Imagem: Montagem de divulgação UàE
Mariana Nascimento – Redação Universidade à Esquerda
Não é possível entender a proposta de Reforma Administrativa (PEC 32/2020) de Paulo Guedes e Bolsonaro sem colocá-la no plano da conjuntura nacional. Uma vez que ela não está descolada de outras recentes alterações centrais nas condições de produção e relações de trabalho no Brasil, alterações “necessárias” e impostas pela crise capitalista pela qual atravessamos há mais de uma década e que se expressam nessa e em outras profundas reformas, ou melhor, contrarreformas, as principais podemos citar foram a Emenda Constitucional 95 de 2016, a Reforma Trabalhista de 2017 e a Reforma da Previdência de 2019. Em curso, hoje temos também a Reforma Tributária (Lei 2.337/2021) que está prevista para votação no próximo dia 17 de agosto .
A guinada reacionária pela qual o Brasil passa nos últimos anos e as péssimas condições de vida da população, principalmente após 2013, alicerçou a base necessária para que fosse possível aos governos, cada um em determinado turno, concretizar passo a passo uma agenda de destruição de direitos. Ou seja, ao capitalismo, para se recuperar da crise que é própria de sua existência, é necessário reestruturar todas as condições objetivas e subjetivas de vida.
Cada reforma dessas deixa suas marcas numa sociedade do tamanho da brasileira e altera as condições de solidariedade e disposição para a luta dos trabalhadores. Quando os trabalhadores vivenciam os efeitos da reforma trabalhista e previdenciária, somados aos demais efeitos da crise e lhes bombardeiam que haveria uma solução para tudo isso, não se deve estranhar que apoiem e anseiem por essa mudança no cenário nacional.
É, então, na destruição de direitos e condições de vida que nasce um campo fértil para o egoísmo intraclasse, pois foi criado uma enorme discrepância entre os trabalhadores que fazem parte do funcionalismo público e os que não o compõem. A tática argumentativa para convencer toda uma sociedade que uma reforma como a expressa na PEC 32/2020 não é nova, mas funciona, pois na aparência traria mais igualdade entre os trabalhadores.
No entanto, os direitos que um indivíduo tem não podem ser entendidos como individuais, quer dizer, os direitos que os servidores têm e mantêm com muita luta são gozados por toda a sociedade. Talvez o exemplo relevante mais recente e fresco da nossa história e memória seja o escândalo de corrupção na compra de vacinas Covaxin, não fosse a denúncia de um servidor público que goza de estabilidade, atualmente poderíamos todos estar pagando o superfaturamento arquitetado para promover desvio de verba.
Se o trabalho é exercer uma função pública e de interesse coletivo, não faz sentido entender que o que protege o trabalho seja algum benefício meramente individual. Assim, é possível compreender porque defender o funcionalismo público é, também, uma defesa de toda a classe trabalhadora. Caso a Reforma Administrativa seja aprovada não sofrerão só aqueles que ingressarão no serviço público, mas os servidores antigos não terão mais as mesmas condições de exercer seu trabalho e a população também amargará os efeitos. Porém essa relação não é direta, nem mesmo lógica. É necessário uma série de mediações e também a defesa de ampliação de direitos para toda a classe trabalhadora.
No convencimento de que é necessário diminuir as discrepâncias de quem faz e quem não faz parte do funcionalismo público, a mídia burguesa cumpre uma função de enorme importância e que não pode ser desconsiderada. A mesma mídia que, muitas vezes, tenta tecer críticas ao Bolsonaro e a tosquice que é o bolsonarismo para se desvincular de sua imagem e desresponsabilizar por sua parte na barbárie que vivemos, vem defendendo desde a campanha presidencial de 2018 a mesma reforma que Bolsonaro e Paulo Guedes apresentaram à câmara dos deputados em setembro de 2020. E é a mesma mídia que apoiou as outras reformas previdenciárias e trabalhistas, fica escancarado o quanto estão comprometidos com todas as reformas e mudanças demandadas pela burguesia.
Desde setembro do ano passado, o jornal Folha de São Paulo escreve editoriais comemorando que Bolsonaro tenha encaminhado a proposta à Câmara dos Deputados e o critica por, no texto original, algumas mudanças não atingirem os servidores da ativa. Ou então defendem que nem todas as mudanças sejam feitas através de alterações constitucionais e sim através de novas legislações que não precisam passar por discussões tão demoradas como são as tramitação das PECs.
O jornal Estadão, no último dia 03 de agosto, realizou um evento chamado “Fórum Estadão Think” promovido junto à Confederação Nacional da Indústria. O presidente da câmara dos deputados, Arthur Lira (PP), esteve presente e realizou falas se comprometendo a tramitar a PEC o mais rápido possível. No mesmo evento, o presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Braga de Andrade, destacou a importância que há em se acelerar também a Reforma Tributária, segundo o presidente da CNI é necessário passar ambas reformas, a avaliação de que o cenário na Câmara de Deputados e Senado são favoráveis e seus os interesses associados ao capital imperialismo são evidenciados em sua fala:
“Precisamos de uma gestão pública mais eficiente, que atue em parceria com o setor privado e ofereça serviços de melhor qualidade aos cidadãos. Ela também é importante para sinalizar aos investidores estrangeiros que o Brasil está avançando para criar um ambiente de negócios mais propício ao investimento, à renda e ao emprego [..] Temos um Congresso reformista e devemos ir além do que é possível fazer, porque não vamos ter outra oportunidade tão cedo”.
Tudo isso nos mostra que, por mais que a Reforma Administrativa seja apresentada pelo governo de Bolsonaro, ela carrega consigo os interesses da burguesia e essa mesma burguesia tem pressa em resolver logo como irá desestabilizar as possibilidades de luta dos servidores que hoje tomam frente de muitas lutas por toda nossa classe, ainda que eivados de contradições próprias da nossa sociedade. A pressa também se explica, pois no próximo ano há campanha eleitoral, o que indispõe os deputados a aprovarem medidas mais draconianas e ainda pois em 31 de dezembro de 2021 acaba a proibição da contratação via concurso público da Lei complementar nº 173, e é de interesse que as vagas que estão há muito tempo desfalcadas sejam ocupadas por um funcionalismo sem tantos direito e possibilidades de lutar livremente. Tudo isso demonstra que a luta pelo Fora Bolsonaro deve também se ampliar para derrotar os projetos da burguesia como a Reforma Administrativa, nos possibilitar fôlego para o enfrentamento de classes e reverter todas as derrotas das reformas dos últimos anos.
Traçar uma estratégia para lutar contra as reformas em curso e compreender os motivos da reforma ser uma luta de todos trabalhadores são tarefas cruciais. E nessa toada que a Escola de Formação Política da Classe Trabalhadora Vânia Bambirra realizará o debate “Por que a Reforma Administrativa é um ataque a todos os trabalhadores?”, com a Prof. Dra. Selma Venco no próximo dia 17 de agosto às 18h.