[Opinião] Movimento Estudantil e suas entidades: “a história é dos jovens”

Flora Gomes – Redação UFSCàE – 04/07/2023

O futuro é dos jovens. A história é dos jovens. Mas dos jovens que pensam a tarefa que a vida impõe a cada um, que se preocupam em se armar adequadamente para resolvê-la da maneira que melhor convém às suas convicções íntimas, que se preocupam em criar para si aquele ambiente no qual sua energia, inteligência e atividade encontrem o máximo de desenvolvimento, a mais perfeita e frutífera afirmação. 

(Antonio Gramsci, 1917)

Uma das questões mais marcantes na experiência universitária em uma universidade pública é a possibilidade de construir movimentos e entidades que disputam e questionam o sentido desta instituição. Através de lutas por melhores condições de formação, pela reelaboração do currículo de um curso, em solidariedade a outras categorias, pela atenção ao contexto político no cenário nacional, os estudantes logram grandes conquistas!

Os estudantes, os jovens, carregam condições que favorecem uma disposição que pode permitir uma radicalização maior dos movimentos: seja pelo contato com o conhecimento crítico produzido dentro e fora das salas de aula, pela liberdade institucional  que o vínculo estudantil permite, pela maior abertura à constituição de novos valores a partir da experiência da universidade, ou mesmo pela característica genuinamente questionadora da juventude. O movimento estudantil carrega em sua história vitórias muito importantes, como a conquista de restaurante universitário e moradia estudantil, e o freio a políticas nocivas às universidades, como o projeto do governo Bolsonaro para as universidades, o Future-se.  Tendo em vista a importância das entidades para a construção e organização do movimento estudantil, este texto busca elucidar algumas das principais entidades e cadeiras de representação institucional presentes na UFSC.

Leia também: Para manter o acúmulo das nossas forças ou porque construir os Centros Acadêmicos 

INSTÂNCIAS DO MOVIMENTO ESTUDANTIL 

Centro Acadêmico (CA): o CA tem como função representar politicamente os estudantes de um curso. Uma gestão de CA é eleita por um ano a partir de um projeto político. É ele quem guia a atuação dos estudantes na entidade. Um CA pode realizar discussões e lutar por alterações no currículo, organizar espaços formativos que não são contemplados no currículo oficial (o espaço da semana acadêmica por exemplo, costuma ser bastante frutífero neste sentido), mobilizar estudantes para pautas relevantes para o curso ou pra universidade,  promover atividades culturais (como sarau, festas), atividades esportivas (como jogos e campeonatos) e construir pautas relativas à cidade ou ao cenário nacional. Por ser composto integralmente por e para estudantes, a capacidade da entidade para construir uma política relevante no curso e na universidade é grande. 

Os estudantes do CA também costumam ocupar cadeiras de representação em órgãos institucionais nos cursos, departamentos e centros de ensino – porém em todos esses espaços o número de estudantes é muito menor que o número de professores ou técnicos – daí a importância de ter um movimento estudantil forte amparando os estudantes que ocupam essas cadeiras. 

Diretório Central dos Estudantes (DCE): o DCE funciona como um “CA” de todos os cursos, com gestões que também duram um ano e também são eleitas a partir de um projeto político que guiará a atuação. Portanto, sua capacidade de mobilização é ainda maior. Por representar todos estudantes de graduação da universidade, o DCE geralmente tem mais estudantes envolvidos do que nos CAs. Um DCE pode impulsionar qualitativamente  a política dos CAs, através de eventos formativos (como palestras, rodas de conversa, debates), mobilizações com pautas relevantes para toda a universidade (como a importância da recomposição orçamentária das Universidades), posicionamentos nos órgãos representativos, política de esportes e ainda promover atividades culturais e de integração.  Para se articular politicamente com os CAs, o DCE conta com o Conselho de Entidades de Base (CEB), que trataremos mais adiante. 

Apesar de o DCE como entidade ter a possibilidade de construir diversos instrumentos importantes para mobilização política, o uso que é feito destes depende do projeto político da gestão. Por isso, é importante diferenciar a entidade da gestão. Se uma gestão de DCE, por exemplo, não convoca CEBs, não organiza atividades formativas, culturais, esportivas, não realiza reuniões periódicas abertas, não está presente nos principais acontecimentos da universidade, em síntese, se ela não está mobilizando os estudantes  acerca dos principais anseios da vida estudantil, é porque o projeto político da gestão é este, mas a entidade continua carregando diversas potencialidades.

Conselho de Entidades de Base (CEB): o CEB reúne todos os CAs da universidade e o Grêmio Estudantil do Colégio de Aplicação (GECA). Segundo o estatuto do DCE, ele é um “órgão deliberativo, consultivo e fiscalizador do DCE-UFSC”, que ocorre por meio de uma reunião que pode ser convocada pela direção do DCE – para organizaruma mobilização, por exemplo – ou por Centros Acadêmicos. Neste segundo caso, é necessário que 16 Centros Acadêmicos assinem o documento da autoconvocação. Esta possibilidade é importante, pois permite  que em diversas conjunturas os CAs tenham discordâncias e disputem o direcionamento político que é construído  pelo órgão máximo de representação estudantil (o DCE). Através do CEB, os CAs podem alterar essa política, pois a decisão deste conselho é superior à política da gestão do DCE.

Assembléia Estudantil: se o CEB  é superior  ao DCE, a assembleia estudantil é superior a ambos e pode ser convocada tanto pela direção do DCE quanto pelo CEB. Uma assembleia estudantil, por sua força política, costuma ser convocada em momentos decisivos da conjuntura. Por exemplo, diante da apresentação de um projeto destrutivo para as universidades públicas (como foi o caso do “Future-se” em 2019 e como tem sido a política de drenagem de recursos das universidades públicas). 

PRESENÇA ESTUDANTIL EM ESPAÇOS INSTITUCIONAIS DA UNIVERSIDADE

Colegiados (departamento ou curso): os colegiados são instâncias institucionais de discussão e debate composta por professores e estudantes. Nas reuniões são debatidas questões próprias de cada curso, por exemplo, a abertura de concursos para novos professores, alterações curriculares, política de estágios, etc. Como o nome indica, o Colegiado de Curso trata de questões específicas de cada  curso, enquanto o Colegiado de Departamento é mais abrangente. Nesses espaços, os estudantes podem manifestar suas posições, por meio das representações do CA  acerca do sentido de suas formações como, por exemplo, questionando os critérios para a abertura de concurso em determinada área de formação, pautando mudanças do currículo, na carga horária, entre outras. Na luta contra as Empresas Juniores (EJs) no  CFH, em 2013, o colegiado de curso de Psicologia foi uma instância importante de disputa., pois era uma proposta que impactaria no projeto político pedagógico do curso como um todo. 

Conselho de Unidade: “Unidade” se refere a cada Centro de Ensino (CTC, CFM, CCS, CCE, CFH, etc). O Conselho de Unidade é uma instância semelhante aos colegiados dos cursos e departamentos, tabém é composta por professores, técnicos e estudantes e tem caráter deliberativo. Nele, debate-se, por exemplo, a criação de novos cursos, o repasse de verbas da reitoria para as unidades ou a utilização de espaços físicos de um centro. 

Conselho Universitário (CUn): é a instância máxima de deliberação da universidade. Nela ocorrem decisões importantes e, por isso, sua representação costuma ser disputada. Ela é composta por membros da reitoria (Reitor, Vice e pró-reitores), representantes docentes, da categoria dos técnicos e de estudantes. Atualmente, a nomeação da representação estudantil no CUn é feita através da eleição de DCE. A chapa vencedora, conquista um percentual das cadeiras relativo aos votos, as demais chapas também podem indicar representações de acordo com a proporção dos votos depositados nas urnas. O CUn é importantíssimo, políticas significativas são decididas neste lugar, como a adoção da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) no Hospital Universitário, a cessão de terreno da universidade para a construção de vias públicas ou até mesmo a alteração do caráter de ensino, como verificado recentemente na adoção do Ensino Híbrido na Pós-Graduação. 

Diante desse quadro complexo de instâncias de movimento estudantil, espaços das entidades e espaços de decisão institucional da universidade, cabe à força estudantil construir, organizar e demonstrar sua potência de lutas. Ainda que o cenário atual possa ser de um certo imobilismo, isso não se dá de forma natural. Mobilizar os estudantes exige trabalho daqueles que ocupam esses lugares, são diversas as pautas e necessidades da vida estudantil: desde a moradia (longe ou próximo ao campus); preço da passagem de ônibus da cidade; condições de alimentação dentro e fora da universidade, ou seja, o restaurante universitário e o próprio preço da cesta básica; condições de estudo: bibliotecas, salas de aula, laboratórios, computadores, professores com estabilidade, qualidade dos currículos; permanência estudantil: quantidade de vagas na moradia da universidade, preço do passe do RU, número de bolsas e auxílios disponíveis; acesso e incentivo a arte e cultura, etc. 

A lista é infindável, é necessário construir um Movimento Estudantil que seja presente na vida dos estudantes, que tenha disposição política de enfrentar e encarar essas questões e desafios, um Movimento Estudantil que não contribua para generalizar a indiferença no seio da juventude de nosso país! 

“A indiferença opera como força na história. Opera passivamente, mas opera. É a fatalidade, é aquilo com que não se pode contar, é o que interrompe os programas, subverte os melhores planos; é a matéria bruta que se rebela contra a inteligência e a sufoca (…). Vivo, tomo partido. Por isso odeio quem não o faz, odeio os indiferentes” 

(Antonio Gramsci, 1917)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *