Imagem: UFSCàE/ Montagem a partir da entrevista realizada com o candidato
Flora Gomes *- Redação UFSCàE – 17/03/2022E
Na última segunda-feira (14/03) foi ao ar a entrevista realizada pelo UFSC à Esquerda com o candidato à reitoria Edson De Pieri, da chapa UFSC Sempre. A entrevista abordou diversos pontos envolvidos na candidatura, como as pretensões pessoais do candidato, o posicionamento acerca do Reuni, as críticas à atual gestão, entre outros. Buscamos neste texto apontar alguns elementos acerca do significado desta candidatura para a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
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Em linhas gerais, o candidato Edson De Pieri se coloca como um sujeito que seria um bom gestor dos problemas da universidade. As críticas à atual gestão se fundamentam sobretudo pela suposta inoperância desta. Para Edson, as reformas aprovadas pela atual administração deveriam ter sido aprovadas com mais rapidez e sem dar tanto espaço para a expressão de opinião dos diferentes movimentos da universidade. Colocando-se como alguém fora de qualquer grupo de poder da UFSC, como reitor, ele teria a capacidade de resolver os dilemas atravessados sem ser tão contaminado pela política universitária.
Em primeiro lugar, cabe questionar essa posição de gestor. Ora, seria a função de um futuro reitor atuar como um mero gestor dos assuntos da universidade?
Historicamente, o cargo de reitor cumpre um papel político, intelectual, e não apenas administrativo. Essas figuras remetem, na tradição universitária, a sujeitos que dirigem a comunidade universitária – e até mesmo a sociedade – em defesa daquilo que radicalmente se expressa nessas instituições: a construção do pensamento crítico. Mais do que nunca, o que se espera de uma reitoria em uma crise como a que atravessamos, é que esteja representada por um sujeito que aponte o caminho político e pedagógico para solução dos dilemas sociais atuais.
Em segundo lugar, cabe questionar se a proposta de gerir eficientemente os problemas da universidade, “acima da direita e da esquerda”, não significa justamente se posicionar em um dos lados.
Acerca do projeto do Reuni, projeto que promoveu a expansão flexível das universidades federais abrindo mão da qualidade destas, De Pieri alega que na UFSC o projeto tardou a ser aprovado. Acrescentou ainda, que o atraso se deu em razão da pressão dos setores que se opunham ao projeto, o qual deveria ter sido aprovado com maior rapidez. Não seria essa uma expressão de um dos lados da política?
Sobre o projeto do Reuni escreve o colunista do Universidade à Esquerda, Lalo Watanabe:
A expansão flexível das universidades federais com o programa Reuni (2007-2012) é outra expressão desse processo: sem abrir mão do formato universitário, levou para o seu interior critérios e diretrizes que desfiguravam o seu padrão de financiamento, de infraestrutura, corpo docente e de servidores técnico-administrativos, além de vincular a expansão a exigências tipicamente gerencialistas. Noutras palavras, o Reuni ampliou o elemento não universitário dentro das universidades federais, potencializando desigualdades que não permitem que em todas as áreas e unidades acadêmicas se possa realizar uma universidade de mesmo padrão.
Ou seja, a posição favorável do candidato em relação ao Reuni revela uma parte relevante de seu projeto para a universidade, que significaria explorar e aprofundar os elementos não universitários desta. Além disso, essa disposição levanta o questionamento sobre qual seria o posicionamento deste candidato em relação ao Reuni Digital, projeto que retoma a experiência do Reuni acrescentando, ainda, o protagonismo do Ensino a Distância nesta expansão. Na entrevista realizada ao UFSCàE, o candidato se coloca favorável ao EaD na pós-graduação. De Pieri não seria, portanto, favorável à reforma da pós-graduação levada a cabo pela atual gestão? Dentre outras questões, esta permitiu a implementação permanente de mecanismos do Ensino Remoto supostamente emergencial.
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Um elemento a mais para ser considerado nesta candidatura é como se daria a relação com os movimentos de base, sobretudo dos setores mais críticos da universidade. Na entrevista ao UFSCàE, De Pieri afirmou que considera negativa certas aberturas da reitoria aos movimentos, pois, segundo ele, estes trariam impasses ineficientes à gestão. O que isso pode significar para os movimentos críticos? Silenciamento? Atropelamento nos órgãos deliberativos? Apagamento das discussões públicas? Exclusão da comunidade universitária dos espaços deliberativos?
Ainda que os reitores anteriores também tenham silenciado os movimentos, cada qual à sua maneira, é grave que no próprio projeto de gestão isso já esteja anunciado. Isso significa que de antemão essa candidatura está emplacando um projeto que abertamente se opõe aos movimentos críticos.
Por fim, é importante resgatar que a candidatura do De Pieri não se apresentou apenas nestas eleições. Há anos o professor vem construindo tentativas de emplacar seu projeto para a universidade. Em outro momento em que foi candidato a reitor, em 2018, De Pieri tomou lado bem evidentes em disputas candentes da UFSC, o que revela que seu passado também evidencia sua posição política. Naquela ocasião, assinou um documento que contrário o voto paritário para a consulta informal das eleições de reitoria e se mostrou favorável à adesão do HU à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH). Mesmo hoje, após os anos de experiência com a EBSERH comprovarem que esta empresa não solucionou os problemas do HU, o professor segue defendendo essa alternativa para os impasses enfrentados pelo hospital.
Sendo assim, longe de ser um mero gestor dos problemas da universidade, De Pieri é um candidato disposto a apresentar um projeto para a universidade que a distanciam da construção do pensamento crítico e ainda silencia a oposição que possa surgir da base.
Continue acompanhando o UFSC à Esquerda na cobertura das eleições de reitoria. O primeiro turno acontecerá na próxima terça-feira, 22/03, de forma online, pela plataforma do e-democracia.
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