala-de-aula1/

[5] CMLE: https://www.mackenzie.br/liberdade-economica/quem-somos

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