[Opinião] Conselho Universitário sobre o ensino remoto na pós ocorre hoje – qual o histórico da discussão?

Imagem: reprodução mídias da APG

Martim Campos – Redação UFSC à Esquerda – 29/11/2022

No Conselho Universitário (CUn) de hoje (29/11), às 14h, serão debatidas, entre outras pautas na ordem do dia, a minuta da política institucional de Enfrentamento ao Racismo Institucional na UFSC e a implementação do ensino remoto na pós-graduação. 

Na terça-feira passada (22/11), a reitoria fez uma sessão extraordinária aberta com a comunidade acadêmica, com espaço para diversas entidades fazerem falas sobre o tema “Manifestação de enfrentamento ao nazismo e suas apologias dentro da Comunidade Universitária”, devido aos casos recentes de manifestações neonazistas e racistas no campus da universidade e a descoberta recente da vinculação de estudantes da UFSC com células neonazistas. Apesar da convocação e importância da discussão do tema, a sessão teve baixa participação da comunidade universitária. Ao final da sessão, foi encaminhada uma moção de repúdio sobre o tema. Hoje, a minuta elaborada e já apresentada no dia 01/11 pela Reitoria, será debatida e votada no Conselho. 

Junto com a discussão de mais de cinco pontos de pauta, também entrou na ordem do dia a Resolução Normativa que dispõe sobre as aulas remotas na pós-graduação. A RN foi aprovada na Câmara da Pós-graduação (CPG) em 06/10, porém para a sua aprovação definitiva precisa ser aprovada na maior instância de deliberação da UFSC, o Conselho Universitário. A Associação de Pós-Graduandos (APG) – Gestão Carcará tem chamado atenção para o risco de uma implementação do ensino remoto na pós-graduação da UFSC antes mesmo da entrada da RN nas câmaras, por conta de outras políticas já aprovadas na gestão passada da Reitoria, as quais abriram brecha para a remotização do ensino. 

A RN conforme aprovada na Câmara propõe que 25% das disciplinas teóricas possam ser ofertadas em cada período letivo, por meio do ensino remoto. Ou seja, se em um período são ofertadas 8 disciplinas, 2 poderão ser totalmente remotas. Será permitido cursar até 50% da carga horária exigida de disciplinas obrigatórias e eletivas no ensino remoto, abrindo a possibilidade de tornar um curso presencial em semipresencial. A resolução dispõe também da possibilidade de compartilhamento da docência em uma disciplina por meio de sistema de áudio e vídeo em tempo real, sem restrições sobre quanto uma disciplina será ministrada por um docente externo, regulamentando apenas que o docente da UFSC responsável pela disciplina esteja presente em aula. Além disso, será aberta uma brecha para que o estudante possa participar de forma remota em até 25% da carga horária de qualquer disciplina. Até o momento, nenhuma avaliação baseada em critérios político-pedagógicos foi realizada para basear a RN.

Política surge no apagar das luzes da gestão passada da Reitoria do Ubaldo

A Resolução Normativa foi proposta no final da última gestão da reitoria do Reitor Ubaldo, representado na Câmara da Pós-graduação (CPG) pela antiga Pró-reitora de Pós-graduação, Cristiane Derani. Faltando 10 dias para o encerramento da gestão, a proposta foi apresentada em 23 de junho de 2022 em sessão ordinária da Câmara da Pós-graduação (CPG), a qual seria levada em discussão novamente na semana posterior para debate da proposta nos programas de pós-graduação e para o recebimento de sugestões de melhorias na proposta inicial da RN, além do estabelecimento de uma porcentagem máxima de atividades remotas que poderiam ser ofertadas nos cursos stricto sensu da pós-graduação. O voto da parecerista da RN além de favorável, incentivava o aumento da carga para a implementação remota. 

Naquele momento, a avaliação da APG foi confirmada de que estava ocorrendo uma assimilação da modalidade remota na pós-graduação cada vez maior, materializada na nova Normativa. Desde o ano passado, a entidade trouxe o debate sobre as reformas na pós-graduação dentro dos conselhos, quando as RN’s 015 e 095 estavam em tramitação. Nos conselhos, as representantes da entidade reforçaram, em mais de uma oportunidade, a importância de uma discussão ampliada com a comunidade, para além de conselhos e comitês, considerando distintas posições da comunidade acadêmica; bem como o teor político das duas propostas de reformas, ou seja: que não eram apenas adequações técnicas e regulamentações, mas alteravam o caráter da própria pós-graduação. 

Pedido de parecer de vistas

No dia 30/06, na semana seguinte após a apresentação inicial da normativa, a discussão na CPG iniciou com as sugestões para o aumento da porcentagem da carga remota dos cursos, mas sem discussões sobre o teor político da normativa. Durante a sessão, a representante conselheira da APG fez falas apontando para a necessidade de uma audiência pública para a discussão da matéria antes de sua deliberação, entretanto, o pedido não foi considerado. A APG pediu vistas do processo, suspendendo imediatamente a discussão da RN para a elaboração de um novo parecer de vistas. 

Leia também: Por que a pressa para aprovar o ensino remoto na pós-graduação? 

As reuniões ordinárias da CPG ocorrem em geral uma vez por mês, o que significa que a RN seria discutida no final de julho. Logo no início de Julho, a APG realizou o 1º Encontro de Representações Discentes da Pós-Graduação da UFSC (06/07), que obteve a participação de mais de 80 estudantes com o objetivo de discutir as diferentes realidades dos programas da pós-graduação, criando uma ponte entre Representantes e APG. Nas falas dos estudantes apareceram o impacto dos cortes nas bolsas de estudos; a dificuldade vivenciada na realização dos estudos e pesquisas por conta da precarização com a falta de reparos e reformas na estrutura física da UFSC, como espaços sem água, salas com sua infraestrutura deteriorada, banheiros sem papel higiênico, etc; problemas de saúde entre estudantes, com muitas solicitações de trancamento de matrícula por questões de saúde mental e uma crescente sensação de desvalorização enquanto pesquisador, além da percepção de uma desmobilização para participar de espaços políticos na pós-graduação. 

Meses antes da votação da RN na CPG e luta pela ampliação do debate 

No dia 14/07 a APG solicitou em reunião com o gabinete da reitoria que a data da votação da nova normativa fosse prorrogada para além da próxima reunião da CPG, a realizar-se no dia 28 de Julho. O pedido da entidade foi aceito e a previsão da discussão da pauta passou a ser para o mês de agosto, após o recesso de grande parte dos cursos de pós. 

No mês de Julho, os programas de pós-graduação em Educação e Serviço Social fizeram debates em seus programas com os discentes e fizeram publicação de cartas com a posição contrária dos discentes do programa em relação a RN. No dia 21/07, a APG organizou um evento formativo com o tema “Aulas remotas na pós: perspectivas e consequências”, que contou com a presença dos professores Adriana D’Agostini e Mauro Titton na discussão. Em nova reunião com a Pró-reitoria, a data da RN foi adiada uma outra vez por conta do pedido que a entidade fez de ampliação do debate.  No dia 12/09, a APG realizou uma roda de conversa intitulada “Encontro sobre o futuro da pós: do ensino remoto ao corte de bolsas”, com convite do debate estendido à comunidade.  

A pedidos da APG, foi organizado pela Pró-reitoria de pós-graduação da UFSC (PROPG) o seminário “Disciplinas com presença remota na pós-graduação da UFSC”, que ocorreu no dia 15/09. O espaço foi uma primeira iniciativa em circular o debate com a comunidade desde a tramitação em junho da Normativa e apesar de pouca divulgação, professores, técnicos e estudantes comparecem ao evento. Durante a discussão, diversas posições contrárias e questionamentos sérios foram colocados para a reitoria, apontando a necessidade de maior debate. Na discussão, um dos encaminhamentos pedidos no seminário foi de que a Resolução fosse discutida também no Conselho Universitário (CUn), o que não havia sido confirmado pela pró-reitoria até aquele momento. 

Com a data de votação da resolução se aproximando na CPG (29/09), a APG pediu um espaço de fala na sessão do Conselho Universitário que estava sendo realizado naquela semana (27/09) para realizar a leitura de uma carta que demanda o  compromisso da Reitoria em deliberar sobre a Resolução Normativa supracitada naquela instância. Após a leitura e entrega da carta, o Magnífico reitor e Vice-reitora firmaram seu compromisso de colocar em pauta a Resolução Normativa sobre as aulas remotas no Conselho Universitário.

Na sessão da votação da normativa na CPG, o parecer de vistas da APG foi votado e, apesar de receber elogios da elaboração do parecer, foi rejeitado pela Câmara, além da expressão de diversos Conselheiros na sessão atacando a entidade pois teriam achado ofensivo a demanda da APG por ampliação do debate no CUn, como se fosse uma deslegitimação da Normativa discutida. 

A APG, diante das dificuldades em discutir a política em jogo na universidade e com a necessidade de aprofundar uma análise de conjuntura sobre as perspectivas futuras de luta na universidade a partir dessa transformação acelerada do ensino, fez um evento aberto para toda a comunidade de estudantes, docentes e técnicos no dia 10/10, no Auditório da Reitoria da UFSC, com o tema “Ensino remoto: futuro da pós-graduação?”. Os debatedores convidados foram os professores e pesquisadores da Educação Allan Kenji Seki e Célia Vendramini.

Em 20/10, a APG convocou os estudantes da Pós-graduação para uma assembleia estudantil para debater o ensino remoto na pós-graduação. Em assembleia, foi votada a posição unanimemente contrária a qualquer tipo de ensino remoto na pós, pois, nas palavras publicadas em nota pela entidade “independente da denominação que seja utilizada, não contempla os anseios dos(as) estudantes de pós-graduação e não há evidências de que essa medida contribua para produção de ciência e tecnologia de qualidade, e muito menos na construção de uma sociedade justa e democrática, na defesa da qualidade da vida, conforme a missão institucional da UFSC”. 

Com a posição tirada em assembleia, a entidade levou a posição em sessão aberta do Conselho Universitário (21/10), que pautava sobre os cortes orçamentários na universidade. A decisão foi enfatizada em diversas oportunidades da discussão, cobrando a reitoria de um engavetamento da pauta, para que fosse respeitada a decisão estudantil. Porém, aparentando uma confusão de entendimento, a Reitoria não respondeu ao pedido de engavetamento da pauta. 

Entretanto, na última sexta-feira (25/11), a resposta chegou para a comunidade estudantil da pós-graduação com a inserção da RN na ordem do dia no CUn de amanhã. 

Após cinco meses desde o início da tramitação, qual foi o acúmulo da discussão? 

A nova gestão, eleita pela força estudantil, não apresenta significativa diferença em sua posição no tratamento da pauta comparada com a gestão passada da reitoria,  a qual foi criticada pela chapa eleita no tempo de campanha eleitoral, entre diversas questões, por não estabelecer diálogo com os estudantes. Apesar da facilidade maior para o diálogo, na prática, a reitoria abraçou o projeto anterior da gestão do Ubaldo, sem estabelecer mais espaços para a discussão da RN, sem levar em consideração a posição estudantil sobre a matéria, acrescentando apenas uma vírgula em sua Normativa: a inclusão de um artigo para fazer uma avaliação após a experimentação de um ano letivo de ensino híbrido.

Importância da participação da comunidade universitária na sessão de amanhã

Por isso, a sessão do Conselho Universitário (CUn) será importante para os rumos da política universitária. Com a implementação do ensino remoto, o que devemos acompanhar como horizonte da política universitária?

Ontem (28/11) a APG publicou uma carta aberta à reitoria, pedindo novamente o engavetamento da pauta:

A posição decidida legitimamente na Assembleia da pós foi ressaltada por nossas conselheiras representantes em sessão do CUn, que apresentou o panorama dos cortes orçamentários da universidade. Reiterou-se o pedido naquele momento de engavetamento dessa pauta, pois não diz respeito aos anseios dos estudantes de pós-graduação. O pedido de engavetamento da pauta foi uma decisão da assembleia, contra a qual a reitoria decidiu se opor.

Para nós, o projeto que está sendo apreciado pela administração central que a princípio parece ser só para a pós-graduação, está totalmente atrelado a projetos ligados às classes dominantes, como o Reuni Digital. Na raíz, o que diferencia verdadeiramente esses projetos? E o que impedirá que essa política não se espraie pela universidade?

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