Mariana Nascimento* – Redação UFSC à Esquerda
Onze horas e quatro minutos de hoje, 26 de abril, recebi uma mensagem em uma rede social me alertando que a fila da porta da frente do Restaurante Universitário do campus Trindade da UFSC já chegava próxima a entrada do CSE. E a fila da porta traseira já alcançava a entrada do CDS. Ambas não paravam de crescer com o passar do tempo, conforme os estudantes iam saindo das aulas matutinas e outros chegando para as aulas vespertinas.
Próximo a porta do restaurante, o pessoal que recolhe os passes começaram a avisar: “Quem não fez agendamento não adianta insistir, não poderá passar!”. Alguém perdeu a hora do agendamento e insiste que precisa se alimentar, que não tem como comer em restaurantes do entorno pelo alto custo, que passará o dia na UFSC. Uma outra pessoa ultrapassa a nova catraca travada, xinga os trabalhadores terceirizados, é xingado de volta. Mais uma mensagem de alguém que estava muito atrás na fila, falando que fez o agendamento para às 11h, que quando chegou a fila já estava imensa, com medo de perder o horário e ser barrada na porta por ter passado o tempo.
Esse é o caos diário cotidiano imposto pela reitoria da UFSC a todos que acessam o RU, em sua esmagadora maioria estudantes de graduação e pós-graduação. Não é nenhuma novidade as filas enormes do RU, porém, na retomada presencial após dois anos de ensino remoto, ela está de fato maior, um impacto direto da carestia no custo de vida e da cesta básica. Além disso, no início do retorno presencial, a UFSC tinha estendido o horário de atendimento do RU no almoço, das 10h30 até às 14h30. Porém ontem (25/04), o restaurante voltou a funcionar no horário antigo, das 11h00 até 13h30, o que concentrou a demanda e alongou as filas.
E o que já era um problema há muitos anos, ganha uma nova característica: o absurdo do agendamento! Se não é realizado a tempo, trava a catraca e impede o acesso, a catraca que antes era liberada e usada apenas para contabilizar o número de refeições servidas por dia. Há aqueles que encaram mais de uma hora de fila, sem conseguir se alimentar, outros que pulam a catraca, etc.
Porém a nova burocracia do RU, além de dificultar o acesso, tem implicando aos trabalhadores terceirizados, que anteriormente organizavam as filas e recebiam passes, uma condição policialesca com os estudantes. Bem sabemos as condições de trabalho que os terceirizados experimentam na UFSC: baixos salários, enorme vigilância, ameaças de corte de pessoal e salário, etc e agora colocados em uma função de conflito direto com estudantes por uma política que não faz o menor sentido e é disfuncional.
Muitos estudantes reclamam nas redes sociais sobre as filas (confira a baixo), a redução no horário de atendimento e sobre os agendamentos. Porém, além de se queixar, é necessário agir e cobrar a garantia do direito à alimentação na universidade. O Restaurante Universitário é a ÚNICA política de permanência universal que há na UFSC, e por isso é urgente que se garanta o acesso a ela e, principalmente sua ampliação, necessidades completamente distintas às impostas neste retorno presencial.
Em quase dois anos sem funcionamento a capacidade do RU não foi alterada, não foi construída outra ala, etc. Notadamente isso tem relação com os cortes de verbas na educação superior, porém qual a prioridade é dada a permanência estudantil que impacta diretamente na condição de vida e estudos dos estudantes? A importância do RU fica evidente no tamanho da fila que encaramos todos os dias. Há relatos de estudantes que, enquanto o RU não funcionou na pandemia, pioraram demasiadamente sua alimentação, emagrecendo, se alimentando menos vezes ou em quantidade inadequada.
Em um momento de crise como o que enfrentamos no país não se pode ignorar que essa é a realidade também dos estudantes, pois a universidade não está descolada da realidade da sociedade que está inserida. Com certeza há exceções, mas não se pode medir uma política de permanência por essas exceções e sim pela maioria.
Se nas audiências com a reitoria (vídeo 1 ; vídeo 2) , realizadas antes da abertura do RU, o agendamento foi apresentado como uma medida de contenção de casos de coronavírus, na realidade ela se demonstra como uma medida de contenção de estudantes que dependem do RU. O agendamento não serve para nada, além de restringir o acesso à alimentação na universidade e criar diferenciações entre os estudantes, passar a carteirinha na catraca atualmente significa uma política de vigilância e mapeamento de quem são os estudantes que estão acessando o RU e não quantos para projetar novas compras de insumos. Essas consequências não são imediatas, não se darão num curto prazo, mas sim na naturalização de alguma práticas que vão preparando o terreno para que a alimentação não seja mais uma política garantida pelo acesso universal. É preciso reverter o agendamento e as catracas da universidade!
Confira abaixo algumas manifestações de estudantes da UFSC:
*O texto é de inteira responsabilidade da autora e não reflete, necessariamente, a posição do Jornal.