[Opinião] O que está em jogo: as contradições capitalistas entre o direito à educação e o direito à vida

Imagem: Edição UFSC à Esquerda, feita a partir de imagem retirada de reportagem do site do Governo de Santa Catarina. Foto: Julio Cavalheiro/ Secom

Bela Mielczarski* – Redação UFSC à Esquerda – 12/04/2021

Um ano após o começo da nova realidade pandêmica, as crianças e adolescentes têm sentido cada vez mais o que significa o desaparecimento temporário da escola em suas vidas. Fingimos que nossos jovens estão sendo educados, passando horas em frente a um computador assistindo a vídeos de professores e fazendo atividades sem sentido. Enquanto isso, esses mesmos jovens estão passando por períodos de ansiedade e depressão, como indica uma pesquisa do instituto Datafolha. Qual a situação da educação hoje?

O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) decretou, no dia 18 do mês passado, que as aulas presenciais são uma atividade essencial. Esqueceram-se, porém, que apenas citar a escola como essencial a fim de pressionar que elas voltem presencialmente não é a mesma coisa que apreciá-la como sua função prioritária e direito humano essencial. E nessa veia de pensamento, forçar os professores a se expor a risco de infecção, trabalhando em escolas que não têm recursos para garantir um retorno seguro, não é o mesmo que apreciar sua função pública e indispensabilidade de seu trabalho.

“A volta às aulas nesta semana está ameaçada em Florianópolis”, diz a reportagem do jornal burguês NDMais sobre a greve do Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Florianópolis (Sintrasem), que reivindica uma volta às aulas presenciais somente em condições seguras. Em reportagem do mesmo jornal dois dias depois, somos informados de que a Prefeitura de Florianópolis declarou dita greve ilegal.

Nota-se que o trabalho essencial, do “herói”, é idolatrado somente no momento de conveniência. Os professores têm um trabalho essencial e necessário o suficiente para serem convocados às aulas presenciais e impedidos de ficar em greve. Porém, no momento em que suas vidas são ameaçadas, eles são antagonizados. Nenhum trabalhador deve ser coagido a colocar seu trabalho acima de sua vida!

O pior é a distorção dos fatos. A greve foi motivada pela falta de recursos que garantem a segurança dos trabalhadores da educação, enquanto a notícia foi de que “os sindicatos estavam impedindo a volta às aulas presenciais”, como se fosse de interesse do sindicato impedir a educação. Cabe aos trabalhadores da educação se satisfazerem com seu status de essenciais e indispensáveis, mas não cabe a eles lutar por direitos ou questionar em que condições esse trabalho será feito?

O que fica claro quando a educação não é prioridade, e que ela pode ser substituída por um “ensino” remoto, é que já não acreditamos mais na função pública da educação, ou ao menos esquecemos que ela poderia até ser uma aliada na manutenção de um Lockdown legítimo e eficiente. No momento em que a educação (devido ao desaparecimento da instituição escolar) é deixada para as famílias, para sites aleatórios de notícias e para fatos circulados em aplicativos de conversa; em que já não existe a separação entre a instituição familiar, instituição escolar e as redes sociais, a educação dos jovens passa a incluir as notícias falsas, as cloroquinas, os negacionismos.

Estamos em um momento em que a fim de poder deixar os restaurantes, shoppings, academias e bares abertos, tivemos de manter as escolas fechadas. E a questão da volta às aulas presenciais se apresenta com essa preocupação legítima: as mortes e contágios chegaram a níveis absurdos, voltar ao ensino presencial agora é um movimento perigoso, para se dizer o mínimo. O argumento aqui é de que, desde o começo, a prioridade deveria ter sido de fazer o lockdown máximo e as restrições necessárias para que pudéssemos manter as escolas e os órgãos de saúde abertos. Nossas prioridades estão um tanto equivocadas.

E é claro que a questão de manter os comércios fechados acaba atacando os trabalhadores e agravando todos os tipos de crise, um argumento chamativo. Mas que sistema é esse que tem de nos fazer escolher entre a fome e a pobreza ou o risco de morte por infecção? Que sistema é esse que nos faz realizar tarefas não essenciais a fim de não nos afundarmos em dívidas, mesmo quando o custo para isso é a morte de 4 mil pessoas ao dia?

Os nossos equívocos são intermináveis. Nos encontramos desse modo: não podemos largar nossas atividades não essenciais, para um lockdown legítimo que permitiria a abertura das escolas e a diminuição do número de mortes absurdo que cresce a cada dia; não conseguimos criar um solo razoável para educar nossos jovens, e fingimos que estamos o fazendo ao deixá-los à beira do desespero e exaustão com atividades remotas sem sentido. E quem são os vilões? Os professores que entram em greve com medo de morrer, os trabalhadores que se reúnem com família para encontrar paz, as medidas desesperadas que tentam desagravar a situação, os comerciantes que reforçam o uso de máscaras?

Que belos bodes escapatórios para que não tenhamos que criticar e olhar para o real vilão, o capitalismo egoísta e mesquinho; este que nos causa contradições cruéis, e que serve apenas a sua autovalorização aos capitalistas canalhas que preferem assistir à morte de milhões a renunciar de seu controle.

Os textos de opinião são de responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, as posições do Jornal.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *